Cúpula do Exército dá aval à volta de órgão que apura mortes na ditadura
Oficiais da Força já deram sinal verde para a recriação da Comissão de Mortos e Desaparecidos, extinta na gestão Bolsonaro
Apesar de o governo Lula afirmar que não instala a Comissão de Mortos e Desaparecidos para evitar atritos com as Forças Armadas, oficiais da cúpula do Exército já deram sinal verde e concordam com a volta da comissão e a retomada das investigações interrompidas pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Segundo esses oficiais, todas as famílias têm o direito de saber o que aconteceu com parentes e amigos desaparecidos durante os anos da ditadura militar. Criada com a Lei 9.140, em 1995, pelo presidente Fernando Henrique Cardoso, a comissão ainda é tratada como tabu por alguns militares.
Esses mesmos oficiais, entretanto, entendem que a busca não pode ser um fim em si mesma. Mas deve servir para explicar tudo aquilo que possa ser esclarecido e, levando em consideração os anos que se passaram, buscar documentos extraviados, relatórios perdidos e as respostas possíveis, para encerrar o assunto de uma vez.
Oficiais se dizem preocupados com a possibilidade de muitas famílias ficarem decepcionadas porque, a esta altura, depois de tantos anos, não será fácil conseguir as respostas que muitos esperam. Mas reconhecem a importância de buscar e encontrar tudo que seja possível achar.
JUSTIÇA. A Casa Civil, que, segundo autoridades do governo, estaria entre os que se opõem à instalação da comissão, recebeu um parecer do Ministério da Justiça e Segurança Pública favorável à retomada dos trabalhos. O ministério já havia chancelado a volta ainda sob a gestão de Flávio Dino, hoje ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). Porém, o governo optou por submeter o tema também ao novo titular da pasta da Justiça, Ricardo Lewandowski.
Na sexta-feira passada, o ministério deu parecer favorável para que a comissão seja reinstalada, cumprindo a promessa feita pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ainda antes da posse. Mas os ataques às sedes dos três Poderes em Brasília no dia 8 de janeiro do ano passado e os processos judiciais envolvendo oficiais que tramitam na Polícia Federal e no Supremo Tribunal Federal (STF) acabaram por postergar a instalação por causa do clima tenso com os militares.
Ainda na gestão do ministro Flávio Dino, o ministério defendia a ideia de que não haveria impactos negativos, tendo em vista os trabalhos feitos pelo grupo desde 1995. Em outras palavras, não se trata de uma novidade.
O acervo da comissão é formado, principalmente, pelo conjunto de documentos, os “processos” – com pareceres sobre indenizações a familiares e também pela busca e localização dos restos mortais das vítimas – que serviram como base quando começaram os trabalhos da Comissão Nacional da Verdade, criada durante o governo da presidente Dilma Rousseff (PT). Os processos foram também usados pelas comissões da verdade estaduais e municipais instaladas em todo o Brasil.
DIREITOS HUMANOS. O colegiado foi extinto no fim do governo Bolsonaro, quando faltavam 15 dias para ele deixar o Palácio do Planalto. Com a chegada de Lula à Presidência, o ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, anunciou que a recriação do colegiado era uma das principais metas da sua gestão. Apesar disso, a proposta elaborada por Almeida travou em meio à apreensão na gestão petista, que tem apostado numa política de conciliação com as Forças Armadas.
Um exemplo dessa estratégia de apaziguamento foi a ordem dada por Lula para cancelar todos os atos alusivos aos 60 anos do golpe militar, em março. A pasta de Silvio Almeida teve de desfazer os preparativos de um evento que seria realizado no Museu Nacional da República. •
Parecer
Na sexta-feira passada, o Ministério da Justiça deu parecer favorável para que a comissão seja reinstalada