Juízes do STJ exigem desagravo aos órgãos de soberania
Os juízes conselheiros do Supremo Tribunal da Justiça (STJ) anunciaram, ontem, que, enquanto se mantiver o “clima de hostilidade” e de “desconsideração à dignidade do Poder Judicial” e dos seus titulares, não tomarão parte em qualquer acto ou solenidade a que devam comparecer por cortesia institucional. Um recado com vários destinatários, todos eles, órgãos de soberania nacional. A situação poderá degradar-se ainda mais.
Conforme a declaração pública, assinada por todos os juízes conselheiros do STJ, exceptuando a presidente, Fátima Coronel, o comunicado público, lido por Benfeito Mosso Ramos, decorre das afirmações de uma deputada da Nação (Mircea Delgado, do MpD), feita no passado dia 29 de Outubro, aquando do debate parlamentar sobre o Estado da Justiça.
Na ocasião, essa parlamentar questionou a situação do sector, evocando vários dos argumentos que têm sido utilizados pelo advogado Amadeu Oliveira, acusando os juízes de serem corruptos, sem que nada aconteça, nem a quem acusa, nem aos acusados (ver caixa ao lado).
Sem citar o nome da deputada, diz a declaração do STJ que a pretexto do referido debate parlamentar, “aproveitou-se para retomar, com indisfarçável propósito de lhes emprestar credibilidade, impropérios que têm vindo a ser desferidos contra certos Magistrados Judiciais, alguns dos quais em exercício na Mais Alta Instância Judicial do nosso País, como é o caso da Veneranda Presidente do Supremo Tribunal de Justiça”.
Os juízes conselheiros reconhecem, no entanto, que constitui, “sem menor dúvida”, direito de os representantes da Nação, bem como de qualquer cidadão criticar e chamar à atenção para as “disfunções” da justiça, mas “o que já não se afigura de todo admissível num Estado de Direito é que esse escrutínio democrático seja aproveitado para se fazer extrapolações visando conspurcar o bom nome de Magistrados, em violação, desde logo, do direito à honra que a Constituição da República reconhece a todos os cidadãos”.
O mesmo colectivo mostra-se contudo indignado com o facto de durante a referida intervenção, “em nenhum momento se ter ouvido uma voz, uma única voz, a convidar a ilustre deputada a respeitar o bom nome de cidadãos indefesos, no caso dos Magistrados Judiciais que, nesta qualidade são tão titulares de órgãos de soberania como os Deputados”.
Mas, “o mais grave”, na óptica desses magistrados, é que passado 27 dias da referida declaração ainda não se tem conhecimento de qualquer demarcação em relação a este assunto, nem do Parlamento, nem do Governo e muito menos do Presidente da República.
A ausência desse desagravo público leva os juízes conselheiros do STJ a presumirem que a intervenção de Mircea Delgado merece a provação de quem, “por razões de princípio, ou pelas suas responsabilidades constitucionais, não pode transigir com tal situação”.
Na sua declaração, os Juízes Conselheiros do STJ repudiam e denunciam, entretanto, a tentativa de “condicionar” o Poder Judicial no país, incluindo a autonomia do Ministério Público, através da retaliação pelas suas decisões, “nalguns casos com o envolvimento ou a anuência de cargos políticos”.
Abertura do ano judicial
Esta declaração pública do STJ é, no fundo, mais um capítulo no mal estar que parece ter-se instalado na justiça e que poderá conhecer outros desenvolvimentos, proximamente. A continuar, tudo indica que o colectivo do STJ não deverá tomar parte na abertura solene do próximo ano judicial que normalmente acontece em Novembro e que é presidida pelo chefe de Estado.