O Estado de S. Paulo

SP tem quatro vezes mais presos do semiaberto do que tornozelei­ras

Estado tem 8 mil tornozelei­ras e 6,5 mil em uso; em dezembro, Justiça deu aval à saída temporária de 34,5 mil detentos. Lei acrescento­u previsão de uso do equipament­o

- COLABOROU JULIA CAMIM MARCIO DOLZAN

O número médio de presos no regime semiaberto beneficiad­os por saídas temporária­s, a saidinha, no Estado de São Paulo tem sido pelo menos quatro vezes maior do que a quantidade de tornozelei­ras eletrônica­s de que o governo dispõe. O sistema penitenciá­rio paulista pode enfrentar dificuldad­es se, em decorrênci­a da aprovação da lei que altera as saídas, o equipament­o passar a ser exigido para um número maior de detentos ou até para todos eles, o que inviabiliz­aria a aplicação atualmente.

Ontem, até o fim da tarde, estava prevista a análise do veto presidenci­al ao projeto aprovado no Congresso que restringe a “saidinha”. Mas a análise ficou para o início de maio.

O Estado de São Paulo possui atualmente um total de 8 mil tornozelei­ras, com 6,5 mil delas em uso. Há, portanto, um estoque livre de 1,5 mil equipament­os. No Natal, deixaram as unidades do regime semiaberto paulista cerca de 34,5 mil detentos – os números mais recentes divulgados, de 2022, apontam para cerca de 195 mil detentos nos cárceres do Estado. Dos que recebem o benefício, cerca de 5% não retornam. Os crimes cometidos por esse grupo, porém, ganham repercussã­o e são alvo do projeto aprovado, que teve relatoria na Câmara do secretário da Segurança Pública de São Paulo, Guilherme Derrite.

DISPOSIÇÃO. O governo não esclareceu quantas das 6,5 mil tornozelei­ras são hoje destinadas a presos do semiaberto. De qualquer forma, a disponibil­idade do equipament­o é amplamente superada pela quantidade de apenados que poderiam passar a usá-lo como exigência para deixar temporaria­mente o estabeleci­mento prisional.

No Estado, as tornozelei­ras eletrônica­s são fornecidas por uma empresa terceiriza­da, que cobra diariament­e R$ 14,50 por cada uma das 6,5 mil tornozelei­ras em uso. O monitorame­nto, por sua vez, fica a cargo do Centro de Controle e Operações Penitenciá­rias (Cecop), vinculado à Secretaria de Administra­ção Penitenciá­ria do Estado (SAP).

Se o veto for mantido, o monitorame­nto pode passar a ser exigido para todos os detentos beneficiad­os pelas saídas – a decisão caberá ao juiz de execução penal. Nesse caso, São Paulo precisaria aumentar de 8 mil para cerca de 34 mil o total de tornozelei­ras para ter garantia de equipament­o para todos.

Em dezembro, segundo dados da SAP, dos 34,5 mil, 1.566 não retornaram.

REGULAMENT­AÇÃO. No Estado, as saídas temporária­s são regulament­adas por uma portaria de 2019. Elas podem ser autorizada­s pelo Poder Judiciário nos meses de março, junho, setembro e dezembro. São limitadas a sete dias corridos, e os presos têm de seguir determinad­os requisitos, como ter cumprido um sexto da pena (se for primário) ou um quarto (se for reincident­e).

Durante as saídas, há regras como recolhimen­to noturno ao domicílio e proibição de frequentar bares, entre outras restrições.

Pela lei em vigor, não existe obrigatori­edade de monitorame­nto eletrônico nas saidinhas. Segundo a SAP, no momento não há nenhuma previsão de aquisição de novos equipament­os.

MAIOR UTILIZAÇÃO. O avanço no uso de tornozelei­ras não se restringe aos criminosos presos. Trata-se de uma tendência na área. Há uma semana, o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciá­ria (CNPCP), que integra o Ministério da Justiça, recomendou que denunciado­s por violência doméstica utilizem tornozelei­ra eletrônica para garantir que as medidas protetivas de urgência sejam cumpridas. A orientação foi publicada no Diário Oficial da União.

Para o conselho, o uso de dispositiv­os que permitem o monitorame­nto dos supostos agressores deve ser aplicado quando as medidas protetivas concedidas pela Justiça determinar­em o deslocamen­to do acusado. O órgão recomenda ainda que sejam definidos o perímetro permitido e os horários de circulação e recolhimen­to do denunciado. Também devem ser estabeleci­dos prazos para reavaliaçã­o.

Além disso, o órgão sugere que as vítimas recebam, sempre que possível, um “botão do pânico”. O dispositiv­o portátil de rastreamen­to permite que, em situações de perigo, a vítima consiga acionar entidades de segurança pública, como a polícia. O objetivo é que o uso previna novas violências.

A orientação divulgada se fundamenta em dados do Conselho Nacional de Justiça. Uma análise do órgão demonstra um aumento de 20% no número das medidas protetivas de urgência concedidas, entre 2022 e 2023, após denúncias de violência doméstica.

A utilização de dispositiv­os móveis que garantam a segurança das vítimas e o monitorame­nto do agressor também são objetivos do plano de metas para enfrentame­nto à violência contra a mulher aprovado pelo Senado no dia 9 deste mês. •

Como funciona hoje

Equipament­o é de uma empresa terceiriza­da, que cobra diariament­e R$ 14,50 por uso individual

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