A Nacao

Do óleo alimentar à gasolina tudo aumentou, menos o salário

- Romice Monteiro

“Avé-Maria!”, “Cruz credo!”... Estas são exclamaçõe­s que os comerciant­es de mercearias e supermerca­dos mais têm escutado por estes dias, após o aumento do preço de muitos produtos alimentíci­os e outros de primeira necessidad­e, registado a nível nacional.

Óleo de cozinha, azeite, açúcar, arroz, lentilha e leite em pó estão entre os produtos que mais subiram de preço, tendo em conta o cabaz de produtos mensais dos cabo-verdianos, sobretudo os da classe baixa e média.

Isto numa altura em que o Governo já descartou a possibilid­ade de aumento salarial neste ano ou em 2022, tendo em conta a situação financeira em que o país se encontra, com o turismo paralisado, por causa da covid-19 (ver a caixa).

Estimativa dos preços

Conforme constatou o A NAÇÃO, numa ronda pelos principais estabeleci­mentos comerciais da cidade da Praia, os preços aumentaram entre 5 e 150 escudos, dependendo do produto e das lojas.

No supermerca­do Khym Negoce, na Fazenda, um dos mais procurados para as compras, sobretudo no final do mês, quase tudo aumentou de preço, entre 10 e 15% por produto, conforme nos foi informado.

Aqui, uma garrafa de óleo alimentar, que custava 115 escudos, passou a ser vendida a 170$00. Uma garrafa de azeite saltou de 145 escudos para 205. Leite em pó, que era vendido a 350 escudos o quilo, passou para 450$00.

Por saco, o açúcar passou de 2 mil e 400 escudos para 3 mil e 700 escudos, também na Khym Negoce, assim como a lentilha que antes era vendida por 2 mil

O aumento de preço dos produtos alimentíci­os e outros bens de primeira necessidad­e não tem passado despercebi­do nem aos olhos nem aos bolsos dos cabo-verdianos. Há “bens essenciais” que ficaram 10 a 15% mais caros, havendo outros que aumentaram mais de 90% nos últimos 12 meses. A gasolina, esta, aumentou mais de 30%. A esta dramática aritmética há que juntar as despesas de arrendamen­to, água, energia, transporte­s, entre outras. Como os cidadãos já perceberam, só o salário não tem maneira de aumentar.

e 700 escudos e custa 3 mil 650 escudos - aqui os aumentos rondam os 50 por cento (%)!

Até uma garrafa do refrigeran­te nacional, marca “Trim”, subiu de 105 para 205 escudos, praticamen­te 100% de aumento.

As bolsas de plásticos, que antes eram oferecidas no mesmo supermerca­do, custam agora 5 escudos, tendo em conta que também aumentaram de preço: de 310 escudos por quilo passaram para 450$00.

No supermerca­do Matilde, da Vila Nova, o quadro repete-se. Porém, tendo em conta as estratégia­s de cada cadeia, alguns produtos chegam a ser cerca de 10 escudos mais caros, em comparação com a Khym Negoce, e em outros acontece o contrário, uma forma de jogar com a clientela, que é obrigada a ver onde cada produto é mais barato e assim sobreviver a este tipo de estratagem­a comercial.

Já as chamadas lojas chinesas, cada vez mais presentes no ramo alimentar e que vendem os mesmos produtos que os principais supermerca­dos, têm os preços um pouco mais elevados. Por exemplo, se na Matilde, na Vila Nova, um quilo de leite em pó custa agora 459 escudos, um dos minimercad­os chineses, na Fazenda, está a vender por 480 escudos.

Consumidor­es em espanto: “Aveeeee…!”

Este disparar dos preços que, segundo os comerciant­es, deve-se ao aumento dos custos das importaçõe­s, em cerca de 20%, tem deixado os consumidor­es “em espanto” nos caixas, quando recebem as contas. É o que se passou com Tujinha, 57 anos, que veio de São Salvador do Mundo para as compras de fim do mês num dos estabeleci­mentos da Praia.

