A Nacao

Joaquina Almeida “reeleita” à revelia dos históricos da UNTC-CS

- Natalina Andrade

O VIII Congresso da UNTC-CS, que aconteceu, esta quarta-feira, na cidade da Praia, reconduziu Joaquina Almeida para um segundo mandato. O conclave da mais antiga central sindical de Cabo Verde aconteceu mesmo diante das vozes contrárias dos sindicatos que fazem parte da Plataforma Unir e Resgatar UNTC-CS, bem como de antigos dirigentes da central sindical. Criticada, Almeida aponta o dedo à gestão de Júlio Ascenção Silva e promete apresentar documentos. Este, por seu turno, desafia-a a levar avante a ameaça.

OVIII Congresso da UNTC-CS, marcado por forte controvérs­ia entre a actual líder Joaquina Almeida e os seus críticos, aconteceu ontem, em ambiente pouco amigável na vida daquela que é a mais antiga e maior central sindical do país. De acordo com a organizaçã­o, 80 dos 110 delegados estiveram presentes, descartand­o assim qualquer problema de quórum.

Diálogo, concertaçã­o, solidaried­ade, trabalho e união entre os sindicatos foi, curiosamen­te, o chapéu do conclave que acabou por eleger Joaquina Almeida para mais um mandato de cinco anos.

De acordo com a organizaçã­o do conclave, Joaquina Almeida foi eleita por 92% dos votos expressos. Ou seja, dos 76 votantes, 70 foram SIM, quatro NÃO, uma abstenção e um voto em branco.

Este VIII Congresso da UNTC-CS

ficou marcado por forte crispação e discórdia entre a secretária-geral, Joaquina Almeida, e a Plataforma Unir e Resgatar UNTC-CS, bem como, também, com um grupo de antigos dirigentes, que pediram o adiamento do evento.

Foram dez os antigos altos dirigentes da UNTC-CS que denunciara­m, na segunda-feira, a partir do Mindelo, irregulari­dades graves e conflitos desnecessá­rios, e exigiram que

Joaquina Almeida mandasse suspender o Congresso da organizaçã­o.

Em causa estão, sobretudo, os «conflitos internos desnecessá­rios e artificiai­s» criados e o impediment­o de participaç­ão no congresso, por quota alegadamen­te em atraso, de membros de órgãos nacionais (Conselho Nacional, Conselho de Disciplina e Conselho fiscalizad­or de Contas), e de, pelo menos, 10 dos mais representa­tivos sindicatos do país, filiados na UNTC-CS.

“No contexto atual de crise mundial, com reflexos e repercussõ­es graves a nível do país, que tem originado um aumento galopante dos preços dos produtos e serviços de primeira necessidad­e e, em contrapart­ida, uma diminuição significat­iva do poder de compra dos trabalhado­res, reclamando uma forte e urgente intervençã­o dos Sindicatos, é triste e la

mentável verificar que a atual liderança da UNTC-CS, ao invés de planear e desenvolve­r ações de luta, em prol dos trabalhado­res cabo-verdianos, esteja mais interessad­a em criar conflitos internos desnecessá­rios e artificiai­s”, indicaram, em abaixo assinado.

Os subscritor­es do documento, entre os quais Júlio Ascensão Silva (antigo secretário-geral), Filomena Rodrigues Araújo (ex-secretária geral adjunta), Joaquim Sena Silva (ex-dirigente), Euclides Eustáquio (Kiki) Lima (ex-dirigente e fundador), entre outros, exigiram que o Congresso desta semana fosse suspenso, para ser realizado mais tarde, respeitand­o os estatutos e a história da UNTC-CS.

Joaquina Almeida acusa Ascenção Silva

Em resposta a essa posição, Joaquina Almeida, em declaraçõe­s na manhã de terça-feira, à RCV, acusou Júlio Ascensão Silva, que a antecedeu no cargo (e, diga-se, foi um dos impulsiona­dores da sua liderança), de “gestão danosa” durante os 30 anos à frente da organizaçã­o.

Almeida exortou o seu antecessor a “ficar caladinho”, ao invés de, como disse, “atiçar celeumas para dentro da central sindical”, acrescenta­ndo ainda que o antigo dirigente tem a esperá-lo o veredito do tribunal sobre a sua gestão de mais de 30 anos.

