Vida em Condomínio
O feminino no coletivo: atuação das mulheres na gestão condominial
No período neolítico, enquanto os homens saíam para caçar, as mulheres ficavam nas aldeias. Cuidavam das crianças, plantavam e preparavam alimentos. Cansados, vitoriosos ou não, os homens acabavam retornando para aquele local de proteção e aconchego, o qual, coletivamente, as mulheres sedimentavam. Nascia assim, 10.000 anos atrás, o viver coletivo, com espaços compartilhados e divisão de tarefas para que todo o grupo se beneficiasse. Mesmo nesse cenário primitivo, protagonistas não foram apenas aqueles que eram fortes e caçavam, mas também aquelas que desenvolviam a habilidade de acomodar diferenças e criar ambientes de abrigo.
Andamos bastante na busca de uma sociedade justa e igualitária, mas parece que sempre enroscamos em alguns capítulos, em que o fisicamente mais forte, ou o que grita mais, se impõe.
Fato é que, independentemente dos limites geográficos e políticos, e apesar de as questões de gênero não determinarem mais quem de fato está no comando das relações, ainda hoje enfrentamos relações de abuso e preconceito contra nós, mulheres. É bastante fácil imaginar as dificuldades pelas quais passaram as líderes femininas ancestrais, num mundo onde a força física ainda era um fator fundamental para garantir a sobrevivência.
Difícil é entender que isso ainda não tenha acabado. Ocupando o cargo de síndica, como profissão, há anos, desempenho o papel de representante da comunidade, o cargo máximo dentro da organização administrativa de um condomínio. Não fui eu quem inventou essa hierarquia, foi quem escreveu o Código Civil Brasileiro. Tampouco fui eu que tomei esse lugar por imposição, pois sou eleita. Porém, muito comumente, minha autoridade é contestada pelo simples fato de eu ser uma mulher e estar no comando. Será que nesse ambiente acontece algo parecido com o mito automotivo de que mulheres dirijam mal?
Fato é que, em reuniões de conselho e em assembleias, é muito comum que síndicas e conselheiras sejam interrompidas de forma abrupta, desfazendo assim a linha de raciocínio que construíam. Tal comportamento social, conhecido como manterrupting, é uma das formas de desrespeito velado às mulheres. O próprio agendamento da data dos encontros muitas vezes leva em conta a conveniência das agendas masculinas e não as femininas, que quiçá necessitam conciliar afazeres familiares. Quantas vezes estava eu expondo um plano para a plateia, quando alguém se levanta, repete tudo o que eu havia dito, e se apropria da ideia. Isso se de fato terminei de expor a ideia, pois é comum ter sido sistematicamente interrompida, sem necessidade, sem conseguir completar uma única frase do começo ao fim.
Atitudes como essas culminam com abusos psicológicos que podem levar mulheres a duvidar de seu senso de percepção da realidade, de sua capacidade de raciocínio e por fim de sua própria sanidade. Nada disso que descrevo aqui é novidade, e lamentavelmente parte de nossa sociedade parece não enxergar. Talvez dar com o tacape na cabeça da mulher que está falando fosse realmente mais evidente, mas o mundo moderno lançou mão de recursos mais sutis, embora igualmente desrespeitosos.
Preste atenção quando, numa reunião, temos uma mulher no comando. Agora imagine se fosse um homem naquela situação e compare. Será que ela está tendo de fazer um esforço adicional para convencer e não ser interrompida? Se sim, posicione-se. Ajude a modernidade a compreender que precisamos ser mais empáticos e acolhedores com as ideias que surgem de lideranças mais delicadas, que buscam convencer pelo diálogo e não pela força bruta.
Andamos bastante na busca de uma sociedade justa e igualitária, mas parece que sempre enroscamos em alguns capítulos, em que o fisicamente mais forte, ou o que grita mais, se impõe