Correio da Manhã Weekend

Sondagens: retratos da realidade e não previsões

- ANTÓNIO SALVADOR DIRETOR-GERAL DA INTERCAMPU­S

Àluz da recente celeuma em torno das sondagens pré-eleitorais para as autárquica­s de 2021 – motivando críticas já durante a campanha, com Rui Rio a falar em “vigarice” e em sondagens feitas à medida de quem as encomenda, importa esclarecer alguns aspetos essenciais.

1. Sondagem vs. previsão

As sondagens são retratos da realidade no momento – e não previsões –, incidindo sobre um universo de eleitores, i.e., pessoas em condições de votar.

Para uma sondagem realizada 15 dias antes da eleição coincidir, precisamen­te, com os resultados desta, seria necessário que todos os inquiridos já tivessem decidido se votam, em quem ou se se abstêm… e o que a experiênci­a demonstra é que a decisão de voto se consolida até ao próprio dia.

2. A clubite partidária

Há muitos anos que a adesão a um partido em nada se assemelha à identifica­ção com um clube de futebol, registando-se, também, um grande desinteres­se em relação à política. Contextos que explicam a volatilida­de do voto (por vezes imbuído de lógicas negativas: não se vota por alguém, mas contra alguém) e as elevadas taxas de abstenção.

3. A “espiral do silêncio”

Quando existem partidos/candidatos em “clima de opinião negativo”, os seus eleitores/simpatizan­tes respondem menos às sondagens, entendendo que estas não valorizam suficiente­mente a importânci­a dos primeiros.

Este fenómeno prejudica os partidos que demonizam as sondagens, pela recusa de participaç­ão do seu eleitorado, ficando os partidos em causa subavaliad­os.

4. A abstenção por certeza de vitória

A principal consequênc­ia dos resultados das sondagens é levar os eleitores a não ir às urnas por acharem que o seu partido/candidato já ganhou. O político “inteligent­e” é aquele que não quer aparecer em primeiro, para não desmobiliz­ar o eleitorado, de modo a ganhar nas urnas. Em grande medida, foi o que aconteceu em Lisboa nestas eleições.

REGISTA-SE, TAMBÉM, UM GRANDE DESINTERES­SE EM RELAÇÃO À POLÍTICA

5. As sondagens falham?

Quando as urnas fecham, as projeções, feitas a partir de sondagens, são dadas como realidade – o que prova que estas não falham e que os políticos acreditam nelas. O que as distingue é o seu universo: as primeiras são feitas a votantes, i.e., pessoas que já votaram, e não àqueles que, 15 dias antes, estavam apenas em condições de o fazer. É a acreditar na permeabili­dade da decisão de voto que se preparam as campanhas eleitorais e se recorre às sondagens para as nortear.n

O POLÍTICO “INTELIGENT­E” É AQUELE QUE NÃO QUER APARECER EM PRIMEIRO

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal