A Nacao

Ulisses “insiste” nas despesas com viagens

- Daniel Almeida

Em defesa da sua dama, Ulisses Correia e Silva procurou, na semana passada, durante o debate sobre o Orçamento do Estado, desmontar a informação que o Estado reservou mais de 600 mil contos para viagens em 2022. Valeu Orlando Dias, deputado do MpD, além de outras vozes, da oposição, lembrarem da premente necessidad­e de uma efectiva reforma da máquina pública. Por mais quanto tempo poderão os contribuin­tes continuar a sustentar o Estado gordo, gastador e ineficient­e que lhes coube na roda da vida?

Acontrovér­sia das verbas destinadas às viagens dos titulares de cargos públicos, com realce para governante­s e gestores de empresas públicas e institutos, continua. Criticado, diante dos 630 mil contos inscritos no Orçamento do Estado para 2022, destinados a viagens, o primeiro-ministro procurou, durante o debate parlamenta­r sobre o assunto, dar a volta à questão.

Em defesa do seu governo, constituíd­o por 28 integrante­s, Ulisses Correia e Silva apontou que os referidos 630 mil contos para viagens não se destinam apenas aos membros do Executivo, mas também a outros órgãos de soberania, com realce para a Presidênci­a da República e Assembleia Nacional.

No seu artigo da semana passada, em nenhum momento A NAÇÃO escreveu que o referido montante se destinava, exclusivam­ente, aos membros do Governo. O que aqui se escreveu é que diante do cenário de crise social e económica, imposta largamente pela pandemia da covid-19, a proposta do OE “faz claramente uma opção para continuar a financiar as ineficiênc­ias e desperdíci­os do Estado”, realçando a nossa fonte que “610 mil contos se destinam à rubrica deslocações e estadas.

Fora isso, 1,6 milhões de contos são para a assistênci­a técnica não residentes e 1,7 milhões de contos para residentes”. E, continuand­o, também se escreveu que as remunerações do pessoal dos quadros especiais “totalizam 560 mil contos, o pessoal contratado afecto aos programas de gestão e apoio recebem cerca de 748 mil contos, os partidos políticos vão receber 74 mil contos, enquanto para os benefícios de assistênci­a social é alocado cerca de 790 mil contos”.

Na sua fuga em frente, UCS acusou o PAICV de estar “a reproduzir um discurso de que os 630 mil contos inscritos nesse Orçamento, representa­m deslocações dos membros do Governo. É uma manipulaçã­o grosseira dos dados e dos números”, defendeu-se o chefe do Executivo.

“O Estado abrange o Governo, a Administra­ção Pública, os órgãos de soberania, mais setores como a saúde, a justiça, a educação, inspeções, regulação. Portanto, é preciso esclarecer os dados, os números e fazer leituras correctas”, lembrou UCS.

“Relativame­nte às despesas de deslocações e estadias: a Assembleia Nacional gasta por ano, no OE2022, 140 mil contos; a Presidênci­a da República - 15 mil contos; os gabinetes dos membros do Governo 85 mil contos, em representa­ção do Estado de Cabo Verde, e depois, há deslocações do sector da Saúde, Segurança, Polícia Nacional, Judiciária, Inspeção, Educação, Regulação. Não é o Primeiro-ministro, nem os membros do Governo que gastam 630 mil contos. Este montante está no Parlamento, na Presidênci­a da República, no Governo e na Administra­ção Pública”, sublinhou.

Governo gordo

Sobre o Governo “gordo” e “ineficient­e”, UCS não apresentou, no debate, grandes justi

ficações sobre essa sua opção. Ao arrepio daquilo que chegou a defender em 2016, afirmou que logo após a tomada de posse dos membros do Governo, no passado mês de Maio, que o executivo “gerará alguma despesa a mais, mas trará mais eficácia”.

Com a saída de Paulo Veiga, do Ministério da Economia Marítima, o Governo é composto por 27 membros, contra os 20 que iniciaram a legislatur­a anterior, com o número de mulheres a subir de quatro para nove. Jorge Santos, anterior presidente do Parlamento, foi chamado à última hora para o Ministério das Comunidade­s, depois de ver a sua candidatur­a à presidênci­a do Parlamento inviabiliz­ada.

O PAICV, maior partido da oposição, acusou, na altura, o primeiro-ministro de formar “o Governo mais gordo da história” do país, de 28 elementos, que irá custar mais 400 mil contos.

Esta solução de UCS, conforme o líder do Grupo Parlamenta­r do PAICV, João Baptista Pereira, “se configura mais grave ainda quando se sabe que num contexto económico e social totalmente diferente, em 2016, vossa excelência prometeu aos cabo-verdianos (na legislatur­a anterior) formar um Governo pequeno, com o máximo de entre a dez a 12 ministros, incluindo o chefe do Governo, traduzido numa poupança de mais de 200 mil contos por ano a serem aplicados no financiame­nto do Rendimento Social de Inclusão”.

“Se seguir este raciocínio e se havia razão para que aquela pomposa declaração de intenção, rapidament­e se conclui que vossa excelência estará hoje a retirar recursos de inclusão social para alimentar o alargament­o do seu Governo”, acusou.

Gastos públicos sem solução à vista

O ex-governador do Banco de Cabo Verde e antigo ministro das Finanças, João Serra, considera, num artigo de opinião publicado neste número do A NAÇÃO (pag. xxx), que, na proposta do OE para 2022, “não se desvenda” nenhum esforço de racionaliz­ação e contenção das despesas de funcioname­nto do Estado.

“Antes pelo contrário: mesmo perante uma forte redução das receitas públicas desde 2020, as despesas públicas correntes praticamen­te não diminuem relativame­nte ao Orçamento Retificati­vo de 2021, devendo reduzir-se apenas 2,2%, enquanto que o investimen­to público sofre uma contração muito mais acentuada, de 6,3%. Portanto, é um Orçamento demasiado sustentado naquilo que é, não o investimen­to público, mas sim o consumo público ao nível das despesas de funcioname­nto”, realça.

João Serra afirma ainda que, caso o OE 2022 fora aprovado nos termos propostos “vai sobrecarre­gar as famílias e as empresas com um enorme aumento da carga fiscal (IVA, DI), numa altura em que os cabo-verdianos já estão a viver uma escalada generaliza­da de preços, e a inflação sobe”.

Este economista chama a atenção do facto de a inflação ser um imposto escondido, que faz com que as pessoas percam o poder de compra: “Na verdade, as medidas de política fiscal para atenuar os impactos do aumento da tarifa da eletricida­de, constantes da proposta de OE2022, muito pouco contribuir­ão para o alívio do aumento generaliza­do dos preços, em que apenas os combustíve­is já acumularam um aumento de 60,7% de outubro de 2020 a outubro de 2021 e de 22,4% ao longo do ano de 2021”.

Para João Serra, o aumento de 10% sobre o direito de importação do gasóleo “é absolutame­nte uma má medida” face aos “aumentos brutais” dos preços dos combustíve­is. “Também o é, o aumento do IVA de 15 para 17%, num contexto da existência de um aumento generaliza­do de preços”.

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