O Estado de S. Paulo

“Hoje não faz sentido uma pessoa de 40 anos ser considerad­a velha”

- Gilberto Amendola gilberto.amendola@estadao.com

Foi em 1995 que Shirley Mallmann deixou o sítio em que vivia no interior do Rio Grande do Sul para se aventurar no concorrido mundo da moda. Quase trinta anos depois, uma das primeiras top models brasileira­s a integrar o circuito de alta moda internacio­nal continua na ativa. Aos 45 anos, Mallmann integra o crescente grupo de modelos maduras – leia-se 40+.

“Quando comecei, a carreira de modelo tinha prazo de validade, quase como a de um jogador de futebol, aos 30 e poucos aposentava”, lembrou ela em entrevista por telefone à repórter Sofia Patsch.

Para Shirley, as mudanças no mundo da moda são consequênc­ias de uma sociedade mais consciente. “O consumidor quer ser representa­do em todas as faixas etárias”. Confira os melhores trechos da conversa a seguir.

Vou começar por um assunto que está super em alta, que é a luta contra o “etarismo”. Aos 45 anos você está cheia de trabalho na moda, coisa que quando começou a carreira, nos idos anos 1990, não existia. Como encara essa transforma­ção? Quando comecei, lá em 1995, a carreira de modelo tinha prazo de validade, quase como a de um jogador de futebol, aos 30 e poucos aposentava. Me lembro quando cheguei nos Estados Unidos, uma das primeiras coisas que a minha agência falou foi que eu ia ter um auge, uma estabiliza­ção e depois ia acabar. Sempre tive essa realidade na cabeça. E hoje, nossa, como tudo isso mudou. Já não faz sentido nenhum pensar que uma pessoa de 40 anos é “velha”. Não mesmo.

Nenhum...

O consumidor quer ser representa­do em todas as faixas etárias. E tem toda essa questão da inclusão, que também trouxe luz à representa­tividade de idade. No meu caso, acho que juntou o útil ao agradável. Estou super feliz e honrada de fazer parte dessa mudança.

E hoje, como está a sua agenda?

Faço mais fotos. Já os desfiles, faço menos. Aqui em Nova York eles são bem honestos, quando chamam para um trabalho sempre falam que estão usando um casting de mulheres mais velhas. Não tem aquela coisa de competir com as meninas de 20 anos. Não. A gente é caracteriz­ada nessa faixa etária de modelo mais velha e o designer nos chama se couber no contexto dele.

Mas para fotos de publicidad­e, sente que as mulheres

“Em NY quando chamam para um trabalho sempre falam que estão usando um casting de mulheres mais velhas. Não tem de competir com meninas de 20 anos”

“O consumidor quer ser representa­do em todas as faixas etárias. E tem toda essa questão da inclusão, que também trouxe luz à representa­tividade” Shirley Mallmann Modelo

40+ estão em alta aí em Nova York?

Sim. Até a agência que estou hoje em NY, a Model Coop, é 100% dedicada a mulheres da minha faixa etária, coisa que nunca existiu até um passado recente. A dona é Corinne Nichols, ex-presidente da Elite Models, trabalhou por muitos anos com o John Casablanca­s e agora abriu essa agência focada em modelos maduras. O grupo é bem selecionad­o, acho que somos em vinte.

Você viveu as décadas mais glamourosa­s da moda, acha que esses tempos ficaram mesmo para trás?

Os desfiles de moda já não são mais os mesmos há muito tempo, a internet e o fast fashion foram mudando isso e a nova geração quer coisas diferentes e acho que faz parte, mas o glamour em si, aquilo que a gente via nos anos 1990, nos anos 2000, realmente é completame­nte diferente do que se vê hoje. Tive muita sorte de viver essa época como modelo, me sinto privilegia­da de ter participad­o dessa fase da moda, porque acho que não volta mais. Foi bom viver aquilo, mas também é muito bom viver essa mudança.

E quais são suas maiores lembranças da época de super modelo dos anos 1990?

Nossa, tem tanta coisa. Bom, eu era muito novinha e muito verde quando saí do interior do Rio Grande do Sul para NY, Paris, Milão e Londres. Era uma época em que não existia internet. Então, fui aprendendo tudo na marra. Foram várias gafes, altos perrengues. Mas era sempre aquela coisa, meu Deus do céu, estou subindo numa passarela em Paris ao lado da Naomi Campbell, da Kate Moss, todos os designers ali... Lembro perfeitame­nte da primeira vez que vi o Karl Lagerfeld, não sabia o que falar, fiquei em choque. Os grandes desfiles foram as coisas que mais me marcaram, porque eram verdadeiro­s espetáculo­s, produções monumentai­s.

Como enxerga a carreira de modelo hoje em dia?

É tão diferente de quando comecei. Quando alguém me pergunta que conselho daria para quem está começando agora nem sei o que falar, porque tudo mudou. Ainda existem as coisas que sempre vão existir, que são os desfiles, as fotos, mas hoje tem a força das mídias sociais. É trabalho duro, tem que se dedicar. Acho que o maior desafio para essas modelos novinhas é conseguir achar o balanço entre a vida pessoal e a profission­al.

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WILL VENDRAMINI Shirley Mallmann clicada em NY, onde vive com o marido e filhos
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