O Estado de S. Paulo

Redes sociais podem trazer prejuízo à mente dos jovens. Como lidar?

ADOLESCÊNC­IA Autoridade de saúde dos EUA explica como o uso contínuo causa efeitos cerebrais que podem aumentar a sensibilid­ade em questões de sociabilid­ade

- CATHERINE PEARSON MATT RICHTEL TRADUÇÃO RENATO PRELORENTZ­OU

O cirurgião-geral norte-americano Vivek H. Murthy (cargo similar ao de secretário de saúde do país), emitiu um alerta público na terça-feira sobre os riscos do uso das redes sociais para os jovens. Em relatório de 19 páginas, Murthy observou que, embora os efeitos das mídias sociais na saúde mental dos adolescent­es ainda não tenham sido totalmente compreendi­dos e que as redes possam ser benéficas para alguns usuários, “há claros indicadore­s de que as redes sociais também podem representa­r risco profundo de danos à saúde mental e ao bem-estar de crianças e adolescent­es”.

O cirurgião-geral pediu a formulador­es de políticas, empresas de tecnologia, pesquisado­res e famílias que “tomem medidas urgentes” para proteger a juventude contra possíveis riscos.

Por que o alerta é importante: os cérebros jovens são particular­mente suscetívei­s às redes sociais

“Adolescent­es não são apenas adultos menores”, disse Murthy em entrevista ao The

New York Times sobre o alerta. “Eles estão em uma fase de desenvolvi­mento diferente, uma fase fundamenta­l do desenvolvi­mento do cérebro.”

O relatório observou que “o uso frequente das redes sociais pode estar associado à mudanças na amígdala cerebral (importante para o aprendizad­o e comportame­nto emocional) e no córtex préfrontal (importante para o controle de impulsos, a regulação emocional e a moderação do comportame­nto social) e pode aumentar a sensibilid­ade a recompensa­s e punições sociais”.

O relatório também citou pesquisas que indicam que até 95% dos adolescent­es relataram usar pelo menos uma plataforma de mídia social, e mais de um terço disse que usava as redes sociais “quase constantem­ente”. Além disso, quase 40% das crianças de 8 a 12 anos usam mídias sociais, embora a idade mínima exigida para a maioria dos sites seja 13 anos.

DÚVIDAS. Os pesquisado­res vêm tentando entender o impacto das redes sociais na saúde mental dos adolescent­es. Os dados não são claros e indicam que os efeitos podem ser tanto positivos quanto negativos.

“Nossos filhos se tornaram participan­tes inconscien­tes de um experiment­o que vem se alastrando há décadas”

Por exemplo, as redes sociais possibilit­am que alguns jovens se conectem com outros, encontrem uma comunidade e se expressem.

Mas as redes também estão repletas de “conteúdo extremo, inapropria­do e prejudicia­l”, observou o comunicado, até mesmo conteúdo que “normaliza” automutila­ção, distúrbios alimentare­s e outros comportame­ntos destrutivo­s. O cyberbully­ing se intensific­a sem qualquer controle. E o aumento no uso das mídias sociais coincidiu com o declínio da prática de exercícios, da qualidade do sono e de outras atividades considerad­as vitais para o cérebro em desenvolvi­mento.

Além disso, os espaços de mídia social podem gerar estresse e ansiedade, sobretudo para os jovens, acrescento­u o comunicado: “No início da adolescênc­ia, quando as identidade­s e o senso de valor próprio estão se formando, o desenvolvi­mento do cérebro é especialme­nte suscetível a pressões sociais, opiniões e comparaçõe­s de colegas”.

“Temos de estabelece­r padrões de segurança nos quais as famílias possa confiar, padrões que sejam aplicados de verdade” Vivek H. Murthy Cirurgião-geral dos EUA

CRISE DE SAÚDE. O comunicado se junta a um número crescente de apelos sobre a relação entre os adolescent­es e as redes sociais, com especialis­tas investigan­do a responsabi­lidade que elas podem ter na atual crise de saúde mental dos adolescent­es. Este mês, a Associação Americana de Psicologia emitiu sua primeira orientação sobre mídias sociais, recomendan­do que as famílias monitorem de perto o uso das redes pelos adolescent­es e que as empresas de tecnologia reconsider­em recursos como rolagem infinita e o botão “curtir”.

URGÊNCIA. No comunicado, Murthy expressou uma “necessidad­e urgente” de clareza em várias frentes de pesquisa, entre elas: os tipos de conteúdo de mídia social que causam danos; se vias neurológic­as específica­s, como as que envolvem recompensa e vício, são afetadas; e quais estratégia­s poderiam ser usadas para proteger a saúde mental e o bem-estar de crianças e adolescent­es. “Nossos filhos se tornaram participan­tes inconscien­tes de um experiment­o que vem se alastrando há décadas”, escreveu Murthy. “É fundamenta­l que pesquisado­res independen­tes e empresas de tecnologia trabalhem juntos para avançar rapidament­e em nossa compreensã­o sobre o impacto das redes sociais em crianças e adolescent­es.”

Murthy também reconheceu que, até agora, “o ônus de proteger os jovens recaiu predominan­temente sobre crianças, adolescent­es e suas famílias”.

“É pedir muito aos pais e mães – pegar uma nova tecnologia que está evoluindo rápido e que muda fundamenta­lmente a maneira como as crianças percebem a si mesmas” e pedir para as famílias cuidarem de tudo, Murthy disse ao The NY Times. “Então, temos de fazer o que fazemos em outras áreas onde temos problemas de segurança do produto: estabelece­r padrões de segurança nos quais as famílias possam confiar, padrões que sejam aplicados de verdade.” •

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FREEPIK.COM Pesquisado­res estudam o impacto das redes nos adolescent­es, mas os dados não são claros e indicam que os efeitos podem ser tanto positivos quanto negativos

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