O desnorte da dívida pública
A poucos dias de o Parlamento apreciar o Programa do Governo, pelos sinais, a questão da dívida pública (DP) deve voltar a dominar esta legislatura. Isto porque, como é do domínio público, as margens de endividamento do Estado estão praticamente reduzidas a zero.
Aliás, essa questão foi abordada pelo A NAÇÃO semanas antes das últimas eleições legislativas, alertando o país para o problema do elevado risco de sobre-endividamento e das suas consequências, nomeadamente, para o Executivo que sairia as eleições de Abril. O referido artigo deu lugar a várias “notas de esclarecimento” (NE) por parte do Ministério das Finanças.
A 24 de Março, na sua primeira NE, o Governo começou por dizer que o rácio DP/PIB era de 151% em 2020 e 150,3% em 2021, para dois dias depois, a 26 de Março, surgir um comunicado do FMI com números totalmente diferentes, 140,9% em 2020 e 138,7% em 2021, ou seja, uma diferença abismal relativamente aos dados que constam da referida NE do Governo.
Como se isso não bastasse, e diante da nossa insistência, também em NE de 09 de Abril, veio o Governo corrigir o rácio DP/PIB de 2020 para 154,9%. Mais recentemente, no mês de Maio, o rácio DP/PIB passou para 146,4% do PIB projectado para 2021.
Considerando, para qualquer um desses cenários, a insustentabilidade da DP, nos últimos dias Olavo Correia andou a desdobrar-se em declarações, defendendo que a dívida pública seja transformada em “investimentos naturais”, tal e qual o sugerido por algumas ONG’ s internacionais, o que para muitos não passa de mais uma fantasia.
Fantasia ou não, qualquer ministro das Finanças sabe que não basta querer ver a dívida perdoada, para que isso seja realidade. Pois, para que isso aconteça, o governo a que pertence terá antes de mais que demonstrar o bom uso que fez dos recursos financeiros ao seu dispor, particularmente em períodos de campanha eleitoral, como os que Cabo Verde viveu em Abril passado. Uma vez mais, entre as promessas e a realidade, a diferença é grande.