Moscovis dá vida a um corcunda avarento na volta à faixa das 18h
Dramaturgia Perfil Ator volta às novelas interpretando Quintino Ariosto, um poderoso empresário, em ‘No Rancho Fundo’, que estreia hoje
“Está tudo certo”, repete Eduardo Moscovis algumas vezes no bate-papo com a reportagem do Estadão, por telefone. Com leveza e bom humor, ele diz que também “está tudo certo” chamá-lo de Du. “Se me chamar de Eduardo, daqui a pouco vai querer me chamar de senhor, e aí f...”, diz. Du, de 55 anos, 30 depois de sua estreia em novelas, volta ao horário das seis para viver Quintino Ariosto em No Rancho Fundo, da TV Globo.
Escrita por Mário Teixeira e com direção artística de Allan Fiterman, a comédia romântica estreia nesta segunda-feira, 15, em substituição ao remake de Elas Por Elas. Foi nessa faixa que Du emplacou personagens como Julião Petruchio, de O Cravo e a Rosa; Carlão, de Pecado Capital; e Rafael Souza, de Alma Gêmea. Havia quase duas décadas que ele não aparecia tão cedo na casa dos telespectadores da TV aberta.
Ao contrário dos galãs que interpretou no horário – Petruchio e Carlão, na verdade, mocinhos meio tortos –, dessa vez, Du dará vida a um poderoso e avarento empresário, dono de uma mineradora na fictícia cidade de Lapão da Beirada, no sertão nordestino.
Quintino Ariosto, explica Du, é um sujeito “árido” e “ressequido”. Casado há anos com Dona Manuela, interpretada por Valdineia Soriano, o casal não conseguiu ter filhos. Apegado às tradições, ele se culpa por não deixar um herdeiro de sangue para dar prosseguimento aos seus negócios e ao nome da família. E se remói com a desconfiança de que o filho adotivo Artur Ariosto, personagem de Túlio Starling, é descendente legítimo de sua mulher.
Tudo isso pesa. Ariosto, como mostram as chamadas da novela, quase se arrasta ao andar. Tem ainda uma leve corcunda, um corpo que parece ter dificuldade em se locomover. Foi assim que ele sentiu o personagem que lhe foi confiado. “O Mário (Teixeira), conversando comigo, o desenhou dessa maneira. Ele falou sobre essa aridez e comparou o Ariosto com a terra seca. O texto, não só como ele faz as tramas acontecerem, cria diálogos muito bons. Fiquei muito surpreso logo nas primeiras leituras”, diz o ator.
Com a dica do autor, Du, então, imaginou Ariosto mais velho do que ele realmente é. De alma velha, melhor dizendo. E não se importa em passar essa imagem na TV, algo bem distante de alguns personagens que já interpretou. “É isso, né cara? O tempo vai passando mesmo. Estamos todos indo adiante”, diz, entre risos. “Estou me sentindo bem com o Ariosto. Não é um personagem fácil. Tem muitas nuances e contradições. E pode ser que ele fique ainda mais corcunda.”
Os olhos de Ariosto só brilharão, adianta o ator, quando Zefa Leonel, uma garimpeira e justiceira interpretada por Andréa Beltrão, encontrar uma pedra preciosa na Gruta Azul. O empresário fará de tudo para pôr as mãos no valioso material.
VILÃO OU MOCINHO? Du, entretanto, afirma que até o momento não enxerga Ariosto como um vilão. “Não estou escondendo nada. Mas acho que ele não é mesmo”, diz. O ator diz estar ainda em um processo de aproximação do personagem, o que revela seu método de composição. “É um exercício de aproximação. Eu, Du, ator, chegando nesse cara. E, o contrário: esse cara chegando em mim. Em que ele me afeta? Para o bem ou para o mal? Disso, eu jogo para a trama. Para que eu fique à vontade com ele. Se o Ariosto for fazer maldades, terei que lidar com isso”, explica.
De vilão, Du entende. Fez o Brandão na série Bom Dia, Verônica. Um sujeito terrível, abusador, violento e corrupto. Um dos maiores sucessos recentes da Netflix, agora na terceira e última temporada, já sem o ator. Além de ódio, Brandão despertou nas mulheres a coragem de denunciar seus algozes. “O Brandão servia para aquilo. Na nossa função social, alertamos que existem caras como ele. Desses que se vestem de bom moço, de família tradicional, com a esposa em casa, que leva para passear no domingo, mas são abusadores”, diz.
Essa possibilidade de interpretar personagens com nuances tão diferentes foi possível, na visão de Du, em função de decisão que ele tomou logo após a novela Alma Gêmea, de 2005, quando, depois dar vida a mais um mocinho, decidiu dar um tempo dos folhetins e buscar novos trabalhos. Coincidentemente, Alma Gêmea, de Walcyr Carrasco, ganhará sua segunda reprise na TV aberta a partir de 6 de maio, no Vale a Pena Ver de Novo.
NOVELAS. “Eu estava começando a me incomodar em ficar preso a uma novela. Não conseguia experimentar outros veículos, outras formas de representação, outra pegada de personagem. Decidi não renovar o contrato com a Globo. Agora, me dou conta que esse movimento que eu fiz foi importantíssimo para minha carreira”, afirma.
Em No Rancho Fundo, Du diz identificar uma empolgação que há tempos não sentia nesse tipo de trabalho, mesmo com todo o peso que ele traz. “Dizem que fazer novela é uma maratona, uma corrida de longa distância. Mas não é. É um Ironman daqueles! Apesar disso, estou muito animado! Estou inquieto, querendo ler os capítulos novos e estar na gravação. Se eu continuasse naquela batida (na época de Alma Gêmea), talvez eu não tivesse mais essa vontade de fazer uma novela.” •
“Dizem que fazer novela é uma maratona. Mas não é. É um Ironman daqueles!”
“Eu estava começando a me incomodar em ficar preso a uma novela. Decidi não renovar com a Globo. Agora, me dou conta como isso foi importantíssimo para minha carreira” Eduardo Moscovis Ator