Direitos Humanos da ONU não interfere no poder judicial
As pressões da equipa de defesa de Alex Saab intensificam-se nas vésperas desse empresário colombiano completar um ano da sua detenção na ilha do Sal e do Tribunal Constitucional se pronunciar sobre o caso. Depois de na semana passada ter chegado a Cabo Verde uma delegação alegadamente ligada aos direitos humanos, agora é vez de o Comité dos Direitos Humanos das Nações Unidas entrar em acção. Só que as decisões desse organismo são de cariz político e não interferem no poder judicial de nenhum país.
OComité dos Direitos Humanos das Nações Unidas exortou Cabo Verde, esta terça-feira, a “abster-se de extraditar” o empresário colombiano Alex Saab para os Estados Unidos da América (EUA), solicitando, ao mesmo tempo que assegure “todas as medidas necessárias para assegurar o acesso a cuidados de saúde adequados” por médicos “independentes e especializados da sua escolha”.
Esta decisão, conforme esse Comité, é o «primeiro passo urgente resultante do registo de uma queixa apresentada» pelo empresário colombiano.
De acordo com o comunicado, Alex Saab enviou uma petição para aquele organismo, onde afirmou estar a ser “vítima de atos de tortura e maus-tratos no momento da detenção e em prisão por agentes do Estado”, de “condições desumanas e degradantes da detenção devido à falta de cuidados médicos dado o seu estado de saúde como doente oncológico que sofre de numerosas patologias que requerem cuidados médicos urgentes”.
Também afirmou que corre o risco de “ser torturado e maltratado em caso de extradição e de ser exposto a novas violações dos seus direitos”.
Procedimento normal
Contudo, um jurista contactado pelo A NAÇÃO diz que é bom esclarecer que se trata de uma queixa apresentada no Comité dos Direitos Humanos das Nações Unidas, que diz que a referida queixa foi registada como uma comunicação.
Ou seja, garante a mesma fonte, “qualquer cidadão pode fazer uma queixa contra o Estado de Cabo Verde ao abrigo da convenção sobre direitos civis e políticos e, particularmente do protocolo optativo de Cabo Verde faz parte”.
“Este é um procedimento normal”, continua o nosso interlocutor alertando que esse comité “ainda não tomou nenhuma decisão sobre o fundo da questão e nem sobre a admissibilidade”.
Ou seja, a queixa de Alex Saab está registada pelo referido comité, porquanto, sem que se tenha “ainda tomado uma decisão nem sobre a admissibilidade da queixa e nem sobre o mérito”.
O interlocutor do A NAÇÃO sublinha que o Comité da ONU apenas tomou uma medida provisória no sentido de alertar Cabo Verde a se conter no processo de extradição de Alex Saab, enquanto este caso estiver a ser analisado por esse organismo, até um novo posicionamento.
Processo de contraditório
O comunicado do Comité dos Direitos Humanos das Nações Unidas realça, igualmente, que qualquer informação ou observação a respeito da admissibilidade e sobre o mérito da questão deve ser comunicado em tempo devido, por parte de Cabo Verde, por forma a possibilitar o autor da queixa a tecer comentários sobre os seus argumentos.
Ou seja, trata-se de um “processo de contraditório” normal dando a palavra ao Estado de Cabo Verde e depois ao autor para, em querendo, fazer as suas alegações.
Nesta ordem de ideias, o Comité concedeu a Cabo Verde um tempo excepcional de “oito meses” para se pronunciar. E independentemente desse prazo, a queixa internacional de Alex Saab não terá reflexos no processo relativo a esse empresário que vai continuar a decorrer normalmente nos tribunais, nomeadamente no Tribunal Constitucional, onde se encontra neste momento.
De todo o modo, lembra o nosso interlocutor, “Cabo Verde é um Estado soberano. Embora tenha responsabilidades no plano internacional, as decisões desse Comité, que são de cariz político, não terão implicações no nosso sistema judicial”.
Uma outra fonte judicial ouvida por este jornal considera que a decisão do Comité dos Direitos Humanos das Nações Unidas “é um pouco curiosa”. Embora reconheça alguma relevância dessa decisão, afirma que a mesma é “tem a ver mais com o cumprimento dos direitos humanos de uma forma geral e não em relação ao Estado de Cabo Verde, concretamente”.
“Suponhamos que a decisão em relação à extradição de Alex Saab não saia neste momento. Eles teriam que vir a Cabo Verde para apresentar a sua versão de factos depois de uma avaliação no terreno. Só depois disso, então sim, é que deveriam tomar uma decisão”, realça a nossa fonte, sublinhando que o Comité da ONU não tem competências para interferir no poder judicial cabo-verdiano e nem de qualquer outro país.
Mais uma pressão, igual a muitas outras
“Volta e meia há pronunciamentos do Comité dos Direitos Humanos sobre os mais variados países, inclusive, EUA, China, Rússia, Arábia Saudita, etc., sem que isso tenha qualquer impacto no funcionamento da justiça nesses países. Portanto, trata-se de mais uma pressão, igual a muitas outras, já utilizadas pela defesa de Alex Saab. O seu impacto é breve”, afirma.
Mesmo perante este alerta do Comité de Direitos Humanos das Nações Unidas, A NAÇÃO sabe que o processo de Alex Saab vai correr o seu curso normal e que a decisão da sua extradição, ou não, para os EUA. Depois de o Supremo Tribunal ter se pronunciado a favor da extradição, o caso encontra-se neste momento no Tribunal Constitucional.