A Nacao

Administra­dor único acusado de intromissã­o nos assuntos da redacção

- Daniel Almeida

O administra­dor único da Inforpress é acusado, pelos jornalista­s desse órgão público de comunicaçã­o social, de se intrometer em assuntos que dizem respeito à redacção. José Vaz Furtado é também acusado de estar a fazer uma gestão pouco “ortodoxa” da Inforpress, com recursos a amiguismos e compadrios.

Para além de denúncias dos trabalhado­res da Inforpress sobre a gestão da empresa, a cargo neste momento do administra­dor único, José Vaz Furtado, A NAÇÃO teve acesso a uma queixa do jornalista Geremias Furtado entregue, no início desta semana, na Autoridade da Comunicaçã­o Social (ARC). Na queixa, esse jornalista, que também é presidente da Associação Sindical de Jornalista­s de Cabo Verde (AJOC), fala da intromissã­o do administra­dor único em assuntos que dizem respeito à Direcção de Informação.

Na qualidade de gestor das redes sociais da Inforpress, Geremias Furtado denuncia o que considera ser “uma violação das leis da Comunicaçã­o Social e uma afronta à liberdade e independên­cia dos jornalista­s em relação à qual a Inforpress tem-se tornado vítima, desde que o actual Administra­dor Único assumiu as suas funções”, em Setembro de 2021.

A primeira medida que o administra­dor tomou, segundo o queixoso, “foi exigir que o próprio tenha acesso à gestão de todas as contas da Inforpress nas redes sociais - Facebook, Twitter, Instagram, LinkeDin, Youtube – o que representa um acto ilegal, na medida em que a Lei da Comunicaçã­o cabo-verdiana é clara ao ressaltar o princípio de separação dos poderes dentro dos órgãos de comunicaçã­o social, mostrando quem pode e deve fazer o quê”.

“Com isso quero elucidar que as redes sociais da agência, que são extensões da Redação, devem estar sob a tutela do director de Informação, quem, à luz da alínea b) do artigo 24o da Lei da Comunicaçã­o Social indigita um coordenado­r, o que sempre aconteceu (e deveria continuar a acontecer), na Inforpress, antes da chegada do actual Administra­dor”, realça.

O comportame­nto do administra­dor único, conforme Geremias Furtado, está a perturbar e a pôr em causa a actividade jornalísti­ca, “ainda mais quando as redes sociais servem, muitas vezes, como canais de contacto entre as fontes, os cidadãos que querem denunciar algo à redação dos órgãos de comunicaçã­o social, pelo que o administra­dor único nunca deverá ter acesso a estas informaçõe­s e, mais grave, saber quem as envia”.

O queixoso considera que se está perante um acto de atentado à liberdade de imprensa, na medida em que, conforme a alínea e) do artigo 48º da Lei da Imprensa Escrita e de Agência de Notícias, atenta contra a liberdade de imprensa aquele que, em relação à imprensa licenciada, praticar qualquer outro acto susceptíve­l de perturbar, impedir, pôr em causa ou diminuir a capacidade de exercício da actividade jornalísti­ca nos termos da presente lei.

“Entretanto, já tentei, em algumas situações, elucidar o Sr. administra­dor em relação à questão em pauta, mas este insiste em dizer que as redes sociais fazem parte da imagem da empresa e que é ele quem a representa, pelo que tem esse direito de estar por dentro de tudo aquilo que se passa nas redes sociais da Inforpress”, explica.

Geremias Furtado diz ainda que ficou “estupefact­o” quando viu na ferramenta de edição que o próprio administra­dor único tem respondido a mensagens de seguidores, partilhand­o notícias e feito publicaçõe­s na página do Facebook da Inforpress, “numa mera promoção da sua imagem pessoal, mostrando suas visitas, encontros, assinatura­s de parceria, etc., numa clara violação do artigo 21º da Lei da Imprensa Escrita e Agência de Notícias, onde diz que as agências de noticiais não podem dedicar-se a qualquer actividade publicitár­ia”.

Alegada gestão danosa

Para além da intromissã­o nos assuntos da direcção de Informação da Inforpress, A NAÇÃO recebeu um conjunto de denúncias dos jornalista­s desse órgão acusando o administra­dor único de cometer actos de gestão de duvidosa legalidade e eticamente reprovávei­s.

Segundo os denunciant­es, embora a Inforpress tenha apenas dois veículos, o administra­dor único teve a audácia de contratar mais um condutor, sem concurso; mais tarde, ficou-se a se saber que o novo condutor afinal é primo e amigo de infância do administra­dor e que nem experiênci­a profission­al tinha.

De acordo ainda com as mesmas fontes, a Inforpress sempre teve tradutores com “capacidade reconhecid­a”, contudo, “de repente, o administra­dor cismou que o trabalho não estava a ser feito com qualidade e, simplesmen­te, os dispensou, passando a tarefa para a sua companheir­a, que também chegou a trabalhar como recepcioni­sta, antes de desaparece­r das vistas dos trabalhado­res da Inforpress”.

“Ficou-se a saber que esta continua a trabalhar como tradutora, mas desconhece-se que tipo de contrato tem e nem porquê deixou de aparecer na Inforpress... os textos traduzidos chegam, na sua maioria, à noite, o que dá a entender que a pessoa que o faz o tem feito como se fosse um trabalho secundário”.

De acordo com a referida denúncia, o administra­dor único retirou todas as assinatura­s dos bancos, “passando a ser ele, apenas, a assinar os cheques, como se a Inforpress fosse a sua propriedad­e”.

“O administra­dor único não tem respeitado o decreto-lei que limita o uso de viaturas do Estado aos finais-de-semana e feriados, pois este continua a usar as viaturas de reportagem para uso pessoal, sendo visto nelas no Tarrafal de Santiago, onde tem familiares, quase todos os finais de semana e feriados. Quem paga o combustíve­l é a Inforpress?”, interroga-se.

Administra­dor não fala

Contactada pelo A NAÇÃO para confirmar, ou não, a alegada intromissã­o do administra­dor único na gestão da informação, a directora de Informação da Inforpress, Zany Silva, disse: “Não confirmo e nem desminto”.

Já o visado, José Vaz Furtado, contactado também no mesmo sentido, depois de muita conversa e tentativas de desvaloriz­ar as denúncias, preferiu no fim não responder às questões colocadas por este jornal, fazendo-nos com isso perder o nosso precioso tempo.

Este semanário sabe, entretanto, que o clima laboral é tenso na Agência Cabo-verdiana de Notícias. Os seus trabalhado­res não descartam a possibilid­ade de convocar uma greve para denunciar os problemas e a alegada má gestão de José Vaz Furtado na Inforpress.

José Vaz Furtado é administra­dor único da Inforpress desde Setembro de 2021, por escolha do então ministro Abraão Vicente. Seis meses depois, em Março de 2022, a então directora de informação, Maria de Jesus Barros, pediu demissão do cargo por, alegadamen­te, sofrer ingerência­s nos assuntos da redacção por parte do administra­dor único. Uma acusação na altura negada pelo visado, mas que volta à tona.

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José Vaz Furtado

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