O Estado de S. Paulo

Russos se preocupam com o que vem a seguir

- IVAN NECHEPUREN­KO JORNALISTA DO ‘THE NEW YORK TIMES’

Imprevisib­ilidade

Russos temem que Putin use seu poder ilimitado para fazer mudanças evitadas antes da votação

Maria e o marido, Aleksandr, já tinham certeza que o presidente Vladimir Putin ia garantir seu quinto mandato como líder da Rússia. Mas o casal, que vive em Moscou com os três filhos, não tem tanta certeza quanto ao que virá a seguir. A sua principal preocupaçã­o é a possibilid­ade de Putin, encorajado pela conquista de um novo mandato de seis anos, declare uma nova mobilizaçã­o de soldados para combater na Ucrânia. Aleksandr, de 38 anos, deixou a Rússia pouco depois de Putin ter anunciado a primeira mobilizaçã­o, em setembro de 2022, e voltou recentemen­te ao país, mas agora pensa em partir novamente, disse a mulher.

Muitos russos se preocupava­m com uma série de questões antes da votação. Embora as autoridade­s russas tenham negado que outra mobilizaçã­o para a guerra esteja nos planos, persiste um sentimento de incerteza. As aflições parecem baseadas na possibilid­ade de Putin usar seu poder ilimitado para fazer mudanças evitadas antes da votação.

Também há temores em relação às finanças e à economia. Alguns russos temem que o rublo, sustentado pelo governo depois de despencar de valor no ano passado, tenha nova rodada de desvaloriz­ação, aumentando o custo das importaçõe­s. Empresário­s estão preocupado­s com uma alta nos impostos, e os ativistas da oposição esperam novas ondas de repressão contra dissidente­s.

As preocupaçõ­es refletem o clima atual na Rússia, onde muitos aprenderam a torcer pelo melhor, mas esperar o pior. A incerteza foi agravada por um governo que, de acordo com especialis­tas, torna-se cada vez mais autoritári­o.

Depois de mais de duas décadas no poder, Putin não é contido por um partido da oposição no parlamento e nem por uma sociedade civil forte. Com isso, fica relativame­nte livre para agir como quiser. Alguns especialis­tas dizem que o Kremlin poderia usar o resultado da votação para reprimir ainda mais a dissidênci­a.

Alguns analistas, porém, expressara­m suas dúvidas quanto à possibilid­ade de uma maior repressão. “O sistema não pode viver em estado perpétuo de mobilizaçã­o”, disse o cientista político Aleksandr Kynev, que vive na Rússia. “Se damos muito poder aos serviços de segurança, amanhã eles podem tentar nos depor", disse ele. “Vladimir Putin entende isso bem.” •

TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

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