Base de Lula perde espaço nas redes para a direita
Segundo estudo da FGV, temas defendidos pelo governo ganham mais engajamento da oposição; Congresso tem maioria conservadora
Sob um Congresso Nacional com perfil mais conservador, a base de apoio do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva perdeu o protagonismo para parlamentares de direita no debate sobre temas ligados à gestão federal. Estudo da FGV Comunicação Rio, obtido pelo Estadão/Broadcast, identificou que, nos quatro primeiros meses deste ano, congressistas de direita e ligados ao expresidente Jair Bolsonaro (PL) tiveram maior engajamento em assuntos como o projeto de lei das “saidinhas”, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) das Drogas, além de discussões sobre aborto.
O estudo analisou publicações em três redes sociais – X, antigo Twitter; Facebook; e Instagram – entre 1º de janeiro e 23 de abril deste ano. Nos debates sobre aborto, drogas e “saidinhas”, a oposição teve maior protagonismo nas redes sociais, especialmente no X e no Facebook. Já no Instagram, o debate tendeu a um maior equilíbrio. Ter maior engajamento significa que as postagens feitas nas redes sociais mobilizaram mais pessoas.
OPOSIÇÃO. De acordo com o levantamento, no engajamento médio, parlamentares de oposição se destacam em todos os temas. No debate sobre as “saidinhas”, a oposição tem 78,4% de engajamento, enquanto os congressistas da base governista representam 7,09% do engajamento total sobre o tema. Sobre a PEC das Drogas, a oposição registra 82,33% de engajamento, enquanto deputados e senadores do governo têm 5,91%. Na discussão sobre o aborto, a oposição teve 63,63% de engajamento, e a base da gestão federal registra 7,38%.
A discussão sobre as “saidinhas” representou o tema de maior interação nas redes desde o início de 2024. O assunto motivou o maior número de picos expressivos no debate político. O levantamento aponta um domínio da direita alinhada a Bolsonaro na discussão sobre o assunto, “predominando a noção de que o governo e, principalmente, Lula agem com leniência em relação à criminalidade”.
Segundo o estudo, o veto do governo federal a um trecho do PL “foi acionado como evidência de que Lula se importa mais com criminosos do que com as ‘vítimas da violência’”. A narrativa fez com que o veto repercutisse mais nas redes sociais do que a própria sanção do projeto. No início de abril, o chefe do Executivo vetou o trecho para manter a saída temporária de presos do regime semiaberto, permitindo que eles possam visitar a família. O dispositivo é considerado ponto central do projeto.
‘VALOR CRISTÃO’. Apesar da decisão da gestão federal, o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, na época, tentou fazer um aceno ao campo conservador e minimizar o ato ao afirmar que o direito de visitar a família é importante por ser um “valor cristão”. Nomes como o de Bolsonaro, da deputada Carla Zambelli (PL-SP) e do senador Sérgio Moro (União Brasil-PR) foram os que se envolveram nesse debate.
Envolvimento semelhante no campo progressista, contudo, não foi notado. Segundo o estudo, desde a votação do projeto, em março, a esquerda só conseguiu destaque ao relacionar o assunto com o deputado Chiquinho Brazão, apontado pela Polícia Federal (PF) como um dos mandantes da execução da vereadora Marielle Franco (PSOL), em 2018.
No debate sobre o deputado, foi indicada suposta incoerência dos congressistas de direita que defenderam o fim das “saidinhas”, mas votaram contra a prisão de Brazão.
PATRIOTA. O debate religioso e patriota é mobilizado nas mídias sociais em especial nos temas da PEC das Drogas e do aborto. Enquanto isso, os parlamentares da base se concentram em postagens informativas e de defesa do governo.
Para o professor da FGV Victor Piaia, um dos coordenadores do estudo, mesmo que o grupo da direita mais radical nas redes sociais não seja expressivo, gera um engajamento com foco no desgaste do governo. “Pessoas mais engajadas geram efeitos mais fortes do que as que não estão bem coordenadas”, como a base da gestão federal, observou.