Na torre de marfim
Em mangas de camisa, com bonomia e ar confiante – duas canetas Montblanc na secretária –, António Costa cedeu às regras da propaganda e recebeu um tsunami de críticas. O caso não é para menos. Quando um líder do Executivo arrisca palavras de confiança no meio de um fogo imenso abre uma pequena caixa de Pandora, que apenas a sorte permitirá fechar. O calor do verão só agora começou. Monchique acabou por correr bem no valor essencial a proteger, os danos humanos, em especial a proteção das vidas.
Mas Costa não devia fugir da dura realidade: o País continua mal preparado para enfrentar os inexoráveis incêndios florestais. O Governo não consegue encontrar um quadro motivacional e hierárquico que compatibilize as diversas forças necessárias ao ataque eficaz das chamas. A propaganda sobre os oficiais locais do programa Aldeia Segura logo se evapora quando se toma a necessária decisão de evacuar pessoas das suas casas. Os corredores contra o fogo são uma miragem de papel e, por fim, continua a verificar-se um enorme défice na responsabilização das estruturas do poder local.
Um dos problemas de que este Governo padece é o desconhecimento e a falta de sensibilidade que mostra sobre o país real. Na redoma dos gabinetes e suas cortes complexas, entre assessores, adjuntos e outros corpos estranhos à democracia, os governos tendem a decidir como se Bragança, Castelo Branco ou Monchique fossem Lisboa. E o que parece em Lisboa, não se transforma em realidade no Interior envelhecido, despovoado, sem massa crítica.
Do alto da sua torre de marfim, Costa apresenta-se em discursos de propaganda e afirma a necessidade de descentralizar. Mas não basta descentralizar de Lisboa para o Porto ou Coimbra. É preciso deslitoralizar. Aí, não se lhe regista uma só ideia válida.
GOVERNO MOSTRA
FALTA DE SENSIBILIDADE
SOBRE O PAÍS REAL