Correio da Manhã Weekend

“SEM UM TOSTÃO” A MEIO DO ANO

No verão de 1994, a notícia de o Governo estar sem verbas para a formação profission­al interrompe férias

- FERNANDO MADAÍL TEXTO

No dia 19 de agosto de 1994, a manchete de `O Independen­te', sempre temida pela classe política, que não sabia quem poderia ser a vítima da sexta-feira seguinte, inquietou centenas de entidades: “Acabou-se a papa doce.” O semanário assegurava: “Governo pára cursos do Fundo Social Europeu [FSE].”

Além de noticiar que o ministro do Emprego, Falcão e Cunha, “interrompe­u as férias para fazer uma reunião de emergência”, dava mais informaçõe­s na primeira página: “Com um buraco de 40 milhões de contos no FSE e irregulari­dades em Bruxelas, o Governo de Cavaco [Silva] foi obrigado a tomar uma decisão drástica. Pela primeira vez, foram suspensos todos os cursos de formação profission­al.”

E abria a história, na segunda página, com uma frase que era uma síntese: “O Governo português está sem um tostão para fazer formação profission­al.” Uma nota emanada, nesse próprio dia, pelo Ministério, originava títulos como “Todos desmentem ‘O Independen­te’ – Formação profission­al está em reestrutur­ação” (‘O Primeiro de Janeiro’) – e era este o teor na maioria dos jornais.

Mas o ‘Público’, com base num documento interno da Comissão Executiva do IEFP (Instituto de Emprego e Formação Profission­al), a 24 de agosto confirmava a notícia avançada pelo semanário, num texto intitulado “Atingir o estado zero a meio do ano.” Estando numa “situação financeira catastrófi­ca”, a instituiçã­o deliberara “suspender despesas”, numa lista que incluía “desde os gastos com a aprendizag­em, bolsas de formação e as iniciativa­s locais de emprego aos encargos com a integração de deficiente­s e os centros de formação”. E ainda a “aquisição de bens ou serviços, instalaçõe­s ou equipament­os”.

“Erros na organizaçã­o”, apontava o ‘Público’, teriam “criado um ‘buraco’ que poderá chegar aos 30 milhões de contos, o equivalent­e a uma redução de actividade do IEFP em cerca de 27%”. Na origem,

“veio dinheiro a menos da Comunidade e não se contou com o que se gastou a mais no ano passado”. E aquele diário concluía que, “se não chegar qualquer maná inesperado”, o IEFP “apenas estará em condições de assegurar o emprego aos funcionári­os dos seus serviços”.

As movimentaç­ões dos bastidores – com os principais responsáve­is a terem de abandonar a praia por causa deste alarme público – seriam esmiuçadas na edição seguinte de ‘O Independen­te’, esse jornal que, como o definiram no seu livro os jornalista­s Filipe Santos Costa e Liliana Valente, era “uma máquina de triturar políticos”.

O documento confirmava “situação financeira catastrófi­ca”

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Face ao ‘buraco’ financeiro, o Governo de Cavaco Silva reduziu as atividades de formação profission­al

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