Nem pensar em crescimento exponencial
Em entrevista ao A NAÇÃO, o secretário geral da Câmara de Turismo, Humberto Lélis, demonstra um misto de preocupação e de optimismo moderado.
“Almejando que a vacinação iniciada em Europa se processe rapidamente e que, também, localmente, em Cabo Verde, venhamos a progredir neste domínio, temos razões para encarar o ano de 2021 com boas expetativas no que diz respeito ao relançamento do turismo, sabendo constituir este o propulsor cimeiro da nossa economia”, começa por expor.
“Não será um crescimento exponencial, mas certamente que 2021 marcará a retoma, ainda que de forma gradual. O importante é começar e, para além das operações iniciadas recentemente, como são os exemplos da República Checa e Polónia, temos outras que iniciarão proximamente, mas que, por agora, preferimos não detalhar por razões que certamente compreenderá”.
Turismo seguro
Lélis entende que o “país avançou bastante” no que concerne ao programa turismo seguro, que foi desenvolvido pelo Ministério do Turismo com cooperação do sector privado e associado à Camara de Turismo.
“Há a assinalar avanços importantes no domínio dos cuidados de saúde em todo o país, sobretudo nas ilhas mais turísticas que são Sal e Boa Vista. Temos um país que vem se demostrando resiliente e há que referir as medidas objeto de entendimento em sede da concertação social e adoptadas pelo governo e que tem surtido efeito no tecido económico e social e isto é de extrema importância porquanto a nossa estabilidade e coesão social são ativos de grandeza maior”.
O secretário geral da CT lembra que Cabo Verde foi considerado um dos destinos mais seguros para 2021 e isto “é algo importante”.
“A nação toda tem a celebrar, entendendo tratar-se de uma matéria, por natureza, transcendente a meras conjunturas, portanto algo para a qual a sociedade civil, toda ela incluída, bem assim os sucessivos governos, terão ativamente contribuído e, portanto, todos depositários dos resultados alcançados”.
Prevendo uma retomada gradual e só lá para o quarto trimestre de 2021, o secretário entende que a dinâmica da procura depende de factores externos e internos.
Depende, em grande medida, da evolução da covid na Europa, dos níveis de vacinação tanto lá como cá e do impacto nas classes de rendimento médio baixo no velho continente.
“O nosso país tem-se perfilado, ao longo dos tempos, como um destino turístico apetecível, essencialmente, ao segmento de rendimento médio baixo europeu, franja da população que deverá conhecer maiores dificuldades com a crise da pandemia da Covid, portanto com reduzida propensão ao consumo, incluindo viagens”, observa Lélis.
Perigo: competividade só com base no preço
O maior perigo, no entender de Lélis, advém do facto de o país manter a sua competividade só com base no baixo preço. “O novo ciclo de crescimento do turismo, na fase pós covid-19, deverá operar-se pelos veículos da qualificação e diversificação da oferta, pois, nas condições de Cabo Verde, é, de todo, indesejável e extremamente pernicioso manter o foco na competitividade pelo mecanismo do preço, pelo perigo de fraturas sistémicas e pela gangrena no sector empresarial privado, com consequentes metástases no tecido social”, reflecte.
Qualificar oferta turística
O país precisa assim qualificar a oferta para atrair outro perfil de turista e evitar que haja o assédio a que os estrangeiros são submetidos quando fazem o passeio pelas ruas de Santa Maria. O assédio é de tal ordem que muitos voltam ao hotel e tende a manter-se por lá até regressarem aos respectivos países.
“A qualidade, nesta perspetiva, deverá ser entendida como pressuposto indissociável da remuneração dos capitais, do capital tangível e financeiro, do capital humano, do capital que representa o país todo, incisivamente pelo mecanismo das contribuições fiscais e parafiscais. Diversificação, entendendo que o país, todas as ilhas, tem muito mais para oferecer, não somente as praias, mas também os atrativos ligados à natureza, à montanha, à história e cultura. Em resumo, a retoma do turismo terá, necessaria e intransigentemente, de se processar pela via da reposição dos equilíbrios sistémicos, tendo em consideração a justa remuneração dos capitais privados, a justa remuneração dos trabalhadores e equidade quanto aos recursos drenados pelo erário público”, opina Lélis.