O cerco da frota do Conde de Essex
Mais de uma década passara sobre a criação da freguesia de Santa Clara. A sua paroquial entretanto já tinha deixado a histórica Ermida para iniciar o longo périplo feito quando de lá saiu, passando do Convento dos Franciscanos para a Ermida do Corpo Santo, templos mais próximos do centro da cidade como era pretendido pelos novos fregueses resultantes do acrescento pomposamente efectuado. Porém, as questões com defesa da costa, em especial na zona original de Santa Clara, continuavam a ser de grande premência, a exigir cada vez mais cuidado e investimento, já não por causa das investidas de D. António Prior do Crato, entretanto falecido em Paris, mas agora porque a Armada da Rainha D. Isabel de Inglaterra, capitaneada por Robert Devereux, Conde de Essex, o “favorito” da importante monarca, não dava descanso à poderosa armada de Espanha, tendo escolhido os Açores para saquear as naus da India que mantinham passagem quase obrigatória no arquipélago.
A Real Armada Inglesa, depois dos êxitos obtidos nos mares da India, de Espanha e Portugal, e já depois destes de ter tomando a cidade de Cádis e de seguida saqueado Faro, no Algarve, dirigiu-se para os Açores passando à vista da Ilha Terceira com cerca de cem embarcações, metade por cada lado da ilha, numa ufana manobra de exibição do seu poder e mal fazer, pouco depois comprovado com o ataque feito às ilhas do Faial e Pico, onde provocaram grandes danos, saqueando- as e incendiando- as. Na posse desta informação, trazida da Terceira por um pequeno barco de cabotagem, o Governador de São Miguel na altura, Gonçalo Vaz Coutinho, sem perder tempo, mandou tocar a rebate começando de imediato a tomar medidas para que, caso a armada inglesa, como seria expectável, vir também saquear São Miguel, a sua defesa estar devidamente preparada, atacando os adversários na hora do desembarque, seu momento de maior fragilidade. Embora contrariados, os Capitães e Oficiais do Governo da Cidade mandaram vir de várias partes da ilha gente para melhorar e guarnecer as trincheiras de Ponta Delgada, dando instruções para a população de Vila Franca abandonar a localidade refugiando-se no interior e na costa Norte da ilha, já que, perante o poderio da armada inglesa, era impossível dividir as tropas e proteger ambas as frentes. A contragosto de alguns foi assim que se procedeu à defesa da ilha, com o método utilizado revelando-se de grande eficácia.
Com a protecção da baía e do cais da cidade deixada por conta da artilharia do castelo de São Brás, as trincheiras de Santa Clara e do Rosto do Cão, ficaram bem guarnecidas e, com rondas de cavalaria a circular repetidamente entre elas e as fogueiras que faziam durante a noite, deixavam aos invasores a ideia de serem muitos mais os defensores em terra do que realmente eram. Sobretudo ficava patente que os habitantes não temiam a invasão, até a esperavam! A estratégia resultou e, embora Vila Franca fosse ocupada, felizmente sem grandes danos, em Ponta Delgada todas as tentativas de desembarque foram rechaçadas, com os invasores ingleses pouco mais fazendo do que manterem-se ao largo descarregando sucessivas bombardas, sem grande acerto porém, causado pouco estrago mas exigindo grande esforço e atenção dos defensores, já que a contenda se prolongou por longas duas semanas.
Robert Devereux, Conde de Essex, corsário inglês que tentou ocupar São
Miguel, então governado e defendido por Gonçalo Vaz Coutinho.