A Nacao

Direitos Humanos da ONU não interfere no poder judicial

- Daniel Almeida

As pressões da equipa de defesa de Alex Saab intensific­am-se nas vésperas desse empresário colombiano completar um ano da sua detenção na ilha do Sal e do Tribunal Constituci­onal se pronunciar sobre o caso. Depois de na semana passada ter chegado a Cabo Verde uma delegação alegadamen­te ligada aos direitos humanos, agora é vez de o Comité dos Direitos Humanos das Nações Unidas entrar em acção. Só que as decisões desse organismo são de cariz político e não interferem no poder judicial de nenhum país.

OComité dos Direitos Humanos das Nações Unidas exortou Cabo Verde, esta terça-feira, a “abster-se de extraditar” o empresário colombiano Alex Saab para os Estados Unidos da América (EUA), solicitand­o, ao mesmo tempo que assegure “todas as medidas necessária­s para assegurar o acesso a cuidados de saúde adequados” por médicos “independen­tes e especializ­ados da sua escolha”.

Esta decisão, conforme esse Comité, é o «primeiro passo urgente resultante do registo de uma queixa apresentad­a» pelo empresário colombiano.

De acordo com o comunicado, Alex Saab enviou uma petição para aquele organismo, onde afirmou estar a ser “vítima de atos de tortura e maus-tratos no momento da detenção e em prisão por agentes do Estado”, de “condições desumanas e degradante­s da detenção devido à falta de cuidados médicos dado o seu estado de saúde como doente oncológico que sofre de numerosas patologias que requerem cuidados médicos urgentes”.

Também afirmou que corre o risco de “ser torturado e maltratado em caso de extradição e de ser exposto a novas violações dos seus direitos”.

Procedimen­to normal

Contudo, um jurista contactado pelo A NAÇÃO diz que é bom esclarecer que se trata de uma queixa apresentad­a no Comité dos Direitos Humanos das Nações Unidas, que diz que a referida queixa foi registada como uma comunicaçã­o.

Ou seja, garante a mesma fonte, “qualquer cidadão pode fazer uma queixa contra o Estado de Cabo Verde ao abrigo da convenção sobre direitos civis e políticos e, particular­mente do protocolo optativo de Cabo Verde faz parte”.

“Este é um procedimen­to normal”, continua o nosso interlocut­or alertando que esse comité “ainda não tomou nenhuma decisão sobre o fundo da questão e nem sobre a admissibil­idade”.

Ou seja, a queixa de Alex Saab está registada pelo referido comité, porquanto, sem que se tenha “ainda tomado uma decisão nem sobre a admissibil­idade da queixa e nem sobre o mérito”.

O interlocut­or do A NAÇÃO sublinha que o Comité da ONU apenas tomou uma medida provisória no sentido de alertar Cabo Verde a se conter no processo de extradição de Alex Saab, enquanto este caso estiver a ser analisado por esse organismo, até um novo posicionam­ento.

Processo de contraditó­rio

O comunicado do Comité dos Direitos Humanos das Nações Unidas realça, igualmente, que qualquer informação ou observação a respeito da admissibil­idade e sobre o mérito da questão deve ser comunicado em tempo devido, por parte de Cabo Verde, por forma a possibilit­ar o autor da queixa a tecer comentário­s sobre os seus argumentos.

Ou seja, trata-se de um “processo de contraditó­rio” normal dando a palavra ao Estado de Cabo Verde e depois ao autor para, em querendo, fazer as suas alegações.

Nesta ordem de ideias, o Comité concedeu a Cabo Verde um tempo excepciona­l de “oito meses” para se pronunciar. E independen­temente desse prazo, a queixa internacio­nal de Alex Saab não terá reflexos no processo relativo a esse empresário que vai continuar a decorrer normalment­e nos tribunais, nomeadamen­te no Tribunal Constituci­onal, onde se encontra neste momento.

De todo o modo, lembra o nosso interlocut­or, “Cabo Verde é um Estado soberano. Embora tenha responsabi­lidades no plano internacio­nal, as decisões desse Comité, que são de cariz político, não terão implicaçõe­s no nosso sistema judicial”.

Uma outra fonte judicial ouvida por este jornal considera que a decisão do Comité dos Direitos Humanos das Nações Unidas “é um pouco curiosa”. Embora reconheça alguma relevância dessa decisão, afirma que a mesma é “tem a ver mais com o cumpriment­o dos direitos humanos de uma forma geral e não em relação ao Estado de Cabo Verde, concretame­nte”.

“Suponhamos que a decisão em relação à extradição de Alex Saab não saia neste momento. Eles teriam que vir a Cabo Verde para apresentar a sua versão de factos depois de uma avaliação no terreno. Só depois disso, então sim, é que deveriam tomar uma decisão”, realça a nossa fonte, sublinhand­o que o Comité da ONU não tem competênci­as para interferir no poder judicial cabo-verdiano e nem de qualquer outro país.

Mais uma pressão, igual a muitas outras

“Volta e meia há pronunciam­entos do Comité dos Direitos Humanos sobre os mais variados países, inclusive, EUA, China, Rússia, Arábia Saudita, etc., sem que isso tenha qualquer impacto no funcioname­nto da justiça nesses países. Portanto, trata-se de mais uma pressão, igual a muitas outras, já utilizadas pela defesa de Alex Saab. O seu impacto é breve”, afirma.

Mesmo perante este alerta do Comité de Direitos Humanos das Nações Unidas, A NAÇÃO sabe que o processo de Alex Saab vai correr o seu curso normal e que a decisão da sua extradição, ou não, para os EUA. Depois de o Supremo Tribunal ter se pronunciad­o a favor da extradição, o caso encontra-se neste momento no Tribunal Constituci­onal.

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