Candidaturas defendem projectos políticos ancorados na realidade e anseios da população
Auscultar diferentes actores da sociedade civil constitui o modo principal para a elaboração dos projectos políticos em Cabo Verde. Nalguns casos, diagnósticos de anos anteriores são repescados. Poucos recorrem a estudos credíveis para perceber a realidade e os anseios da população.
Nenhuma candidatura consegue por si só ganhar uma eleição. Por trás das intensas acções antes, durante e após as eleições, há todo um trabalho de casa de planeamento de acções para construir o projecto político.
Nas últimas eleições autárquicas, Paulino Dias, que concorreu à Câmara Municipal da Ribeira Grande, liderando a candidatura independente ‘Mudar – Alternativa Ribeira Grande’, adoptou uma filosofia participativa ao longo de todas as fases do processo para as eleições.
“Auscultámos a população, ouvimos a diáspora e analisámos toda a dinâmica do Município da Ribeira Grande desde 1991. Convidámos um grupo de personalidades de Ribeira Grande, personalidades bem reconhecidas em termos de idoneidade, objectividade e independência. Criámos uma comissão que se encarregou de todo o processo da constituição das listas do grupo independente”, diz Paulino Dias, em declarações ao A NAÇÃO.
Uma outra estratégia assumida por certas candidaturas tem a ver com a elaboração de sondagens. No caso de Paulino Dias, não chegou a encomendar qualquer estudo de opinião junto da população, tendo em conta que os custos eram incomportáveis para uma candidatura de cariz independente.
Identificar as fragilidades
Auscultando a sociedade civil, as candidaturas conseguem inteirar-se sobre as fragilidades e prioridades do seu município. Na ilha do Fogo, Fábio Vieira liderou a candidatura do PAICV à Câmara Municipal dos Mosteiros, tendo conseguido eleger-se.
O ponto de partida para esta candidatura foi precisamente o diagnóstico do estado do município para que fossem identificadas as grandes fragilidades e os problemas que assolavam a população local.
“Com base nesse diagnóstico, elaboramos a nossa plataforma eleitoral no sentido de prevermos um conjunto de políticas públicas que visam sobretudo resolver estes problemas com a ambição de colocar Mosteiros entre os municípios mais desenvolvidos de Cabo Verde nos próximos quatro anos”, revela Fábio Vieira.
Segundo o autarca eleito nos Mosteiros, o seu projecto político extravasou os limites partidários, contando com o apoio de personalidades e pessoas de diferentes sensibilidades políticas e também segmentos sociais.
“Contámos com a colaboração de todos para as vias de desenvolvimento de Mosteiros. Tivemos a oportunidade de discutir com todos de forma pormenorizada os anseios e as aspirações. Tivemos um programa eleitoral para um município, mas tivemos a preocupação de estabelecer uma agenda específica para cada uma das localidades”, acrescenta.
Diagnósticos anteriores
Nalguns casos estudos e diagnósticos feitos em anos anteriores são reciclados. A par da auscultação de diferentes actores sociais, a candidatura da UCID, em São Vicente e a candidatura do MpD na ilha Brava aproveitaram de algumas ideias que tinham sido apresentados por essas candidaturas em anos anteriores.
“O nosso projecto político partiu de algumas constatações que temos feito em relação ao funcionamento da Câmara Municipal de São Vicente.
Teve como base uma sondagem que encomendamos e algumas opiniões de pessoas da sociedade civil, da nossa base de militantes e dirigentes. Baseámo-nos também em estudos que foram feitos em anos anteriores.
Como tínhamos partes de projectos aconselhados em anos anteriores, vimos que continuavam sendo válidos e poderiam ser implementados ainda”, diz Nilton Rocha, director de campanha da UCID, em São Vicente, nas últimas eleições.
Foi mais ou menos essa a estratégia de Francisco Tavares, candidato do MpD e eleito presidente da Câmara Municipal da Brava. A sua candidatura auscultou a população e recorreu a um fórum de 2013, realizado naquele município.
“Seguimos com aquilo que saiu como conclusão de um fórum de desenvolvimento da Brava, realizado em 2013. A conclusão apontou como via para o desenvolvimento da Brava o turismo de natureza.
Daí que após 2016, com o reforço da complementaridade do governo central, conseguimos concretizar muitos mais projectos nessa preparação da ilha para vir a ser o destino turístico que desejamos.
Ao longo do mandato fizemos reuniões nas localidades, com as populações para saber exatamente o que esperam do poder local e depois nós passamos aquilo que é a nossa visão enquanto conclusão daquele fórum”, explica.
Entretanto, há quem defenda que muitos projectos políticos morrem na praia porque mostram-se desfasados da realidade e dos anseios da população, em geral. Sustentam-se em relatório e narrativas de pessoas que se colocam como formadores ou mediadores de opinião, quando muitos deles interagem pouco com a maioria que vota.
Sendo assim, boa parte deixa-se levar pelo “achismo” ou por projectos mirabolantes cujo impacto social fica por provar. Estudos credíveis para perceber o que a população deseja deixam falta, muitas vezes.