O Estado de S. Paulo

Como decifrar o terroir argentino

- Le Vin Filosofia Suzana Barelli instagram: @suzanabare­lli SUZANA BARELLI É JORNALISTA ESPECIALIZ­ADA EM VINHOS

Aargentina Zuccardi Valle de Uco é hors concours entre as melhores vinícolas para se visitar no mundo. Batizada de Piedra Infinita e inaugurada em 2016 em Mendoza, a vinícola venceu três vezes a competição World’s Best Vineyards, o que a colocou como número um em enoturismo. Chegou lá por conseguir equacionar as boas experiênci­as para o turista (a vista para a Cordilheir­a dos Andes do seu restaurant­e é de tirar o fôlego) com a qualidade dos vinhos elaborados em seus tanques de concreto – ao contrário da maioria dos brancos e tintos, que fermentam em tanques de inox, seus vinhos só fermentam em recipiente­s de concreto.

Mas o maior atrativo da vinícola é quase invisível ao viajante, que só consegue captar uma parte desse encanto ao provar os seus vinhos. Para os turistas, as pedras quase onipresent­es na paisagem podem ser apenas peças de decoração, mas, na verdade, elas são a ponta de um profundo estudo do terroir, que hoje reflete em seus vinhos, importados pela Grand Cru. Nos movimentos tectônicos de formação da Cordilheir­a dos Andes, cerca de 10 milhões de anos atrás, e depois, nos degelos e na força dos rios que descem a cordilheir­a, o solo foi se formando em diferentes camadas, de perfis muito diferentes entre si.

O formato e o tamanho das pedras encontrada­s no solo e no subsolo dão uma pista dessa diversidad­e, como aponta Martin Di Stefano, viticultor da companhia. É um trabalho árduo de entender melhor o chamado terroir e de elaborar vinhos respeitand­o essas caracterís­ticas. Esses estudos não são uma exclusivid­ade dos Zuccardis, mas a vinícola, atualmente, está entre as que melhor exemplific­am essa tendência na Argentina.

Di Stefano mostra que, no Vale de Uco, as raízes das videiras podem encontrar um terreno mais calcário, mais vulcânico e até com restos de conchas marinhas. A diferença com os demais lugares em que os vinhedos são plantados mundo afora é que nos pés da Cordilheir­a esses solos diversos entre si estão lado a lado, resultado da formação dos Andes.

As calicatas, como são chamados os buracos feitos no vinhedo para entender o subsolo, tornam visível essa diferença. Em frente à vinícola há dois desses buracos, em uma distância de não mais do que 5 metros entre eles. Em um deles, as pedras brancas, grandes, parecem ocupar todo o subsolo, no outro o solo é bem mais decomposto, com pedras pequenas. O comum é que o subsolo mantenha a mesma caracterís­tica em áreas bem maiores. A margem esquerda de Bordeaux, por exemplo, é marcada pelos solos com cascalhos; enquanto a Sicília tem solos vulcânicos. •

Nos pés da Cordilheir­a, solos diversos podem ajudar a entender melhor o vinho

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