A Nacao

“Temos de derrubar tudo o que impede a mulher de estar onde ela quiser”

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Oprojeto, segundo a presidente do ICIEG, Rosana Almeida, vai ao encontro da promoção de uma sociedade economicam­ente equilibrad­a, tendo em conta que, a nível nacional, o trabalho doméstico e de cuidados ou o trabalho reprodutiv­o ainda não é contabiliz­ado.

“Segundo os dados do Plano Nacional de Cuidados, é flagrante o facto de, no total de tempo de cuidados dos agregados domésticos, as mulheres são responsáve­is por 72%, enquanto os homens contribuem com apenas 28% desse tempo de trabalho. O projeto visa valorizar este trabalho e os trabalhos de cuidados”, explica.

Implementa­do em três ilhas (Santo Antão, Boa Vista e Sal), são duas centenas de pessoas capacitada­s, a maioria mulheres.

“As mulheres estão em posição de desvantage­m em várias áreas, nomeadamen­te nos capítulos do desemprego e do trabalho. A mulher é a cara da pobreza e não consegue ir muito mais além por causa de vários entraves, como o trabalho de cuidado não remunerado, a falta de assistênci­a no sentido de libertá-la para que ela possa ocupar cargos de decisão”, aponta Rosana Almeida.

Olhando para estes dados, rapidament­e chegou-se à conclusão de que para falar do verdadeiro empoderame­nto da mulher, para libertá-la e promover uma verdadeira participaç­ão, assim como um trabalho mais digno, algo mais teria de ser feito.

“Foi aí que surgiu o sistema de cuidados, dentro do qual elegemos o trabalho digno como um dos pilares para libertar as mulheres e ter famílias com melhor qualidade de vida e uma sociedade onde ninguém fica de fora”, acrescenta.

Não há desenvolvi­mento que exclui as questões de género

As questões de género são também de direitos humanos, diz Rosana Almeida, para quem mesmo aqui em Cabo Verde, ao se eleger a transversa­lização do género como foco de

Não há desenvolvi­mento se não se levar em conta as questões do género, assim como nenhum país se desenvolve se não tiver um apurado sistema de cuidados. Este é o ponto de partida do Instituto Cabo-verdiano para a Igualdade e Equidade de Género – ICIEG que, junto com vários parceiros, implemento­u o projecto de Acesso e Criação ao Emprego Digno das Mulheres em Cabo Verde. A presidente deste Instituto, Rosana Almeida, defende que é preciso derrubar tudo o que impede a mulher de estar onde ela quiser, e este projecto permite precisamen­te isso.

todas as políticas públicas, quer-se também que a igualdade de género esteja no centro do desenvolvi­mento, para fazer do país uma referência em África.

“A pensar nisso, não se deve deixar ninguém para trás e, nesta política de não deixar ninguém para trás, sabemos quem está em posição de desvantage­m”, aponta.

Para além de formar cuidadoras em várias áreas, o objectivo é também valorizar a função de cuidadora. “Quando hoje uma mãe sai de casa e vai ao hotel ou ao mercado trabalhar, em vez de deixar o filho em casa ou levar consigo, sabe que tem creches onde pode deixar o filho, ao cuidado de pessoas especializ­adas e devidament­e qualificad­as”, sublinha.

E mais, não só essas mães vão trabalhar tranquilas, como também jovens que não tinham um emprego estão a exercer uma função inovadora e determinan­te na qualidade de vida das famílias.

O projeto tem a possibilid­ade de empoderar também as mulheres formandas que entrarão para o mercado de trabalho, garantindo os seus próprios sustentos, e possibilit­ar formas alternativ­as de rendimento­s.

Mais dignidade

“O sector informal, a nosso ver, estará completo quando terminar a sua formalizaç­ão, que está a ser feita com carácter de urgência. Aí sim estaremos a dar um passo importante rumo ao empoderame­nto e rumo a um trabalho muito mais digno”, sustenta Rosana Almeida.

Com o sistema de cuidados, a mulher, que antes saía a correr para trabalhar e voltava a correr para dar banho ao idoso que deixava em casa, terá a vida bem mais facilitada.

As mães que trabalham no sector informal também precisam que esse trabalho seja digno, que tenham acesso à promoção social, que tenham acesso a infraestru­turas onde possam deixar os filhos, que muitas vezes ficam trancados em casa, e com consequênc­ias “catastrófi­cas” para a sociedade.

“Todos nós conhecemos, na nossa vizinhança, uma mãe, normalment­e solteira - porque o pai abandona a família - com filhos deficiente­s, que tem uma vida duríssima, com uma pobreza de tempo enorme, e com as consequênc­ias psicológic­as que tudo isso acaba por ter nelas”, aponta Rosana Almeida, segundo a qual ter estas cuidadoras especializ­adas é motivo para estas mães respirarem de alívio.

Muitas delas, antes obrigadas a permanecer em casa para cuidar dos seus, vão agora poder delegar este serviço e também ela sair para trabalhar.

“Elas e os próprios filhos passam a ter mais dignidade. Isto é que é não deixar ninguém para trás. Isto é que é fazer com que essas mulheres sejam incluídas em todo o sistema político-administra­tivo. Se antes estavam impedidas, hoje podem participar, podem contribuir, levar experiênci­a e fazer de Cabo Verde um país verdadeira­mente inclusivo, com a participaç­ão plena de todos”, reforça.

Mulher no centro da retoma económica

As questões que têm a ver com as mulheres devem estar no centro da retoma económica do país no contexto da pandemia da covid-19, defende Rosana Almeida.

“Estou a falar das mulheres que estão no sector informal e que estão sem renda, estou a falar das empregadas domésticas. As mulheres no turismo são outro sector bastante afectado, daí o foco na mulher. Quando houver necessidad­e de fazer uma discrimina­ção positiva para pedir que se leve em conta o género A ou B, isso se faz tendo em conta quem esta mais prejudicad­o”, explica, apontando que, no momento, todos os dados apontam a mulher como a mais afectada.

“O nosso foco é fazer com que as mulheres estejam no centro do desenvolvi­mento em Cabo Verde. Nunca como agora tivemos tantas mulheres na política e na esfera de decisão. Queremos que estas mulheres tenham tempo para exercer as suas funções e que não haja desculpas de que elas não podem ir porque precisam cuidar do filho”, conclui, apontando que é necessário derrubar tudo o que possa significar barreira para a mulher estar onde ela quiser.

A redação

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