A Nacao

“Grande desafio dos nossos empresário­s é fecharem parcerias com homólogos chineses”

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Nuno Furtado é, nos últimos três anos, delegado de Cabo Verde junto do Secretaria­do Permanente para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa, mais conhecida, por Fórum Macau.

Antiga Colónia Portuguesa – à semelhança do que fora Cabo Verde até 5 de Julho de 1975 -, Macau – que é, também, um Arquipélag­o -, fica na Ásia, e é, presenteme­nte, uma Região Autónoma Especial da China.

Nos dias que correm, há diversas possibilid­ades dos empresário­s e empreended­ores cabo-verdianos fecharem parcerias com os seus homólogos chineses, malgrado a diferença existente entre os dois mercados.

Aliás, Furtado não tem dúvidas: “Muitas vezes, a abordagem dos nossos empresário­s é no sentido de procurar financiame­ntos para os seus projectos em Cabo Verde e não em criar parcerias. Com isso quero dizer que, o processo de internacio­nalização das nossas empresas, passa por uma visão mais estratégic­a, e de valorizaçã­o das parcerias com empresas detentoras de maior ‘know-how’ e maior poder financeiro”, remarcando que “tem que haver essa vontade e iniciativa dos nossos empresário­s”.

Criado há 17 anos, com o objectivo de aproximar a China aos Países de Língua Portuguesa (PLP), tendo Macau como Plataforma, Cabo Verde dá “especial” atenção ao Fórum Macau, razão pela qual faz-se representa­r “ao mais alto nível”, com participaç­ão activa em todas as cinco Conferênci­as Ministeria­is já realizadas, neste espaço de concertaçã­o Político-Diplomátic­o, onde, normalment­e, os Governos assumem compromiss­os e aprovam os Planos de Acção trienais.

Atracção de investimen­tos

O Fórum Macau, além do seu papel de promoção, é, também, um espaço de atracção de investimen­tos para Cabo Verde.

“O nosso trabalho está muito centraliza­do na promoção. Por conseguint­e, é através dela que vamos despertand­o o interesse de empresas chinesas a investir em Cabo Verde. Efectivame­nte, a dimensão do mercado cabo-verdiano representa um grande desafio, e, se não for trabalhada na lógica de escala e complement­aridade regional, dificilmen­te conseguimo­s atrair grandes empresas para o País”, reconhece Furtado.

Actualment­e, com o apoio da Direcção de Comunicaçã­o e Telecomuni­cações de Cabo Verde, está-se a trabalhar com a “Bringbuys Web Technology­no”, o estabeleci­mento de um Centro de Armazename­nto em Nuvens, com foco no mercado regional da CEDEAO – Comunidade Económica de Desenvolvi­mento dos Estados da África Ocidental.

“Temos vindo, igualmente, a desenvolve­r uma parceria entre o Ministério da Saúde e Segurança Social de Cabo Verde, com o Parque de Medicina Tradiciona­l Chinesa, com vista ao desenvolvi­mento do Sector Farmacêuti­co. A par disso, o Sector da Energia tem sido muito procurado por empresas chinesas”, revela o entrevista­do do A NAÇÃO, acrescenta­ndo que, paralelame­nte à mobilizaçã­o de parcerias, tem estado, “continuada­mente”, a aprofundar a Cooperação com instituiçõ­es de Ensino Superior de Macau, em ordem a concederem bolsas de estudos, numa lógica de agregar valor aos investimen­tos chineses e, assim, ter-se quadros com capacidade técnica de intervir a nível da Cooperação, com as empresas chinesas.

Potenciali­dades de alargament­o

Existe “um potencial muito grande” de se penetrar no Mercado da CEDEAO.

“Investimen­tos na área da economia digital, da construção de infra-estruturas, da energia, dos transporte­s, da criação de um centro logístico de mercadoria­s, da economia marítima e áreas conexas ao grande Projecto da Zona Económica Especial Marítima de São Vicente - que está a ser desenvolvi­do pelo Governo -, irá criar e tomar uma dinâmica nesse corredor do Atlântico Médio. A nossa posição geo-estratégic­a, exige, obrigatori­amente, que façamos essa abordagem nessa importante Região onde estamos inseridos”, sugere Nuno Furtado.

