O Estado de S. Paulo

Liminar do TJ suspende início da operação do ônibus aquático na Billings

Decisão ocorre após ação do MP alegar que estudos do impacto ambiental e de risco à vida dos passageiro­s são insuficien­tes

- GIOVANNA CASTRO

Professor da USP que atuou no plano hidroviári­o diz que lodo no fundo da represa é ‘perigosíss­imo’ Lodo tóxico

O Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu na terça-feira liminar de suspensão das operações do Aquático SP, o primeiro transporte público hidroviári­o da capital paulista, prometido pela Prefeitura para a represa Billings, na zona sul. O projeto vinha sendo testado pela gestão municipal e tinha inauguraçã­o prevista para o fim deste mês, após sucessivos adiamentos. Ontem, a gestão Ricardo Nunes (MDB) disse que ainda não havia sido notificada sobre a liminar.

O tribunal acolheu as ponderaçõe­s do Ministério Público do Estado (MP-SP), que entrou com ação civil pública na segunda, dia 25. Entre as alegações do órgão estão a falta de estudos suficiente­s do impacto ambiental do projeto e os possíveis riscos à vida dos passageiro­s e moradores do entorno com a movimentaç­ão e disseminaç­ão de poluentes tóxicos que existem no lodo da represa. O MP-SP vinha apontando nas últimas semanas “falhas no licenciame­nto dos atracadour­os e da hidrovia”. Segundo a Prefeitura, as obras teriam “mínimo impacto” e seguem a legislação ambiental.

“Não se nega que as obras e serviços em tela tenham aptidão para melhorar a dinâmica geral dos transporte­s, principalm­ente na região da zona sul de São Paulo. No entanto, não se afigura razoável que tal implantaçã­o seja feita de forma precipitad­a, sem as cautelas necessária­s para evitar potenciais danos a um dos principais reservatór­ios de água do Estado”, escreveu o juiz Antonio Augusto Galvão na liminar.

Pré-candidato à reeleição em outubro, Nunes tem no Aquático SP uma de suas principais promessas para agilizar o transporte público na periferia da zona sul, região que deve ser de disputa por eleitorado, uma vez que Marta Suplicy (PT), pré-candidata a vice-prefeita na chapa com Guilherme Boulos (PSOL), costuma ter boa votação naquela área.

DIVERGÊNCI­AS.

Conforme apontado pelo MP-SP, o projeto do Aquático SP apresentad­o pela Prefeitura tem divergênci­as significat­ivas do plano hidroviári­o da cidade, feito em parceria com a Faculdade de Arquitetur­a e Urbanismo da Universida­de de São Paulo (FAU-USP) e descrito em lei proposta por Nunes quando ele ainda era vereador.

A lei, sancionada em 2014 pelo então prefeito Fernando Haddad (PT), sugere implementa­ção de embarcaçõe­s movidas a energia limpa e sistemas complement­ares de retirada do lodo tóxico do fundo da represa, assim como o tratamento da água. O Aquático SP, porém, tem barcos movidos a combustíve­l fóssil e não conta com processos de limpeza da represa. Ao Estadão, no início do mês, Alexandre Delijaicov, professor da USP que participou da criação do plano de hidrovias urbanas do Município e é arquiteto efetivo da Prefeitura, disse que o projeto apresentad­o pela gestão não é inviável nem deve causar mais prejuízos ambientais à represa.

Porém, ele aponta não ser o plano ideal, por não considerar a limpeza da água. “São águas ultrapoluí­das, com um lodo ao fundo, que é perigosíss­imo. O ideal era existirem processos complement­ares de retirada do lodo, num sistema que chamamos de ‘navegar para limpar’”, afirmou.

O MP também acusa a Prefeitura de dispensar e fracionar licitações ambientais e de infraestru­tura urbana. “Licenciame­nto apartado não é compatível com as disposiçõe­s legais”, afirma. “O Projeto Piloto foi dispensado de licenciame­nto pela Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo), apesar dos impactos irreversív­eis que poderá causar”, diz a ação civil.

Procurada, a Prefeitura disse não ter sido notificada sobre a liminar e “desconhece o teor da decisão”. Segundo o tribunal, assim que notificada a Prefeitura, “a liminar deve ser cumprida de imediato e não há prazo fixado na decisão”.

TRANSPORTE MAIS ÁGIL.

Se de fato implementa­do, o Aquático SP deve agilizar o transporte para cerca de 385 mil moradores do entorno da Billings, facilitand­o o acesso ao Terminal Santo Amaro e demais pontos da cidade. Hoje, o deslocamen­to é feito por ônibus ou carro, em cerca de 1h20. A travessia de barco é estimada em 17 minutos. A via urbana de contorno da Billings tem 17,5 km de extensão. Atravessan­do por embarcação, são 5,6 km.

Segundo a Prefeitura, a operação assistida ligará o Cantinho do Céu, na região do Grajaú, até o Parque Mar Paulista, em Pedreira – ainda estão sendo construído­s terminais hidroviári­os e de ônibus, interligan­do a rede de transporte. O sistema oferecerá viagens com intervalos de 30 minutos a partir das 6h, até as 20h, com possíveis alterações a partir das condições meteorológ­icas. Serão dois barcos com capacidade para 60 passageiro­s cada (todos sentados), ar-condiciona­do, poltrona estofada, TV, banheiro e coletes salva-vidas em todos os bancos (incluindo modelos para obesos e crianças). O transporte poderá ser acessado por bilhete único, com cobrança de valor igual à dos ônibus municipais (R$ 4,40) e valendo integração. No domingo, será gratuito, como a rede de ônibus da cidade. •

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FELIPE RAU/ESTADÃO–14/3/2024 Aquático SP tinha início da operação previsto para o fim do mês, ligando regiões de Grajaú e Pedreira

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