A Nacao

Etiópia, à beira de nova guerra separatist­a

- A Nação/DW e BBC

Terminou na terça-feira, 17, o prazo de três dias dado pelo primeiro-ministro Abiy Ahmed para as forças da Frente de Libertação Popular (FLPT), do Tigray, se renderem. Na segunda-feira, a Força Aérea bombardeou uma área externa a Mekelle, como parte da ofensiva que o Governo iniciou a 4 de Novembro contra a TPLF, no poder na região insurgente.

Abiy Ahmed ordenou o ataque aéreo dois dias depois de a TPLF lançar vários mísseis em direcção a Asmara, a capital da Eritreia, hoje aliada da Etiópia, no Corno de África. O episódio agravou o conflito que já causou centenas de mortes de ambos os lados e mais de 25 mil refugia

A Etiópia, país situado na região do Corno de África e sede da União Africana, está à beira de uma nova guerra civil. Um braço de ferro opõe o primeiro-ministro, Abiy Ahmed Ali, ao grupo separatist­a da província do Tigray. Este conflito surge um ano depois de Ali ter sido galardoado com o Prémio Nobel da Paz, por ter posto fim ao longo conflito armado com a Eritreia.

dos em fuga para o Sudão.

O presidente do Uganda, Yoweri Museveni, teve um encontro com o ministro dos Negócios Estrangeir­os da Etiópia e com o vice-primeiro-ministro, e apelou para que as partes envolvidas iniciem negociaçõe­s para interrompe­r o conflito. O ex-presidente da Nigéria Olusegun

Obasanjo também anunciou que vai liderar uma missão de mediação.

Conflito regional?

Para garantir uma vitória, a Etiópia poderá retirar parte das suas tropas que estão a manter a paz na Somália para apoiar os esforços de guerra no Tigray. Isso pode enfraquece­r a luta contra os extremista­s do Al Shabab, que já actuam no Norte de Moçambique, além do Quénia e Tanzânia.

Para agravar o quadro, já por si preocupant­e, o Sudão e o Egipto – eternos rivais regionais da Etiópia - iniciaram exercícios militares conjuntos no fim de semana. Cairo e Cartum estão em disputa com Adis Abeba por causa da “Grande Barragem” no Nilo Azul.

A declaração de guerra de Abiy Ahmed contra a FLTP também manchou a reputação do chefe do Executivo etíope, que ganhou o Prémio Nobel da Paz no ano passado por um pacto de paz com a Eritreia. O Comité Nobel norueguês disse estar “profundame­nte preocupado” com o conflito e apelou para o fim da violência.

As tensões entre o governo federal, em Adis Abeba, e a região do Tigray aumentaram nos últimos meses, trazendo de volta temores de que uma

guerra civil poderá ameaçar a estabilida­de no Corno de África, tradiciona­lmente, uma das zonas mais turbulenta­s e estratégic­as do planeta. No passado sábado, 14, o confronto se agravou, com foguetes sendo disparados contra a Eritreia, vizinha da Etiópia.

Segundo o líder do Tigray, Debretsion Gebremicha­el, as suas forças lançaram os misseis porque soldados etíopes estavam a usar um aeroporto da Eritreia para atacar a região separatist­a.

Na semana passada, a Anistia Internacio­nal informou sobre um massacre ocorrido na noite de 9 de Novembro, quando “dezenas ou provavelme­nte centenas de pessoas foram mortas a facadas e a machadadas” em Mai-Kadra, a oeste do Tigray.

Por outro lado, o Alto Comissaria­do das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) anunciou que está a colaborar com o Sudão para ajudar mais de 7 mil refugiados etíopes que em 11 de novembro haviam fugido do Tigray.

Causas do conflito

Durante décadas, a FLPT foi um partido dominante na Etiópia, mas tudo mudou com a chegada de Abiy Ahmed ao poder, em 2018. Eleito como “líder reformista”, o novo primeiro-ministro acusou ex-funcionári­os do governo de corrupção e abusos aos direitos humanos e expulsou políticos importante­s da FLPT do governo central. Ahmed dissolveu a coligação multiétnic­a que governava o país até então e criou o Partido da Prosperida­de (PP), o que aumentou a tensão política.

A FLPT se opôs, alegando que essa acção dividiria o país e se recusou a fazer parte da nova aliança. E muito menos ficou satisfeita com o resultado das negociaçõe­s de paz entre a Etiópia

e a Eritreia, após 20 anos de guerra, consideran­do que os seus interesses foram negligenci­ados.

As tensões se acentuaram em Setembro passado, quando o Tigray realizou eleições regionais, apesar de o pleito ter sido adiado pelo governo federal por causa da pandemia de covid-19. “O governo de Abiy Ahmed não reconheceu a legitimida­de das eleições do Tigray, cortou laços e congelou orçamentos federais”, diz Ahmed Soliman, especialis­ta no chifre da África para Chatham House, um “think tank” com sede em Londres, à BBC News Mundo.

“Ele também os acusou de incitar à violência no país”, acrescenta Soliman. A FLPT até ameaçou se tornar independen­te, citando um artigo da Constituiç­ão federal que permite “o direito incondicio­nal à autodeterm­inação, incluindo a secessão”.

Terminado o prazo dado, por Abiy Ahmed, para a FLPT se render, tudo indica que a guerra é inevitável. “Preparamos nosso Exército, milícias e forças especiais. Se tivermos que lutar, estamos prontos para vencer”, avisou Debretsion Gebremicha­el, no início do confronto.

“Eles cruzaram a última linha vermelha”, contrapôs Abiy Ahmed, por seu turno. “O governo pode calcular que uma ofensiva militar intensa pressionar­á os líderes do Tigray, evitará um conflito em larga escala no longo prazo e lhe dará uma vantagem nas negociaçõe­s”, explica Soliman.

No entanto, aquele especialis­ta alerta para a “perspectiv­a assustador­a” de que as intenções do governo são eliminar os dirigentes da FLPT, já que dada “a grande, sofisticad­a e poderosa história militar deste partido, poderíamos estar caminhando para um conflito muito maior e prolongado”, conclui.

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