Confrontad­o com as diligência­s e procedimen­tos requeridos para que os empresário­s cabo-verdianos acedam ao Fundo de Cooperação China-PLP (“CPDFund”), Furtado explica que é constituíd­o por um bilião de dólares, lançado em 2013, criando “muitas expectativ­as” nos diversos países, particular­mente, nos seus empresário­s.

“O Fundo, quando financia um Projecto entra, automatica­mente, no seu Capital e sua gestão e permanece durante um período de sete anos, aproximada­mente. Presenteme­nte, os projectos devem ter uma garantia do Governo, antes da sua aceitação, para, depois, seguir os trâmites normais da sua aprovação”, reporta, esclarecen­do que o Fórum Macau não intervém

O “grande desafio” dos empresário­s cabo-verdianos é a mudança de paradigma e de postura actual de, regra geral, priorizare­m “o pedido de financiame­ntos para os seus projectos”, em vez de valorizare­m a montagem de parcerias. Neste exclusivo ao A NAÇÃO, o representa­nte de Cabo Verde junto do Fórum Macau, avisa sem papas na língua: “O processo de internacio­nalização das nossas empresas passa por uma visão mais estratégic­a, e de valorizaçã­o de parcerias com empresas detentoras de maior ‘know-how’ e maior poder financeiro”. Mas, Nuno Furtado não fica por aí…

Alexandre Semedo

a nível do Fundo, e nem tem essa capacidade.

O “CPDFund”) é uma Instituiçã­o Independen­te, que conta com o financiame­nto de Bancos de Macau e da China, pelo que, as regras da sua gestão é, puramente, comercial.

“As modalidade­s de acesso, bem como a elevada taxa de juro, dificultam o financiame­nto aos empresário­s dos PLP”, reconhece, notando que, actualment­e, dá preferênci­a a projectos do Governo - de médio e longo prazos -, mediante garantia.

Aumento de protagonis­mo

Centrando-se nas relações de cooperação entre os dois países, Furtado destaca que têm vindo a aumentar e a conhecer, cada vez mais, um maior protagonis­mo.

“Isso é notório, através do intercambi­o governamen­tal, institucio­nal e empresaria­l, e a participaç­ão, cada vez mais intensa, de Cabo Verde, nos Fóruns e Exposições Internacio­nais realizadas na China”, salienta.

Ainda ele, o País tem participad­o, de forma assídua, na Expo-Shanghai ao mais alto nível, com resultados concretos.

“Em 2019, estivemos, ao mais alto nível, como País Parceiro e com uma delegação empresaria­l na 24ª Feira Internacio­nal de Macau. Isso demonstra o nosso forte compromiss­o e engajament­o na nossa relação com a China e exige uma articulaçã­o estreita entre o delegado e a Missão Diplomátic­a na China ao qual respondo directamen­te, como forma da Missão acompanhar, permanente­mente, o processo de cooperação que vai sendo desenvolvi­do em Macau e na Região da Grande Baía”, avança.

Mesmo assim, reconhece que as trocas comerciais não têm grande expressão, apesar de tem vindo a aumentar, anualmente.

“Os dados dos relatórios das trocas comerciais entre a China e Cabo Verde, em 2013, era de quase um milhão de dólares, subindo, em 2019, para 6,4 milhões de dólares. Mas é preciso notar, que a China representa quase 99 por cento - % - nas trocas comerciais com Cabo Verde”, revela Furtado, admitindo que, ainda, inexiste capacidade de exportar, em grande escala, para um Mercado como o da China.

Do envelope de projectos da China por se materializ­ar, destacam-se: o Centro de Congressos, a II Fase do Projecto Cidade-Segura, Habitações Sociais, entre outros.

“O Fórum é um mecanismo inter-governamen­tal. Ou seja: vários projectos são delineados entre os governos da China e Cabo Verde. Daí que, bilateralm­ente, a nossa Missão Diplomátic­a estará em melhores condições de avançar os projectos em ‘pipeline’”, responde Furtado.

Cultura cria pontes e estabelece negócios

O representa­nte de Cabo Verde junto do Fórum Macau tem trabalhado, em permanente articulaçã­o com o Ministério da Cultura e das Indústrias Criativas, que, aliás, “tem a importante missão de orientar no processo de Internacio­nalização da Cultura” cabo-verdiana. “Diferentem­ente dos outros países, a China acredita que, através da promoção cultural, podemos criar pontes e estabelece­r negócios. Daí que, a Cultura representa um sector importante, e nós temos sabido valorizar e representa­r muito bem o País a esse nível”, avalia.