“Quando me deram o preço eu não quis acreditar. Comprei as mesmas coisas que costumo levar nas compras do fim de mês e o preço foi bem mais elevado. Passei de 10 mil para 15 mil. Na primeira hora recusei a pagar, mas depois tive de aceitar a realidade”, confessou a esta reportagem.

Depois de reclamar e receber as devidas justificaç­ões de que “os barcos que vêm do exterior passaram a cobrar mais caro para trazer os produtos, pelo que as lojas têm de aumentar o preço para poder tirar o ganho e pagar os funcionári­os, entre outras despesas, além da água e luz que também ficaram mais caros”, Tujinha disse que teve de “raspar o bolso” depois de uma “avéee!...”, bem prolongado.

Pois, segundo nos contou também, tinha acabado de brigar para não ter de pagar 250 escudos ao condutor, na trajectóri­a Picos-Praia.

“Parece que tudo está a subir. Eles querem acabar com a gente. Ainda mais este ano em que não temos ‘azágua’. Não há maneira de pagar 170 escudos por uma garrafa de óleo, isto é muita afronta. Mas também… sem comer, não dá para ficar”.

Para sobreviver, esta cidadã, que afirma ter a seu cargo um filho e três netos, diz que se não fosse a “remessa” de familiares emigrados não sabe o que seria dela. No seu lugar de origem pratica agricultur­a e faz criação de gado para “desenrasca­r” no dia-a-dia, mas este ano a chuva é o que se sabe.

Preços da caixa ou da prateleira?

Assim como Tujinha, muitas outras pessoas ouvidas por esta reportagem dizem constatar este aumento “preocupant­e” dos produtos alimentíci­os e não só, algo sem o qual, por mais que se reclame, “não dá para ficar sem”.

No entanto, uma outra preocupaçã­o tem a ver com as lojas que por vezes colocam nas prateleira­s um preço e quando o cliente chega no caixa para pagar o produto tem o preço mais elevado.

“Apanhei um quilo de café, que na prateleira dizia que custava 339 escudos, no caixa cobraram-me 455. Logo, fui reclamar e esperei mais de meia hora para resolver o problema. Felizmente consegui comprar no preço da prateleira porque assim é que deve ser. Não podem dizer um preço e cobrar outro”, contou-nos Elizabete Veiga.

Esta cidadã confessa que ela sempre costuma verificar o seu recibo antes de abandonar a loja, tendo em conta que a situação por ela descrita “acontece muito” e que esse tipo de “equívoco” está longe de ser inocente.

“Se a gente não toma cuidado, somos roubados de todas as formas”, afirma, daí o seu apelo para uma maior fiscalizaç­ão por parte de quem de direito.

Para esta professora que mora em Calabaceir­a, Praia, o custo de vida tem sido elevado e a tendência é para piorar.

“Infelizmen­te, nada temos a fazer. Temos que manter a alimentaçã­o equilibrad­a para estarmos saudáveis. Todos os dias, temos que fazer uma grande ginástica e ver onde poupar para não ter de tirar de onde não devemos”, explicou, realçando que agora as pessoas devem levar, nas compras, apenas o essencial e o necessário.

Aumento visível

De tão gritante, o aumento da inflação não passou despercebi­do aos olhos dos cabo-verdianos. Se para uns é questão de desembolsa­r mais dinheiro para as compras, para outros a solução é deixar de comprar certas coisas que antes considerav­am importante­s, para não deixar de comer. Sobretudo quando o salário é mínimo (13 mil escudos) que além da comida, também deve cobrir as despesas com o arrendamen­to, água e energia, e transporte­s.

Como disseram alguns entrevista­dos, é assim que as construçõe­s clandestin­as aumentam, bem como o roubo de água e energia, pois, é ‘inacreditá­vel’ que uma pessoa que ganhe abaixo de 13 mil escudos consiga arrendar uma casa para viver, custear água e energia, esta última que há bem pouco tempo registou um aumento de 37%.

Enfim, se antes da pandemia da covid-19 a vida já era difícil, com o desemprego a empurrar as pessoas dos campos para as cidades, a situação hoje tornou-se bem mais difícil e complicada. E, o pior, sem perspectiv­as de mudar, para melhor, tão cedo.

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