Estudos de genealogia

ODr. A foi guitarra-baixo (uma Fender vermelha) numa banda de bailes no Estoril. Era primo de C, que frequentava um grupo da Lapa onde se reuniam D, B, E e F, que era uma estudante de Germânicas, irmã de G, baterista da banda. Aconteceu isto: entre A e F foi amor à primeira vista – casaram, tiveram três filhos e divorciaram-se depois do 11 de Março. Entretanto, B e C, seus colegas de Direito, foram cooptados para um governo em 1983; um, era ministro; outro, esteve de secretário de Estado. Passavam férias em Portimão, e foi lá que conheceram G, que esteve a um passo de chefiar o partido X na altura. B foi para o partido Z; C manteve-se no X. B acabou por conhecer F num verão da Figueira – tinham sido maoístas, facção dos artistas. “Quem nos viu e quem nos vê”, ela ainda teve tempo de dizer. Mas um dos filhos de F e de A, R, precisava de emprego; tinha um ‘masters’ americano e entrou num banco, o W, onde ficou até seguir para um governo onde B era ministro. A e B davam-se mal mas viviam no mesmo bairro. B fora um prodígio revolucionário nos anos 70,

“Tinham sido maoístas, facção dos artistas”

agora sem barba, enquanto a mulher, M, regressava à tradição familiar – casa em Estremoz e uma temporada algarvia de adultério picante com A, que subiria de novo a ministro em 1995, e era tio de R, que entrou no banco W (escritório de NY); R tinha casado com Q, filha de G e de S, que se lembrava bem de F: tinham passado verões na Arrábida

quando eram duas adolescentes que gostavam de ié-ié e fumavam cigarros baratos nas traseiras da casa de férias, enquanto se apalpavam a medo; a pouco e pouco, e graças ao pai, foi chefe de gabinete no tempo de Cavaco (detestava-lhe o corte de cabelo) e depois presidiu a institutos no de Sócrates. O marido guardava a guitarra atrás do armário, junto com fotografias de rapazes de cabelo comprido e bigode. “Outros tempos”, disse o avô ao morrer, depois de uma merenda de melancia com cerveja preta.