Criadores do gado reclamam do açambarcamento e especulação de milho e sêmea
Os criadores de gado da Boa Vista dizem que estão a enfrentar imensas dificuldades para conseguir milho e sêmea de trigo para alimentar os seus animais. Isso porque, um grupo de comerciantes chineses anda a comprar todo o stock de milho e sêmea nos fornecedores na ilha para revender a um preço muito mais elevado.
Em conversa com o A NAÇÃO, os criadores dizem que esta prática de “açambarcamento” e “especulação” acontece já há algum tempo, acrescentado que isso já é de conhecimento das autoridades na ilha, nomeadamente da Câmara Municipal e da Delegação do Ministério da Agricultura e Ambiente, mas que mesmo assim nada de concreto é feito par pôr cobro à situação.
Segundo João Pereira Silva, que há dias denunciou o facto na sua página do Facebook, a situação mais gritante verificou-se nas últimas semanas devido a agitação marítima que impossibilitou a atracagem das embarcações.
“O barco que trouxe milho não conseguiu descarregar as mercadorias e por isso teve que regressar, e quando voltou um grupo de cerca de dez comerciantes, sabendo que haveria muita procura, aproveitaram e compraram todo o stock de milho e sêmea junto dos fornecedores na ilha para revenderem a um preço mais elevado. Normalmente um saco de milho custa entre 1700 e 1800, mas agora estão a revender por 2150, ou seja, 350 escudos mais caro”, explica.
Pereira Silva, que já foi ministro da economia e do desenvolvimento rural, avança ainda que alguns dos pequenos padeiros e empreendedores que fazem doces e salgados já deixaram de produzir, dado que estão com dificuldades em encontrar a farinha de trigo a um preço acessível no mercado. Uma vez mais, porque o mesmo grupo de comerciantes também comprou tudo que havia para revender mais caro.
Conforme aquele cidadão, residente na Boa Vista, para contornar a situação os fornecedores devem colocar o produto na ilha em abundância para evitar o esgotamento do stock. Ou então os pecuaristas devem agrupar-se e encomendar uma certa quantia de milho directamente na Moave, em São Vicente.
“O produto será enviado para o representante na ilha da Boa Vista, onde os criadores pedem a mercadoria pagando um preço mais baixo. Assim já não ficam sujeitos à exploração por parte dos comerciantes”, aconselha.
Por seu turno, Carlos Morais afirma também que os criadores do gado, na Boa Vista, estão a enfrentar uma situação complicada por causa do preço do milho e ração, agravada por quatro anos de seca.
“Há duas semanas registamos uma rotura de stock. Isso porque um grupo de comerciantes chineses andam a comprar todo o milho e guardam e quando já não há milho disponível nos fornecedores locais, aproveitam para subir o preço e vender. E isso tem sido uma prática recorrente”.
Morais pede a intervenção das autoridades para porem cobro a essa situação. Os criadores pedem ainda um aumento da quantidade de rações vendidas com a comparticipação do governo e um melhor critério na venda, no sentido de beneficiar o maior número de criadores.
Por sua vez, o criador e presidente de Agrupamento Competitivo do Queijo de Cabra da Boa Vista, Eliseu Almeida, diz também que ele e os seus pares estão a ter alguma dificuldade para alimentar os seus animais devido há algumas práticas pouco abonatórias.
“Nas últimas semanas registamos um aumento exponencial de milho aqui na ilha da Boa Vista, mesmo junto dos estabelecimentos que vendem a grosso. Antes comprávamos um saco de milho por cerca de 1700 escudos mais agora está a custar cerca de dois mil escudos. E para além disso estamos a ter uma outra agravante que tem a ver com os comerciantes chineses que estão a sacar todo o stock para revender num preço mais elevado, o que dificulta a aquisição do milho por parte dos criadores, que há cerca de quatro anos não tem tido rendimento, devido a seca e agora agravado pela pandemia”.
Eliseu Almeida assevera que tanto os responsáveis da Câmara Municipal como da delegação do Ministério da Agricultura e Ambiente (MAA) na ilha estão ao corrente das dificuldades que os criadores enfrentam.
“Na passada sexta-feira reunimos com a Câmara Municipal para discutir o problema e encontrar a melhor solução para este problema que já arrasta há algum tempo”, disse.
Os criadores pedem ainda as autoridades para fiscalizar e conferir a pesagem dos sacos de milhos e rações porque há casos que os sacos estão a ser comercializados com peso a menos.
Contactado pelo A NAÇÃO, o vereador pela área da Agricultura, Pecuária e Pesca, João Mendes, diz não ter conhecimento de situações de açambarcamento dos produtos na ilha. “Tenho informação que esse grupo de comerciantes compra os produtos diretamente na Moave em São Vicente e a mercadoria é enviada através de um distribuidor na ilha e quando o produto chega os comerciantes vão fazer o levantamento das suas mercadorias para revender”, explica.