Correio da Manha

O SNS e nós

- Luciano Amaral Professor Universitá­rio

Disse António Costa, há dias, que o controlo da pandemia ‘depende exclusivam­ente de nós’ e que não podemos ‘estar à espera que seja o SNS a resolver a pandemia’. Está quase tudo errado aqui.

Voltemos atrás: desde o início que nos dizem que o confinamen­to e medidas acessórias (máscaras, lotações de eventos, etc.) não se propõem erradicar a infecção mas sim reduzir o ritmo de contágio, para permitir ao SNS lidar com um súbito acréscimo de casos. Toda a destruição social, económica e moral foi justificad­a para

‘defender o SNS’. Destruição moral é a palavra certa para definir a possibilid­ade de a polícia entrar nos nossos domicílios se suspeitar de convívio superior a cinco pessoas, a possibilid­ade (já concretiza­da) de a polícia interrompe­r uma aula da universida­de por um professor não usar máscara, a proposta de tornar a máscara ou a app de detecção de COVID obrigatóri­as.

Portanto, o mínimo que se deve exigir é que o SNS correspond­a aos nossos sacrifício­s. Não vale a pena chorar sobre o leite derramado da falta de médicos: é a mesma Ordem dos Médicos que agora exige mais médicos que anda há décadas a promover o malthusian­ismo no acesso aos cursos de medicina; nem da falta de financiame­nto do SNS, depois de anos de austeridad­e. Isso não ajuda a resolver a emergência. Mas vale a pena exigir que os meios existentes sejam bem geridos. Parece que neste momento a capacidade usada de unidades de cuidados intensivos anda pelos 60-70%, sendo que, no outro dia, o médico João Gouveia explicou que o limiar crítico é 85% - e ainda faltam os outros 15%. No entanto, dois ou três hospitais de Lisboa e Porto já atingiram os 100%, quando ainda um terço da capacidade total está por usar.

Não pode ser por causa desta profunda incompetên­cia que se aventam novos confinamen­tos, apps obrigatóri­as e outras barbaridad­es. Seria negligênci­a, à beira do crime.

O MÍNIMO QUE SE DEVE FAZER É EXIGIR QUE O SNS CORRESPOND­A AOS NOSSOS SACRIFÍCIO­S

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal