O Estado de S. Paulo

Moscovis dá vida a um corcunda avarento na volta à faixa das 18h

Dramaturgi­a Perfil Ator volta às novelas interpreta­ndo Quintino Ariosto, um poderoso empresário, em ‘No Rancho Fundo’, que estreia hoje

- DANILO CASALETTI

“Está tudo certo”, repete Eduardo Moscovis algumas vezes no bate-papo com a reportagem do Estadão, por telefone. Com leveza e bom humor, ele diz que também “está tudo certo” chamá-lo de Du. “Se me chamar de Eduardo, daqui a pouco vai querer me chamar de senhor, e aí f...”, diz. Du, de 55 anos, 30 depois de sua estreia em novelas, volta ao horário das seis para viver Quintino Ariosto em No Rancho Fundo, da TV Globo.

Escrita por Mário Teixeira e com direção artística de Allan Fiterman, a comédia romântica estreia nesta segunda-feira, 15, em substituiç­ão ao remake de Elas Por Elas. Foi nessa faixa que Du emplacou personagen­s como Julião Petruchio, de O Cravo e a Rosa; Carlão, de Pecado Capital; e Rafael Souza, de Alma Gêmea. Havia quase duas décadas que ele não aparecia tão cedo na casa dos telespecta­dores da TV aberta.

Ao contrário dos galãs que interpreto­u no horário – Petruchio e Carlão, na verdade, mocinhos meio tortos –, dessa vez, Du dará vida a um poderoso e avarento empresário, dono de uma mineradora na fictícia cidade de Lapão da Beirada, no sertão nordestino.

Quintino Ariosto, explica Du, é um sujeito “árido” e “ressequido”. Casado há anos com Dona Manuela, interpreta­da por Valdineia Soriano, o casal não conseguiu ter filhos. Apegado às tradições, ele se culpa por não deixar um herdeiro de sangue para dar prosseguim­ento aos seus negócios e ao nome da família. E se remói com a desconfian­ça de que o filho adotivo Artur Ariosto, personagem de Túlio Starling, é descendent­e legítimo de sua mulher.

Tudo isso pesa. Ariosto, como mostram as chamadas da novela, quase se arrasta ao andar. Tem ainda uma leve corcunda, um corpo que parece ter dificuldad­e em se locomover. Foi assim que ele sentiu o personagem que lhe foi confiado. “O Mário (Teixeira), conversand­o comigo, o desenhou dessa maneira. Ele falou sobre essa aridez e comparou o Ariosto com a terra seca. O texto, não só como ele faz as tramas acontecere­m, cria diálogos muito bons. Fiquei muito surpreso logo nas primeiras leituras”, diz o ator.

Com a dica do autor, Du, então, imaginou Ariosto mais velho do que ele realmente é. De alma velha, melhor dizendo. E não se importa em passar essa imagem na TV, algo bem distante de alguns personagen­s que já interpreto­u. “É isso, né cara? O tempo vai passando mesmo. Estamos todos indo adiante”, diz, entre risos. “Estou me sentindo bem com o Ariosto. Não é um personagem fácil. Tem muitas nuances e contradiçõ­es. E pode ser que ele fique ainda mais corcunda.”

Os olhos de Ariosto só brilharão, adianta o ator, quando Zefa Leonel, uma garimpeira e justiceira interpreta­da por Andréa Beltrão, encontrar uma pedra preciosa na Gruta Azul. O empresário fará de tudo para pôr as mãos no valioso material.

VILÃO OU MOCINHO? Du, entretanto, afirma que até o momento não enxerga Ariosto como um vilão. “Não estou escondendo nada. Mas acho que ele não é mesmo”, diz. O ator diz estar ainda em um processo de aproximaçã­o do personagem, o que revela seu método de composição. “É um exercício de aproximaçã­o. Eu, Du, ator, chegando nesse cara. E, o contrário: esse cara chegando em mim. Em que ele me afeta? Para o bem ou para o mal? Disso, eu jogo para a trama. Para que eu fique à vontade com ele. Se o Ariosto for fazer maldades, terei que lidar com isso”, explica.

De vilão, Du entende. Fez o Brandão na série Bom Dia, Verônica. Um sujeito terrível, abusador, violento e corrupto. Um dos maiores sucessos recentes da Netflix, agora na terceira e última temporada, já sem o ator. Além de ódio, Brandão despertou nas mulheres a coragem de denunciar seus algozes. “O Brandão servia para aquilo. Na nossa função social, alertamos que existem caras como ele. Desses que se vestem de bom moço, de família tradiciona­l, com a esposa em casa, que leva para passear no domingo, mas são abusadores”, diz.

Essa possibilid­ade de interpreta­r personagen­s com nuances tão diferentes foi possível, na visão de Du, em função de decisão que ele tomou logo após a novela Alma Gêmea, de 2005, quando, depois dar vida a mais um mocinho, decidiu dar um tempo dos folhetins e buscar novos trabalhos. Coincident­emente, Alma Gêmea, de Walcyr Carrasco, ganhará sua segunda reprise na TV aberta a partir de 6 de maio, no Vale a Pena Ver de Novo.

NOVELAS. “Eu estava começando a me incomodar em ficar preso a uma novela. Não conseguia experiment­ar outros veículos, outras formas de representa­ção, outra pegada de personagem. Decidi não renovar o contrato com a Globo. Agora, me dou conta que esse movimento que eu fiz foi importantí­ssimo para minha carreira”, afirma.

Em No Rancho Fundo, Du diz identifica­r uma empolgação que há tempos não sentia nesse tipo de trabalho, mesmo com todo o peso que ele traz. “Dizem que fazer novela é uma maratona, uma corrida de longa distância. Mas não é. É um Ironman daqueles! Apesar disso, estou muito animado! Estou inquieto, querendo ler os capítulos novos e estar na gravação. Se eu continuass­e naquela batida (na época de Alma Gêmea), talvez eu não tivesse mais essa vontade de fazer uma novela.” •

“Dizem que fazer novela é uma maratona. Mas não é. É um Ironman daqueles!”

“Eu estava começando a me incomodar em ficar preso a uma novela. Decidi não renovar com a Globo. Agora, me dou conta como isso foi importantí­ssimo para minha carreira” Eduardo Moscovis Ator

 ?? MANOELLA MELLO/GLOBO ?? Ator incorporou um andar arrastado ao personagem: ‘Se o Ariosto fizer maldades, terei de lidar com isso’
MANOELLA MELLO/GLOBO Ator incorporou um andar arrastado ao personagem: ‘Se o Ariosto fizer maldades, terei de lidar com isso’

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil