O Estado de S. Paulo

Áudio indica que ações de Bolsonaro caíram mal no Alto-Comando

- MARCELO GODOY COLUNISTA DO ‘ESTADÃO’

Ocomandant­e do Exército, Tomás Miguel Ribeiro Paiva, expôs em conversa com seus subordinad­os, em janeiro do ano passado, razões que afastaram o Exército de Jair Bolsonaro. A gravação foi feita de forma clandestin­a. Nela, ele diz que Bolsonaro deu a ordem para não “mexer” com os acampament­os em frente aos quartéis. E rebate acusação da extrema direita de prestar continênci­a a ladrão: “Prestamos continênci­a à autoridade; se não, não é Exército, não é Força Armada, vira milícia, vira bando”.

Passaram despercebi­dos de todos detalhes do que Tomás Paiva leu aos seus subordinad­os. Era o título de uma reportagem: “Próxima motociata de Bolsonaro será na Aman (Academia Militar das Agulhas Negras)”. Ele comentou: “É verdade. Não ocorreu porque os comandante­s convencera­m Bolsonaro de que não era adequada”. Tomás não forneceu detalhes do caso. Mas o Estadão revelou em outubro de 2023.

O episódio represento­u um embate que opôs o governo ao então comandante da Aman, general Paulo Roberto Rodrigues Pimentel. Ao iniciar suas motociatas pelo País, Bolsonaro teve a ideia de entrar com uma delas, vinda de Resende (RJ), pelo portal da Academia, no dia da cerimônia de entrega dos espadins. Era 14 de agosto de 2021. Pimentel, um Força Especial, foi abordado pelos ministros Luiz Eduardo Ramos e Braga Netto. Tentaram convencê-lo a permitir a manifestaç­ão. O general respondeu que só havia um jeito de isso acontecer: nomeando outro oficial para comandar a escola.

“Ele queria fazer a motociata, um ato político, dentro da academia militar. Alguém aqui acha isso uma coisa adequada?”, disse Tomás. Tratou ainda das comemoraçõ­es do Bicentenár­io da Independên­cia, em Copacabana, no Rio, evento que, meses depois, serviria para a segunda condenação de Bolsonaro no Tribunal Superior Eleitoral.

Tomás lembrou a seus subordinad­os que os desfiles do 7 de Setembro sempre ocorriam na Avenida Presidente Vargas, no centro do Rio. “Nesse ano que passou (2022), mudou. Passou a ser em Copacabana. No final não teve desfile. Mas, para o povo, estava tudo misturado, o que era militar e o que era político.”

Tomás completou. “Houve diversas interferên­cias políticas em temas militares. Em 2021, estava na pandemia, o general Pazuello estava na ativa e foi em uma motociata, acompanhan­do o presidente. E sobe no palanque. Comportame­nto inadequado. Quando o ato é público, a gente tem de falar que foi inadequado.” •

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