Vida por vida
Catarina Pedro, de 31 anos, regressava a casa com os dois filhos, um de 4 anos e o outro de apenas 11 meses. Conduzia um automóvel na A5 e levava com ela o que mais maravilhava Kant para além do céu estrelado: a lei moral. Por isso, Catarina Pedro, bombeira da Corporação de Carnaxide, decidiu parar para prestar socorro, quando se apercebeu de um acidente rodoviário.
Catarina Pedro podia ter fechado os olhos e seguido em frente. Afinal, nem sequer estava de serviço. Se não tivesse parado, estaria hoje a desfrutar da companhia dos filhos, amigos e colegas. Assim, foi atropelada mortalmente e pagou com a vida a sua atitude altruísta. Infelizmente, não há um sistema de prémios e castigos que contemple as nossas escolhas morais.
Numa brilhante interpretação que lhe valeu o óscar de melhor ator (Coronel Frank Slade, em ‘Perfume de Mulher’), Al Pacino fez a defesa de um jovem que era alvo de processo disciplinar injusto. Depois de referir os dilemas que enfrentara ao longo da vida, assumiu que sempre soubera qual seria a escolha correta, mas que raramente a fizera, por ser a mais difícil.
Catarina Pedro fez a escolha certa, embora mais difícil. Mais difícil por atrasar o jantar que teria de preparar para os filhos e o tempo de descanso. Mais difícil porque a obrigaria a trabalhar ‘pro bono’, fora de serviço. Mais difícil por ter implicado o sacrifício da sua vida. Catarina Pedro honrou, literal e tragicamente, o lema dos bombeiros: “vida por vida”.
Agora, o Estado e a comunidade também enfrentam um dilema. A solução mais fácil seria nada fazer por não estar em causa um acidente em serviço.
Mais tarde, os órfãos de Catarina Pedro interrogar-se-iam sobre a razão pela qual a mãe heroína terá tentado socorrer alguém. A solução mais difícil e correta é dar todo o apoio a esses órfãos. Penso que foi essa a escolha.n
CATARINA PEDRO FEZ A ESCOLHA CERTA,
EMBORA MAIS DIFÍCIL