O discurso de Nana Akufo-Addo
Nana Akufo-Addo é o actual Presidente do Gana.
Fez seus estudos no seu país natal e na Inglaterra. É formado em economia e direito. Exerceu profissionalmente, no seu país, na Inglaterra e na França. Daí falar, aisement, o inglês e o francês.
Desde os anos 70, após seu regresso ao país, entra para a política activa. Em 1992, ingressa no Novo Partido Patriótico (NPP) e é eleito deputado. Foi procurador-geral e ministro da Justiça de 2001 a 2003. Neste mesmo ano (2003), foi nomeado ministro das Relações Exteriores, cargo que ocupou até 2007.
Candidata-se, pelo NPP, às eleições de 2008, que, apesar de ganhar a 1ª volta, acaba por perder na 2ª. Concorre outra vez, em 2012, e volta a perder. Alega fraude e interpôs causa junto ao Supremo Tribunal, Tribunal que acabou por confirmar a vitória de seu adversário, em 2013.
Em 2016, volta a candidatar-se pela terceira vez e é eleito, após mais uma renhida disputa eleitoral. Inicia funções em janeiro de 2017. Concorre a um segundo e último mandato, e é de novo eleito, após mais uma renhida disputa. Tomou posse em Janeiro de 2020.
Nana Akufo-Addo é seguramente dos mais clarividentes Presidentes de África da actualidade.
A ancestralidade do Ghana
Na verdade, este Ghana moderno deriva de um grande e rico império. Na Alpha encyclopédie, La grande encyclopédie universelle en couleurs, 1970, Tome 7, Paris, pode-se ler: “O Gana, antiga colônia inglesa de Gold-Coast, tira seu nome de um grande império cujo apogeu, segundo a tradição oral, se situaria entre os sécs. X e XI, e cuja prosperidade baseou-se no comércio do ouro. O desenvolvimento do império deveu-se a sua situação privilegiada nas rotas comerciais trans-saharianas. A partir do séc. XV, portugueses, primeiro, seguidos de holandeses, dinamarqueses, suecos, ingleses e até prussianos foram fundando feitorias ao longo da costa, ati
rados pelas minas de ouro, minério que abundava no império. Mais tarde, dá-se início ao comércio de escravos. (Tradução livre do francês).
Apesar da presença de todos esses impérios europeus, o império ashanti resiste. Foi só no séc. XIX que o território é submetido ao poderio do império inglês, passando o Ghana a fazer parte do vasto império britânico.
Gana ascendeu à independência em 1957, pelas mãos de um grande visionário e pan-africanista, Kwame N’Krumah, tornando-se no primeiro país independente do continente africano sub-sahariano.
Em 1966, acontece o 1° golpe de estado, sendo N’Krumah destituído por uma junta de oficiais militares.
Jerry Rawlings, o tenente-piloto
Seguiram-se um rol de golpes e contra-golpes, até entrar em cena um ilustre tenente e piloto de força aérea, Jerry Rawlings (JR). Este, agastado com a corrupção que gangrenava o país, tenta um primeiro golpe, em 1979, que falha. Na sequência disso, é preso e condenado à morte. Apesar de condenado, nesse mesmo ano, com a ajuda de outros oficiais, JR concebe e executa um outro golpe, agora com sucesso.
Entrega, de seguida, o poder a um Governo Civil. Porém, em 1981, insatisfeito com o rumo que o governo civil fazia da res-publica, que considerava gangrenada pela corrupção, dá um novo golpe. Desta vez, assume ele mesmo os destinos da nação.
Nos anos noventa, com o advento do multipartidarismo, “converte-se em civil” e em democrata. Funda o seu partido, o Congresso Democrático Nacional, com o qual vai às eleições multipartidárias, em 1992, e é eleito Presidente.
JR deu então início à construção do Ghana moderno e democrático, colocando seus alicerces. Deixa o poder em 2001, tornando-se, mesmo assim, um incontornável da política ganense e africana.
A democracia ganense
As eleições no Ghana são disputadas renhidamente e o vencedor quase sempre ganha com uma margem muito estreita, o que, não raras vezes, levou a desacatos e até a mortes. Contudo, todas as contendas eleitorais acabam, após o veredicto da Corte Suprema que decide, em última instância, o verdadeiro ganhador/vencedor. Lido o veredicto, o perdedor, acaba por aceitar o veredicto. Ninguém assume o poder sem ser pelas vias estabelecidas na Carta Magna da República.
A economia do Ghana
Com um PIB Bruto de 83.180 milhões, e Per Capita de 3.300 USD, em 2012, a economia do Ghana assenta-se numa estabilidade política que o país vive desde que foi instalada a democracia multipartidária e numa gestão criteriosa dos recursos provenientes da extração de recursos naturais e de sua agricultura.
Os principais produtos de exportação do país são o ouro, a madeira e o cacau, de que é um dos principais produtores e exportadores mundiais. Explora e exporta igualmente outros importantes produtos naturais e agrícolas. O Ghana é quase totalmente independente no que se refere a produção agrícola.
