A hora de Cuba
Alguns dos poucos turistas que nestes dias de pandemia se aventuraram por Havana, talvez à procura de saborear um cada vez menos tradicional ‘mojito’ na Bodeguita del Medio, terão testemunhado algo raro: uma rebelião nas ruas da capital cubana – com réplicas noutras cidades –, onde muitos dos que ousaram gritar “Liberdade!” e “Pátria ou vida” (em oposição ao icónico “Pátria ou morte”, de Fidel), acabaram na cadeia.
A última vez que a revolucionária ilha das Caraíbas viu algo idêntico foi há três décadas, quando o desmoronamento da antiga União Soviética deixou o país de Fidel Castro politicamente órfão e a economia asfixiada até agora. Não é um cenário muito diferente daquele que Cuba vive hoje. A circunstância que espoletou os protestos é, desta vez, mais abrangente.
A pandemia que está a causar uma insustentável crise sanitária no país, agravada pela escassez de vacinas, é a mesma que afastou os turistas secando a principal fonte de receita cubana. Sem dólares, nem euros, a comida que já era escassa tornou-se um luxo, os apagões energéticos frequentes passaram a permanentes e o esquizofrénico sistema monetário complicou-se ainda mais, sufocando os poucos com alguma liquidez.
Podem os sucessores da dinastia Castro continuar a culpar o embargo norte-americano por todos os males de Cuba. É certo que são inaceitáveis as medidas de bloqueio impostas por Trump a Havana – e não revistas por Biden. Mas é igualmente certo que é o partido comunista cubano o único responsável pelo travão colocado na reforma económica e nos tímidos ensaios de alguma abertura política. É, por isso, legítimo que a martirizada população cubana perca o medo sistémico e culpe agora nas ruas quem governa e oprime.
E talvez seja tempo de alguma esquerda nostálgica ocidental fazer o mesmo, porque a hora de Cuba pode ter chegado.
TALVEZ SEJA TEMPO
DE ALGUMA ESQUERDA
NOSTÁLGICA CULPAR
QUEM GOVERNA E OPRIME OS CUBANOS