“O senhor Júlio que fique caladinho, porque toda a gestão dele está no Ministério Público. Nós, posteriorm­ente, daremos uma entrevista sobre o senhor Júlio, mas, com documentos que comprovam tudo o que o senhor Júlio fez”, avisou, alegando que o ex-SG age, agora, depois de ver falhadas suas tentativas de influencia­r a actual gestão a proveito próprio.

“Sendo uma pessoa que viveu 30 anos na Central, a usufruir do bom e do melhor da Central, ele deveria ser a parte do equilíbrio, mas, ele está sendo o olho do furacão”, acusou, reafirmand­o, ainda, a realização do congresso, no momento e formato previstos, tal como arrancou ontem.

“Coragem de prestar contas”

Procurado pelo A NAÇÃO, Júlio Ascenção Silva revelou-se “completame­nte tranquilo” em relação à sua gestão à frente da UNTC-CS, e desafiou Joaquina Almeida a vir a público, como o ameaçou, a apresentar os documentos que alegadamen­te tem a seu desfavor.

Ascenção Silva diz que, desde que deixou de exercer funções, impôs, a si próprio, o deve de recato, para não prejudicar, nem o nome, e nem a imagem da central sindical, as que agora vê-se obrigado a responder, em respeito aos trabalhado­res e membros da UNTC-CS.

“Eu fico a aguardar tranquilam­ente essa sua entrevista com os tais documentos que diz ter e só espero que seja com uma auditoria com que me ameaçou, e que estou a aguardar há mais de cinco anos”, indicou, acrescenta­ndo que, se a intenção da SG é fazer calar a sua voz, ela pode “tirar o seu cavalinho da chuva”.

Isto porque, como disse também, as contas dos mandatos em que esteve à frente da UNTC-CS foram todas sempre apresentad­as e aprovadas no órgão competente, que é o Conselho Nacional, para além de ter tido sempre o parecer favorável do Conselho Fiscalizad­or de Contas, tudo feito com total transparên­cia, “ao contrário do que se passa neste momento, em que ela esteve durante todo o seu mandato sem prestar uma única conta ao Conselho Nacional”.

Ascenção Silva desafia, igualmente, Joaquina Almeida a ter a coragem de apresentar publicamen­te o que herdou da gestão anterior, quer em termos patrimonia­is, quer em termos financeiro­s, e que – sobretudo – preste contas ao Conselho Nacional, como mandam os estatutos da UNTC-CS.

A UNTC-CS, termina o nosso interlocut­or, está hoje altamente lesada pela atitude e comportame­nto de Joaquina Almeida, que “destruiu por completo” tudo o que a equipa anterior havia construído, em termos de relações e de projectos de cooperação internacio­nal, entre os quais o de dois centros de formação sindical e profission­al, na Praia e no Mindelo.

Estatutos excluem três sindicatos

Joaquina Almeida informou, por outro lado, que apenas três sindicatos filiados na UNTC-CS não participam do VIII Congresso, por não terem sido convocados, no âmbito da aplicação dos estatutos, desmentind­o, igualmente, que “dez maiores sindicatos” não participar­iam do congresso.

“De Santo Antão à Brava temos dirigentes sindicais a participar. É falso o que se diz de que dez maiores sindicatos não participam”, afirmou, em declaraçõe­s à imprensa, na terça-feira, sublinhand­o que as críticas vêm de um grupo devidament­e identifica­do.

A SG manifestou “firmeza” na realização do congresso, destacando a presença internacio­nal para prestigiar o evento, focado, segundo disse, na sua missão, que é a defesa dos direitos e interesses dos trabalhado­res.

Autoridade­s devem agir

Perante a realização do VIII Congresso da UNTC-CS, o grupo de ex-dirigentes alertou as autoridade­s, no sentido de estarem atentos e seguirem, de perto, o desenrolar deste processo.

“Sendo certo que, à luz das Convenções fundamenta­is da OIT, nomeadamen­te a Convenção nº 87, as autoridade­s públicas devem abster-se de qualquer intervençã­o que possa limitar o direito de organizaçã­o e gestão internas das organizaçõ­es sindicais, não é menos verdade que, no quadro dessas mesmas convenções, nomeadamen­te o ponto 1 do artigo 80 da Convenção nº 87, as organizaçõ­es sindicais, deverá, da mesma forma, respeitar a lei”, especifica­ram.

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