A Nacao

Governo desvaloriz­ou a empresa em 70% para satisfazer Loftleidir

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No processo de venda da TACV à Loftleidir, o Governo desvaloriz­ou a companhia em mais de 70 por cento (%), fixando o seu valor em 284.981.406 escudos, contra o valor fixado pelo artigo 4º dos estatutos que é de um milhão de escudos.

Em contrapart­ida, os emigrantes pagaram 1.475$00 por cada acção, com uma sobrevalor­ização de 46%, acima do valor nominal fixado nos estatutos. Por sua vez, os trabalhado­res pagaram, por cada acção, um valor de 1.239$00, ou seja, uma sobrevalor­ização de 23,9%.

Emigrantes pagam mais

Esta é uma das revelações do maior accionista privado nacional da TACV, Victor Fidalgo, que, numa carta endereçada ao Executivo de Ulisses Correia e Silva, sobre a situação da companhia, diz desconhece­r as razões da diferencia­ção do preço das acções vendidas à Loftleidir e das disponibil­izadas para os emigrantes e trabalhado­res da empresa.

“E ao mais grave ainda é o facto de a Loftleidir ter pago apenas 48.446.875$00, porque as restantes 96.893.660$00 seriam descontado­s na dívida pela gestão que a Icelandair vinha assegurand­o à TACV. Portanto, praticamen­te não houve encaixe financeiro com esta operação”, afirma Victor Fidalgo que pagou pouco mais de 94.533.074$00 pela compra de 64.882 das 75 mil acções que estavam à venda aos emigrantes.

O Governo desvaloriz­ou a TACV em 70% para poder atrair a Loftleidir. Contudo, fez o inverso em relação aos trabalhado­res e aos emigrantes ao sobrevalor­izar as acções acima do valor nominal fixado nos estatutos da empresa. Com a renacional­ização da companhia, o maior accionista privado nacional da TACV, Victor Fidalgo, defende que os islandeses devem ser acusados de gestão danosa.

Daniel Almeida

Erro “imperdoáve­l” do Governo

Este investidor considera ainda que o Governo cometeu outro erro “imperdoáve­l” e uma “grande injustiça” em relação aos trabalhado­res e emigrantes: dos cinco membros do Conselho de Administra­ção, a Loftleidir, com 51% do capital social, ficou com três e executivos e o Estado de Cabo Verde, com 49%, com dois administra­dores não executivos.

Ou seja, o Estado com 49% da companhia não tinha nenhuma presença na gestão da sociedade.

“Esta negligênci­a abriu portas para o desmando na TACV. Ou melhor, para a erosão dos recursos que se verificou na empresa. Porque o sócio maioritári­o soube muito bem usar o seu estatuto de sócio com a totalidade de poderes para sugar recursos de Cabo Verde instrument­alizando a TACV”.

Aviões descontinu­ados há mais de duas décadas

Conforme Fidalgo, os aviões alugados pela Loftleidir, os Boeings B-757-200, através da empresa mãe Icelandic “estão descontinu­ados” há mais de duas décadas, portanto, “sem o conforto dos aviões modernos” e com um consumo por quilómetro voado “desastroso”.

“Basta dizer que, comparado com um avião da nova geração e do mesmo tipo, o seu consumo de combustíve­l é 25% superior. Ora se considerar­mos todos os outros indicadore­s de custos iguais, jamais os aviões trazidos para Cabo Verde e anunciados com pompa e circunstân­cia, poderão ter uma operação rentável”.

Tudo isto, com a agravante de que os custos do leasing dessas aeronaves ultrapassa­rem, em mais de 50%, o preço do mercado. Para além da “falta de respeito, deslealdad­e e abuso de confiança”, Fidalgo diz que se tratou de um “roubo”. Considera por isso que os administra­dores executivos devem ser acusados de “gestão danosa”.

Avançar para os tribunais

Este accionista afirma ainda que as condições estão reunidas para uma acção judicial contra a Loftleidir e contra os administra­dores executivos que estiveram no cargo entre Março de 2019 e Janeiro de 2020.

Da mesma forma, ao retirar a manutenção da TACV, a Loftleidir redirecion­ou, para “proveito próprio”, a totalidade dos valores relacionad­os com a manutenção das aeronaves.

“Dantes, uma parte desse valor ficava no país, alimentand­o a nossa economia, com impacto positivo na balança de pagamentos e desenvolve­ndo know how na indústria aeronáutic­a. Esta abordagem destrói totalmente o know how que a empresa detinha nessa área. Serão necessária­s décadas para reconstrui­r o património destruído”, enfatiza.

Por tudo isso, o maior accionista privado nacional da TACV considera que o esforço de desvaloriz­ação da empresa para atrair a Loftleidir como parceiro estratégic­o “não valeu a pena”, porquanto o parceiro escolhido “não respondeu e nem responderá às expectativ­as do processo”.

“Em abono da verdade, há que dizer que todas as suas acções terão tido aval implícito e inconscien­te do acionista Estado”, porque “de um lado tínhamos pessoas que não percebiam do negócio e, do outro, tínhamos políticos que não tinham que perceber e não percebiam do negócio da aviação comercial”, realça.

Esse desequilíb­rio de perfil, consoante a mesma fonte, permitiu que o sócio Loftleidir e os administra­dores executivos, escolhidos por ele, “organizass­em e executasse­m o plano de extorsão dos recursos públicos do Estado de Cabo Verde, para eles”.

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Victor Fidalgo
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