Gestão problemática provoca ruptura de stock e quebra nos resultados financeiros
João Spencer é o novo PCA da Emprofac. Ele e mais duas gestoras, Evelyze Semedo e Sara Pereira, foram chamados de urgência pelo Governo para substituírem a dupla Ana Ribeiro e Melina Veiga, que não se entendiam na gestão da empresa pública de medicamentos. Além de rupturas de stocks, os maus resultados financeiros falam por si: em 2020, as vendas aumentaram 25%, mas os lucros caíram 30%.
Para tentar resolver uma certa ineficiência instalada na Emprofac, provocada essencialmente pelo mau relacionamento entre Ana Ribeiro e Melina Veiga, que geriram a empresa desde a saída do PCA, Gil Évora, em Agosto do ano passado, o Governo decidiu nomear um novo Conselho de Administração.
A NAÇÃO sabe que, perante várias recusas, tendo em conta que o mandato da nova administração terá uma duração de apenas um ano, por causa da privatização da empresa, Olavo Correia foi buscar o que tinha mais à mão: João Spencer (PCA), Evelyze Semedo e Sara Pereira (administradoras).
Em 2020, com a pandemia, registou-se um crescimento de vendas na ordem das 25%, resultante basicamente da comercialização de álcool gel e máscaras, e a empresa atingiu perto de 2.539.000 contos (mais 53.4000 contos em relação a 2019), depois de, em 2019, ter ultrapassado pela primeira vez a barreira dos 2 milhões de contos em vendas.
Apesar dess e crescimento de vendas, estas não tiveram a sua repercussão no resultado líquido da Emprofac. Depois de três anos sucessivos com crescimentos do seu resultado líquido, tendo atingido um resultado de 204.000 contos em 2019, a empresa conheceu, pela primeira vez em vários anos, uma diminuição do seu resultado líquido, passando em 2020 para pouco mais de 130 miç contos, uma diminuição de mais de 70 mil contos, cerca de -30%.
Os Gastos Operacionais tiveram um crescimento exponencial superior a 500 mil contos quando comparado com o ano de 2019, passando de 1.787.700 contos para 2.334.400 contos em 2020.
O Relatório & Contas 2020 entregue à Unidade de Acompanhamento do Sector Empresarial do Estado para aprovação na Assembleia Geral, desta quarta-feira, 23, mostra ainda uma degradação de vários indicadores de natureza económico-financeira, com especial destaque para a inutilização de medicamentos que se cifrou em valores astronómicos superiores a 40 mil contos.
Contudo, para além do comprovado desentendimento entre as referidas “gestoras”, uma fonte do Ministério das Finanças confirmou ao A NAÇÃO que esse mau relacionamento se estendia também nesse mesmo Ministé
rio, uma vez que uma das administradoras, “com costas quentes”, desobedecia permanentemente às convocatórias quer do ex-secretário de Estado, Gilberto Barros, quer do actual secretário de Estado, Alcindo Nascimento, quer ainda do próprio vice-primeiro-ministro, Olavo Correia, “não se dignando comparecer às convocatórias dos governantes e nem em justificar as suas ausências”.
Conforme um veterano da Emprofac, a gestão “calamitosa” que se registou na empresa em 2020 e nos primeiros seis meses de 2021 é o reflexo da nomeação de administradores sem experiência de gestão. “Nos últimos temos a empresa vem sendo gerida por gente nomeada, não por competência, mas sim com base no amiguismo, partidarismo e nepotismo cruzado. Felizmente a Emprofac tem quadros competentes e com muita experiência que impedem que a empresa descambe para a falência, como acontece noutras empresas públicas”.
Ruptura de stock
De acordo com o Santiago Magazine, vários medicamentos, inclusive para doenças crónicas, não se encontram nas prateleiras das farmácias desde o início do ano. A situação tem levado muitos utentes a denunciar nas redes sociais essas rupturas no stock sem data para reposição. Também os hospitais estão a trabalhar sem muitos equipamentos e reagentes, como, de resto, foi notícia o caso do Hospital do Porto Novo.
Conforme a mesma fonte, pelo menos onze farmácias de diferentes ilhas recorreram à Entidade Reguladora Independente da Saúde (ERIS), que já iniciou uma inspecção na Emprofac para averiguar qual o motivo de ruptura em tantos medicamentos e apurar responsabilidades.
Essa ruptura de stock deve-se ao facto de a administração cessante da Emprofac não ter feito em tempo útil a adjudicação do plano de compras para 2021. Conforme A NAÇÃO pôde também apurar, esse plano de compras está pronto desde Fevereiro deste ano, mas até meados deste mês não tinha sido implementado.
Um alegado braço de ferro entre as duas administradoras, que se digladiavam o tempo todo para mostrar quem mandava na Emprofac, é que está na base dessa situação de ruptura de stock, derivada da não implementação do plano de compras para 2021.
É que, com a saída de Gil Évora, a Emprofac passou a ser gerida apenas pelas duas senhoras. Segundo uma fonte bem posicionada, com apenas duas administradoras, a Ana Ribeiro foi atribuída faculdade de voto de qualidade, “coisa que Melina Veiga nunca acatou”, por “ter costas quentes”.
Adjudicações em stand-bye
O facto de não ter adjudicado o plano de compras para 2021 acabou por criar problemas às farmácias que não têm tido como atender algumas receitas, nomeadamente para doentes crónicos.
Normalmente, essas adjudicações, por meio de concurso público internacional, são feitas em Outubro do ano anterior, mas devido a “divergências sérias” existentes entre Ana Ribeiro e Melina Veiga, não se lançou concurso nenhum para o fornecimento de medicamentos para este ano de 2021.
Uma fonte citada por Santiago Magazine diz que, por causa da pandemia, havia também a hipótese defendida ainda quando Gil Évora era o PCA, de se manter a adjudicação directa à empresa que fornecedora os produtos no ano anterior, em 2020, de modo a agilizar o processo.
Consta então que Ana Ribeiro teria decidido seguir esse caminho, encomendando os medicamentos, só que Melina Veiga teria desautorizado a colega, enviando um outro e-mail ao fornecedor a cancelar o pedido, “alegando que tem de ser ela, Veiga, a tratar desse assunto”. Um quadro que evidencia o “clima de cortar à faca” entre as duas gestoras da Emprofac, que vinha piorando a cada dia.