Baixa potência
É preciso aumentar a potência da política monetária; juros altos trazem efeitos colaterais
Lula da Silva não gosta do mercado financeiro. Mas não é correspondido. O mercado não desgosta de ninguém. Quer apenas ganhar dinheiro, na alta ou na baixa. Também não faz juízos de valor, por mais loquazes que sejam seus economistas (que são verbosos, mas não compram nem vendem). O presidente se equivoca ao dar ao mercado o status de interlocutor político.
Declarações de princípio contra a lei do teto de gastos ou contra a independência do Banco Central são contraproducentes. O mercado não tem afiliação partidária, mas acende incensos para dogmas e axiomas. Se o governo sinaliza, por exemplo, uma elevação da meta inflacionária, a expectativa de inflação que entra nas equações do Banco Central sobe e pode levá-lo a elevar ainda mais os juros, justamente o contrário do que se desejava.
Há aqui um jogo de espelhos que requer certa sutileza pragmática que Lula um dia teve, mas parece ter perdido. Ao invés de alimentar pirraças com o mercado ou de aventar uma moeda comum com a Argentina (uma solução em busca de um problema), o governo ganharia mais se abrisse a discussão a respeito da baixa eficácia da política monetária. Hoje a única ferramenta de que dispomos para combater a inflação é a elevação da taxa Selic.
É preciso discutir como aumentar a potência da política monetária, já que sabidamente os juros altos trazem efeitos colaterais devastadores, seja sobre a distribuição de renda, seja sobre a própria dinâmica da dívida pública. Além de assegurar que a política fiscal não esteja em dissonância com a política monetária, o que não ocorre hoje, cinco pontos, entre outros, poderiam constar da pauta, a saber: (i) a completa desindexação da economia, já que mesmo com inflação baixa continuamos com o mau hábito de indexar contratos e salários; (ii) a escolha do núcleo da inflação como meta, como forma de minimizar a influência de choques de oferta temporários nas taxas de juros; (iii) a atuação do Banco Central ao longo de toda a curva de juros, não apenas na taxa Selic, a exemplo do que ocorre em muitos países; (iv) o controle da excessiva volatilidade cambial, o que não pode ser confundido com tabelamento do dólar; e (v) o controle da política de crédito através do uso de depósitos compulsórios dos bancos junto à autoridade monetária, um instrumento clássico de política monetária.
Os juros altos são, de fato, uma aberração. Mas eles decorrem de fatores objetivos, que caracterizam a forma de atuação do Banco Central, e não de uma falha de caráter de agentes econômicos ou de suas eventuais preferências políticas. •