Um discurso para a História
Mas, voltemos ao que interessa, o Discurso de Nana.
Nana Akufo-Addo recebeu o Presidente da França, Emanuel Macron, em visita ao seu país. E, na ocasião, proferiu um discurso de mais ou menos 10 minutos.
Estupefacto e/ou anestesiado, Macron só pôde abanar a cabeça ao que foi ouvindo. É que o PR francês não estava à espera de ouvir uma grande lição de história, de nacionalismo e de soberania. Estava perante uma outra estirpe de dirigente africano.
Na verdade, eram dois intelectuais que estavam face to face.
Possuidor de importantes diplomas académicos, tendo exercido profissionalmente no seu país, na Inglaterra e na França, Nana absorveu tudo o que de bom vivenciou na vida académica e profissional. Mas passemos ao conteúdo de seu discurso.
Ao contrário do habitual, Nana Akufo-Addo não culpabilizou nenhuma potência estrangeira pelo atraso de África. Culpou, sim!!, os próprios dirigentes africanos, começando pelos do seu próprio país, pelo estado em que a maioria dos estados africanos se encontram, quase 60 anos após suas independências.
Nana disse não ser justo que, 60 anos depois, os países africanos estarem ainda a mendigar... dinheiro de contribuintes franceses e europeus, para financiar seus orçamentos para a educação e para a saúde.
Nana comparou o estado actual dos países africanos com os países asiáticos independentes, à mesma altura, e assumiu que a culpa é dos próprios africanos! Como pode haver tanta diferença no nível de desenvolvimento entre os países asiáticos (Singapura, Tailândia, Coreia, etc., etc.) e os países africanos quando todos ascenderam a independência, quase no mesmo período, interrogou ele.
Nana Akufo-Addo disse que não pode ser que um continente que tem 30% da riqueza mundial se encontra no estado em que se encontra, permanentemente estendendo as mãos a pedir apoios de contribuintes europeus.
Sobre esta temática, no concreto, aconselhava todos os interessados a verem/ouvirem uma série de interessantíssimos programas, da autoria do jornalista africano da RFI, Alain Foka. É só ir ao podcast da RFI e selecionar o nome deste extraordinário jornalista-investigador.
Nana Akufo-Addo disse ainda ser inaceitável que um continente que tem a maior quantidade de terra arável do mundo, continuar a mendigar por ajuda externa.
E... de tudo o resto do que disse o Presidente do Ghana é importante reter isto:
“Com toda a riqueza que a África possui, devia ser exatamente este continente a oferecer ajuda, leia-se dar dinheiro, aos outros continentes ... E NÃO O CONTRÁRIO”!!!
Nana falou igualmente da emigração forçada dos jovens africanos. Comparou esta emigração com a do séc. XIX, na Europa, quando milhares de italianos e irlandeses literalmente fugiram desse continente em busca do “eldorado americano”. Nem precisou ir aos séculos das “descobertas” e subsequentes.
Disse que o que está acontecendo com os jovens africanos é fundamentalmente culpa dos dirigentes africanos, pois, estes não oferecem à sua juventude outra perspectiva que não embarcarem nessa aventura de se meterem em perigosas embarcações, muitas vezes perdendo-se nas profundezas do Atlântico, aliás, repetindo exatamente o que os europeus fizeram séculos seguidos no passado.
Resumindo
Nana Akufo-Addo disse que o problema é fundamentalmente de atitude dos africanos e de seus dirigentes.
Não mais que isso!
E isto significa que a África precisa de dirigentes comprometidos com o desenvolvimento de seus países e não com seus próprios interesses. Dirigentes comprometidos com a boa gestão da coisa pública... Servir o povo e não se servir dos bens que pertencem ao povo.
Por isso, disse Nana Akufo-Addo que o lema de seu mandato é tudo fazer para proporcionar aos jovens ganeses um futuro melhor, para que nenhum ganês tenha que sair de seu país e do seu continente em busca de qualquer outro eldorado, sublinhando que o eldorado dos ganeses é o Ghana. E que o eldorado dos africanos... deve ser a África.
Nana Nana Akufo-Addo iniciou o seu 2° mandato em 2020, depois de mais umas renhidas eleições... que ganhou. Estou certo de que não vai ludibriar os ganeses, tentando mexer na Constituição para brigar por um terceiro mandato, mesmo sabendo que o poderá ganhar.
Seria recomendável que todos os dirigentes africanos ouvissem o discurso de Nana Akufo-Addo. Que todos os africanos ouvissem e refletissem sobre esse discurso. Para refletirem, para aprenderem.
O discurso de Nana Akufo-Addo devia ser ouvido e estudado/ensinado, em todos os estabelecimentos de ensino e de gestão, do continente africano.
Mr. President, Nana Akufo-Addo, congratulations!!!
You are the honor of Africa!!
Cidade-Berço, no simbólico 5 de Julho... Nosso Dia-Maior.