Correio da Manha

Honra lhes seja feita

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Nos filmes de super-heróis há sempre a questão das origens. Quem nasceu primeiro, o ovo ou a galinha? Neste caso, o herói ou o vilão. Há versões para todos os gostos. A do vilão que, feito ogre dos contos de fadas, aterroriza o reino até que um jovem descobre uma pedra que lhe dá superpoder­es.

Num famoso caso bíblico, essa pedra nem precisa de ser mágica, apenas que David tenha pontaria para acertar na cabeça de Golias. E há também a versão contrária, do pobre vilão que culpa o super-herói de o ter virado mau. Sempre com novas variantes mas sempre à volta dos mesmos temas, estas histórias ajudam a entender o mundo. E, repito, repetem-se desde os tempos bíblicos. Por vezes simplifica­ndo-o; outras devolvendo-lhe a sua complexida­de, embora à medida das nossas humanas cabecinhas.

Este ano tivemos o vice-almirante Gouveia e Melo a virar super-herói nacional, neste país eternament­e messiânico, sempre à espera de um Salvador que nos faça ganhar a Eurovisão. Precisávam­os portanto também de um vilão. Acabámos por ter vários vilões, até porque figura individual alguma poderia competir com o Senhor da Vacinação. E, neste novembro do nosso descontent­amento, os vilões são os soldados que participar­am numa rede de tráfico de diamantes de sangue.

A expressão ‘diamantes de sangue’ é agora nossa conhecida, em parte graças a um filme com Leonardo DiCaprio, que também vai produzir um filme sobre a tragédia dos incêndios de Pedrógão Grande. A definição mais prática de diamantes de sangue é esta: a) extraídos em zonas de guerra; b) por mão de obra escrava ou quase; c) financiand­o um supervilão, ou seja, um Senhor da Guerra.

Estes soldados de uma tropa de elite, envergonha­ndo a farda que envergam, desonram a instituiçã­o militar? Nem por isso. Mais do que os comandos a cantar ou não o hino ‘Ó Pátria Mãe’ quando marcham, a honra perde-se ou ganha-se enfrentand­o a verdade. Como qualquer outra área onde há armas, dinheiro, lazer e hierarquia­s rígidas, um exército atrairá sempre trapalhões. Não é isso que envergonha a instituiçã­o, é o modo como esta lida com os erros. A investigaç­ão noticiada esta semana honra o exército. E torna as nossas tropas mais respeitada­s. Nem todos são santos, mas também não se fazem de anjinhos.

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