SINAPOL e as escalas de morte em horas dramáticas
Bem-haja a união da classe Polícia Nacional para o sucesso da Segurança Pública do país. O “pacote” PN, independentemente das reviravoltas, prevê ainda muitas novidades, e destas, a (in) decisão judicial sobre o processo litigioso do Sinapol que corre seus trâmites legais nos tribunais pode, entretanto, marcar alguma diferença.
O sindicalismo policial, a cargo do Sinapol, tem-se preocupado com fatos, problemas e soluções. Como é sabido, a polícia tem sido vista, quantas vezes, como uma família de homens sem alma, quase toda ela desgraçada em termos de horário de trabalho. Somos por uma ação político-sindical absolutamente legítima e forte, porém com resultados fiáveis.
Infelizmente, a arranjada Orgânica da Polícia Nacional, recentemente aprovada, deu mote a novos descaminhos e sinais nada agradáveis. O Ministério da Administração Interna inquinou artificiosamente o Serviço Social da PN e, uma vez mais, falou mais alto a força do poder, assumindo ele uma decisão estrategicamente de risco ao esquivar-se habilidosamente do acordado, adoçando com isso, amargamente, os apetites da casa, afrontando os interesses da classe. Fazer depender os Serviços
Sociais da PN, funcional e hierarquicamente, do Diretor Nacional da PN é, a todos os títulos, uma solução injusta, abusiva e de alto risco.
Enquanto sindicato, o Sinapol continua atento às desgraças laborais. Com legitimidade, mantém de pé o seu luto e a sua limitada paciência. Os pendentes não faltam, não calam e falam por si. Para nós, os acordos são para serem cumpridos, investidas nenhumas terão sucesso se forem ao arrepio dos entendimentos previamente obtidos, mormente quando estamos diante de aspetos de constitucionalidade duvidosa. É o caso da vinculação obrigatória versus desvinculação definitiva do membro do SES-PN, uma ameaça, no mínimo, terrível.
Nada, porém, travará os propósitos da classe. O caminho ainda é espinhoso e a reação da classe contra a arquitetura do SES-PN, cedo ou tarde, dependerá exclusivamente da paz construída. De igual modo, a Portaria que o vai organizar e fazer funcionar obrigará a um consenso transparente e necessariamente legítimo.
Questões, em suma, distintas, importantes e urgentes percorrem, assim, o ideário do Sinapol. Aliás, persistem, entre outros, o excesso da carga horária e, a par disto, o direito à reação da classe em exigir-se do Estado o dever de compensar devidamente as horas extras.
A PN viu melhorias, sim; mas viu-as numa moeda de angústias. Não é estranho dizer que as escalas de serviços normais e extras são terríveis, com turnos de horas dramáticas, na prática, uma espécie de jornadas de morte lenta. O sistema é uma loucura legalizada em que a maioria dos comandantes comanda loucamente os seus subalternos e quase ninguém se preocupa em assegurar a compatibilidade legal necessária. Neste quadro, a lei laboral passa quase que ao lado. Prover, pois, o serviço legal seria uma atitude que exigiria dos comandantes uma adequada alocação dos recursos humanos disponíveis. Logo, um horário de trabalho com início e termo do período normal de turno, bem como dos intervalos de descanso. Ou seja, um regime de trabalho com descanso mínimo por semana, afinal, uma duração mínima das horas de trabalho diárias, de igual modo, seria respeitar o repouso e alimentação do pessoal da PN.
A proposta do Sinapol, que visava respeito mútuo das partes sobre os consensos, continua sendo legítima, embora incómoda, reconhecemos, porquanto ela visa, hoje, problematizar não só a possibilidade das oito horas diárias e, no máximo, 44 horas semanais, mas também a criação das condições necessárias a um regulamento digno e uniforme do horário de trabalho, de modo a evitar horas dramáticas, consequentemente transtornáveis psicologicamente, quiçá, perdas de vida. Sabe-se que se desconhece, na íntegra, os dados das fichas de inspeção de saúde do pessoal policial. Algo ainda inexistente.
Convenhamos, a saúde dos operacionais é ouro e ela está nas mãos dos comandantes, mas a doença já é um castigo que antecede outros tantos.
Ora, o Sinapol, desconhecendo em absoluto algum sinal da IGT- Inspeção Geral de Trabalho - sobre o assunto, lamenta denunciar que, aos olhos desta, a PN parece, de fato, não ter trabalhadores, na medida em que nunca lhe coube a via da fiscalização das imponentes desgraças, infortúnios laborais. O incómodo, no entanto, persiste, pois, matam-se direitos na fúria do mando e o tempo vai-se esgotando.
Trata-se de uma situação deveras lamentável, com uma carga de hipocrisia, no mínimo, extraordinária; aliás, nesta matéria, a desregulamentação dos direitos tem sido um retrocesso horrível, na Polícia Nacional. Os direitos e interesses da classe têm sido sistematicamente sacrificados, enquanto esta maré de vagas incertas se vai algemando lixo, desordens e problemas.
Além de abusivo, é inadmissível a prestação de serviços gratuitos, facilitando, por outro, o enriquecimento ilícito de alguns. Cabe, por isso, à administração superar esta persistente e gritante ilegalidade, compensando tais serviços, remunerando-os de forma legal, como é de justiça, na linha de que todo o trabalho prestado deve ser devidamente remunerado.
De igual modo, urge mapear e detalhar as condições de saúde do pessoal policial quanto aos principais fatores de risco. Neste particular, como noutros, o Sinapol requer definitivamente horas legais de trabalho e nada mais do que isso.
* Presidente do Sinapol, Sindicato Nacional da Polícia Nacional