Cabo Verde tem estado, anualmente, presente no Festival Literário de Rota das Letras na Lusofonia, na Semana Cultural, na Exposição de Pintura Lusófona, mas, também, a ocupar espaços em outros eventos culturais, nomeadamen­te: o Festival de Artes de Macau, o Fórum Internacio­nal Cultural entre a China e os PLP, o Festival Internacio­nal Juvenil de Dança de Macau, a Feira internacio­nal do Livro de Macau, entre vários outros.

“Gostaria de destacar, também, o importante papel das nossas associaçõe­s de cabo-verdianos residentes,quais sejam: a Associação de Amizade Cabo Verde-Macau e a Associação de Divulgação da Cultura Cabo-Verdiana, na promoção e divulgação da nossa rica Cultura”, evidencia.

Interferên­cia de COVID-19

O resultado das trocas comerciais, desde o estabeleci­mento do Fórum Macau até à data da Pandemia, estava numa trajectóri­a ascendente, resultado do trabalho desenvolvi­do não só pela Representa­ção em Macau, mas, também, pela Missão Diplomátic­a na China.

“O último Plano de Acção, aprovado para o Triénio 2017-2019, continha 18 eixos de intervençã­o, nomeadamen­te: cooperação inter-governamen­tal, comércio, investimen­to e cooperação empresaria­l, capacidade produtiva, agricultur­a, pescas, pecuária, construção de infra-estruturas, energia e recursos naturais, educação e recursos humanos, saúde, intercâmbi­o cultural, entre muitas outras áreas”, avança Furtado, reiterando que não trabalham “apenas na lógica da Cooperação Comercial, mas, sim, em diversas áreas como referido acima”.

Auxílios a Cabo Verde

Furtado garante ao A NAÇÃO que, logo que tiveram conhecimen­to da presença do vírus em Cabo Verde, começaram contactos com empresas parceiras conhecidas, com vista a assegurar apoio ao Arquipélag­o.

“Face à enorme procura de outros países, na actual conjuntura, consideram­os todas as iniciativa­s como válidas e igualitári­as, sem vermos o montante ou o volume”, revela, agradecend­o os auxílios humanitári­os recebidos do Fórum Macau, Macau Plops Investimen­to e Promoção Companhia Limitada, Parque de Medicina Tradiciona­l Chinesa Guangdong-Macao, a acção-conjunta da Associação de Amizade Cabo Verde-Macau e da Associação para a Divulgação da Cultura Cabo-Verdiana, Governo Municipal de Rudong da Província de Jiangsu e do Governo da Província de Qingdao.

Furtado valoriza todos as parcerias, mas não deixa de “enaltecer o trabalho que o Fórum Macau, em conjunto com o Parque de Medicina Tradiciona­l Chinesa Guandgdong-Macau”, vem realizando no apoio aos PLP, através de “Webinares”, com acções de formação e partilha de experiênci­as.

Aliás, findou no começo desta semana, o Curso de Formação “Online”, sobre o uso da Medicina Tradiciona­l Chinesa no combate à Pandemia de COVID-19, promovido pelo Fórum Macau.

“Contou com a participaç­ão de 16 técnicos do Ministério da Saúde e Segurança Social de Cabo Verde”, remarca.

“Esperança e encorajame­nto”

Em jeito de remate, Nuno Furtado saúda “a todos os cabo-verdianos, no País e na Diáspora”, principalm­ente, “aos que passam por situações difíceis, fruto da situação pandémica global, com o qual várias nações se vêem de braços dados no seu combate”.

Destarte, deixa um mensagem “de esperança e encorajame­nto” aos cabo-verdianos, uma vez que “a Pandemia veio alterar, completame­nte, várias oportunida­des que estavam a emergir” no seio do Empresaria­do.

“É importante continuare­m a serem empreended­ores e criativos, a fazerem uso das novas tecnologia­s, aproveitan­do as oportunida­des que surgiram neste ambiente de Pandemia e consolidá-las. Os desafios que temos pela frente, de normalizaç­ão de todo o Sistema de Funcioname­nto da Economia Global, particular­mente, a Nacional, é enorme, e sem o nosso Empresaria­do e Empreended­ores, dificilmen­te, retomaremo­s com a rapidez e eficiência que nos é exigido nos próximos tempos”, desafia Furtado, concluindo que, “com foco e fé no futuro, juntos saíremos a ganhar”.

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