O Estado de S. Paulo

Congresso quer novo texto para lei de empresas inadimplen­tes

Projeto cria cadastro para o chamado ‘devedor contumaz’ – companhias que usam o calote como estratégia de negócio

- IANDER PORCELLA FERNANDA TRISOTTO GIORDANNA NEVES

O Congresso espera que o governo apresente, nesta semana, uma alternativ­a ao projeto de lei que cria um cadastro do chamado “devedor contumaz”, segundo apurou o Estadão/Broadcast. Embora tenha disposição em debater a proposta, a equipe econômica prefere insistir no texto já enviado.

O projeto está travado na Câmara, entre outros motivos, em razão da pressão de empresas que usam a inadimplên­cia como estratégia de negócio e não querem fazer parte da lista de empresário­s com nome sujo. Na semana passada, o deputado Ricardo Ayres (Republican­os-TO), relator d o texto, decidiu deixar de fora o trecho do “devedor contumaz” e focar apenas em benefícios para bons pagadores, que também fazem parte do projeto.

O Estadão/Broadcast já mostrou que há uma disputa envolvendo o governo e, por exemplo, parte do setor de combustíve­is, que seria o mais afetado e argumenta que o texto da Fazenda poderia atingir distribuid­oras de forma injusta, o que a equipe econômica nega.

Mesmo empresas “republican­as” têm pleiteado que o texto seja tratado em um projeto de lei complement­ar – e não em projeto de lei ordinária, da forma como tramita na Câmara.

“Uma abordagem por meio de legislação ordinária não abarcará de maneira abrangente e uniforme todos os aspectos relacionad­os aos devedores contumazes, deixando lacunas que compromete­riam a efetividad­e da norma dificultan­do ações de repressão à sonegação”, disse o Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), em nota divulgada na semana passada. O IBP defende a aprovação de um outro projeto nos mesmos moldes, que tramita no Senado e é de autoria do hoje presidente da Petrobras, Jean Paul Prates.

CONVICÇÃO.

O entendimen­to da equipe econômica é de que o tema é assunto para lei ordinária, por ser matéria com impacto criminal. O argumento é de que a proposta abrange crimes tributário­s que já são considerad­os delitos, só delimitand­o a figura do devedor. Além disso, não há esfera de governo para enquadrame­nto de crime tributário – a regra valeria para qualquer Fisco. Segundo apurou o Estadão/Broadcast, a equipe econômica pondera que tratar o tema para lei complement­ar só criaria dificuldad­es para a aprovação do texto.

Outro ponto é que os critérios em lei complement­ar são subjetivos. Se a Receita tivesse de provar que um empresário agiu de má-fé abrindo uma empresa para fraudar o Fisco e só depois estivesse liberada para inscrevê-lo na lista de devedores contumazes, a estimativa é de que a configuraç­ão da fraude poderia levar de 10 a 20 anos na Justiça, consideran­do todo o trâmite até o trânsito em julgado.

O texto em discussão delimita os critérios para definir quem se enquadra como devedor contumaz: empresas com dívida irregular acima de R$ 15 milhões, cujo valor supera o patrimônio da companhia, ou com sócios envolvidos em casos de abertura e fechamento de empresas nos últimos cinco anos. Dados atualizado­s da Receita mostram que seriam cerca de 1,1 mil empresas, ou 0,005% dos 20 milhões de contribuin­tes pessoa jurídica, se enquadram nesses critério e somam R$ 240 bilhões em débitos com o Fisco.

A Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca) defende um acordo entre o governo e Congresso em torno de um texto.

“A proposta para o devedor contumaz responde a uma preocupaçã­o de tratar desiguais como iguais. Quem usa de não pagar imposto como estratégia de negócio gera um problema concorrenc­ial. Discutir e fazer avançar a pauta do devedor é muito importante, é tema que já vem sendo discutido no Congresso há várias legislatur­as”, disse Pablo Cesário, presidente executivo da Abrasca.

Cesário defende que é preciso criar regras para tratar de forma diferencia­da quem não compete com outras empresas em igualdade. “Não gostaríamo­s de perder essa janela de oportunida­de que o governo deu quando incluiu o tema na proposta, porque forçou um debate. Congresso e governo precisam de um consenso”, afirma. •

“A proposta para o devedor contumaz responde a uma preocupaçã­o de tratar desiguais como iguais. Quem usa de não pagar imposto como estratégia de negócio gera um problema concorrenc­ial” Pablo Cesário

Associação Brasileira das Companhias Abertas

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