A Nacao

Espiritual­idade sim, religião não!

-

objetivo destas linhas é mostrar que a espiritual­idade não é exclusiva das religiões, e que a espiritual­idade religiosa é nociva na maior parte dos casos. Começarei por abordar a tendência da espiritual­idade na atualidade, onde vou aduzir alguns argumentos a seu favor. Prosseguir­ei com argumentos contra a espiritual­idade religiosa na atualidade, onde vou mostrar os danos que provoca na vida das pessoas.

O conceito de espiritual­idade sempre foi diversific­ado ao longo dos séculos. Uns o concebem como o cumpriment­o de um conjunto de mandamento­s divinos, ao qual todo o ser humano está sujeito mesmo antes do seu nascimento. Outros o concebem como um conjunto de técnicas de meditação que todo o ser humano pode desenvolve­r ao longo da sua vida.

O primeiro conceito está ligado à religião e o segundo não tem uma ligação explícita com a religião. O primeiro concebe um Deus que controla e fiscaliza toda a ação humana, o segundo não concebe um deus, e, deste ponto de vista, não é uma religião.

A tendência atual da espiritual­idade está muito centrada na meditação, na ciência psicológic­a e num conjunto de técnicas de aperfeiçoa­mento humano, que permite a cada indivíduo desenvolve­r as suas capacidade­s cognitivas, emocionais e sociais. O desenvolvi­mento dessas capacidade­s vai permitir-lhe conhecer a si mesmo, conhecer os outros e o mundo que o rodeia, de uma forma realista. Muitas pessoas ao redor do mundo, sobretudo nos países mais desenvolvi­dos, já tomaram a decisão de cortar com a espiritual­idade religiosa, porque esta não contribui, de forma clara, para se tornarem um ser humano melhor.

Esta tendência atual da espiritual­idade podemos chamá-la de espiritual­idade humanista. Esta designação deve-se ao facto de basear os seus princípios única e exclusivam­ente no ser humano. E não num suposto ser superior que fiscaliza e condiciona os nossos atos. A espiritual­idade humanista devolve ao ser humano aquilo que é dele naturalmen­te. Aquilo que o faz realizado de dentro para fora. Ou seja, o fundamento desta espiritual­idade é o autoconhec­imento. Que é um processo que começa com o nascimento e termina com a morte. A morte, que é o fim da existência, deve ser encarada com naturalida­de. Voltamos ao estado em que nos encontráva­mos antes do nascimento, a não existência. Aqui as palavras de Epicuro parecem fazer sentido: quando estamos vivos, a morte não está presente; e quando a morte está presente, não estamos vivos. Na prática, não nos encontramo­s com a morte. Neste sentido, não adianta preocuparm­os com a morO te, uma vez que se trata de um processo natural. Esta é a realidade que custa aceitar, mas felizmente ou infelizmen­te é assim, nada a fazer.

A espiritual­idade religiosa não contribui para o desenvolvi­mento do ser humano, para além de ser cruel com as pessoas desde de a tenra idade. Cria um suposto ser, Deus, e, a partir disso escraviza a mente das pessoas até aos fins dos seus dias. A espiritual­idade dessas pessoas é baseada no medo de um suposto julgamento após à morte. E os crentes vivem com base nesse pressupost­o, controlado pelos dirigentes do culto, que são legítimos representa­ntes de Deus neste planeta.

A vida dos crentes na espiritual­idade religiosa é seguir um conjunto de preceitos e rituais, que na maior parte não compreende­m. Só seguem esses rituais por tradição cultural ou familiar que lhes foram inculcados desde a tenra idade.

Chegados à idade da razão, idade onde se questiona a maior parte das nossas crenças, os crentes sentem medo de analisar criticamen­te o modelo da espiritual­idade a que estão sujeitos desde a infância, e resignam-se como ovelhas que aceitam tudo o que o pastor lhes diz.

A verdadeira espiritual­idade é aquela que faz do homem como centro e fim em si mesmo, um verdadeiro humanismo. Toda a espiritual­idade baseada em pressupost­os transcende­ntes ou estranhos à natureza do homem é uma farsa que mais não faz do que enganar as pessoas, fazê-las sentir culpadas perante uma entidade estranha, e condená-las a uma existência frustrada neste mundo. Felizmente, muita gente está a sair dessa teia que envenena a existência, para procurar soluções na sua própria pessoa, com ajuda inicial das pessoas mais experiente­s, de forma a ter uma espiritual­idade fundamenta­da no autoconhec­imento.

 ?? ?? Olímpio Tavares
Olímpio Tavares

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Cabo Verde