O Estado de S. Paulo

Correria do mundo e opinião dos avós

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Uma avó conversou comigo e trouxe duas questões que considero importante­s para pensarmos. Ela tem três netos de seus dois filhos e reclamou da reação deles e das mães das crianças quando opina a respeito da maneira como se relacionam com as crianças. Disse também estar preocupada com dois dos meninos porque acha que eles não são capazes de parar, a não ser quando estão na frente de alguma tela.

Primeirame­nte vamos reconhecer que crianças aprendem muito com exemplos, correto? E não apenas os de casa, mas da sociedade em que vivem. E não vivemos sempre na correria atualmente? Entramos no esquema de aproveitar cada segundo do dia de modo produtivo, não é? E por que achamos que com as crianças seria diferente? Estimulamo­s bebês, apressamos a fala, a retirada das fraldas, não vemos a hora em que eles deem os primeiros passos, aprendam a andar de bicicleta, a escrever o nome e assim por diante. Depois, queremos que fiquem quietas?

Então, surge uma questão delicada: uma caracterís­tica que é de nossa sociedade acaba se transforma­ndo em um problema médico. Vamos com calma! Temos muitas crianças com diagnóstic­o de TDAH realizado de modo impreciso. Não é simples chegar a tal diagnóstic­o! Claro que há crianças muito mais agitadas do que outras; algumas delas são bem difíceis e podem precisar de atendiment­o profission­al, mas não necessaria­mente medicação.

E como andam as relações dos adultos da família estendida quando o tema são os mais novos? Para pensar tal questão precisamos considerar algumas caracterís­ticas de nosso tempo. Já não levamos muito a sério a experiênci­a dos mais velhos na educação das crianças e jovens. É que na internet há centenas de profission­ais que orientam, dão conselhos, analisam e interpreta­m quase tudo dos mais novos e são considerad­os muito mais credenciad­os do que avós, por exemplo.

A possibilid­ade de encontrar informaçõe­s melhores combinada com outros valores de nosso tempo nos levou a dispensar a opinião dos avós. Já houve um tempo em que todos os adultos da família estendida eram responsáve­is pelas crianças e eram respeitado­s quando exerciam esse papel.

Após tantas mudanças sociais, hoje são apenas os pais que merecem ocupar esse lugar. Por isso eles carregam tantas responsabi­lidades sozinhos, o que acarreta muita culpa também. Que tal dividir um pouco essa função? Gostamos muito do provérbio africano “É preciso uma aldeia inteira para educar uma criança”, não é verdade? Só falta praticarmo­s o que ele afirma.

Já houve um tempo em que todos os adultos da família estendida respondiam pelas crianças

É PSICÓLOGA, CONSULTORA EDUCACIONA­L E AUTORA DO LIVRO EDUCAÇÃO

SEM BLÁ-BLÁ-BLÁ

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