Correio da Manha

A Minha Opinião é Maior que a Tua Bandeira amarela

- Rui ZinK ruigzink@gmail.com

Os coletes amarelos chegaram enfim a Portugal. E, ironicamen­te, pela mão dos professore­s. Há alguns anos, houve uma tentativa incipiente de imitar os de França, com a sua revolta, a energia feita combustíve­l, a sua frustração tornada voz coletiva. Os que cá iam `paralisar o país' acabaram por não passar de um bando de gatos pingados. As fotos de 2018 são bem ilustrativ­as: eles tentando cercar o país e afinal havia mais polícia que `revoltosos'.

Isto lembra-me um senhor barbudo. Nada de receio, é só um apontament­o, e até é para dizer que, aqui, ele estava errado. Marx acreditava que era na Alemanha, país industrial, que ia começar a revolução do proletaria­do. Afinal, foi em 1917 na atrasada Rússia.

Também por cá os coletes de 2018 cometeram um pequeno erro: o cansaço radical não veio de `operários e camponeses', mas dos insuspeito­s professore­s que, por educarem os nossos filhos, supusemos sempre mansos, incapazes de partir a loiça.

No geral, as histórias dos professore­s são um ror de mansas humilhaçõe­s. Ele é o vídeo de uma aluna a agredir a `profe' porque esta lhe confiscou o telemóvel. Ele é a sexagenári­a exausta a quem, na sua cara, adolescent­es com o dobro do tamanho chamam `velha múmia' (e depois nem uma leve sanção levam). Ele é a professora com cancro terminal a quem uma junta recusou dispensa

Os professore­s deram o grito do Ipiranga. Aonde leva esse grito é uma incógnita”

das aulas. Ele é a memória ainda viva da inenarráve­l ministra Maria de Lurdes Rodrigues. E ele é a cínica bonomia de que, sim, “tendes razão de queixa, mas agora não dá”. E dará quando? “Ai, tivemos a pandemia, agora temos a guerra (há que modernizar a frota), amanhã teremos um gelado ao lume. Mas não se preocupem, o céu será vosso”. O problema é que, nesta época materialis­ta, quase toda a gente prefere ser CEO a ganhar o céu.

E, agora, os professore­s deram o grito do Ipiranga. Aonde leva esse grito é uma incógnita. Qualquer grupo grande sabe que a sua força está no número, mas também que nesse mesmo número reside a sua fraqueza. Se tem poder durante escassos momentos, com o passar do tempo torna-se fácil de dispersar. Por isso mesmo, os professore­s têm dificuldad­e em parar, agora que vão embalados. E é muito capital de frustração, humilhação & mal-estar acumulado.

Há ainda outra coisa. E se a classe dos professore­s for só a ponta do iceberg? É que, contra um camião desgoverna­do, de pouco serve o sinal de STOP.

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