LYMAN, A CIDADE DO MEDO
DESCONFIANÇA Nesta região há muita gente com simpatia pelos russos. Reconquista da cidade pelos ucranianos não foi simpática para todos
u A mulher, de tez enrugada apesar de aparentar apenas meia-idade, não esperou pela pergunta para afirmar que não queria dar entrevistas. De olhar carrancudo, continuou a arrumar a pequena banca improvisada na rua gelada onde esperava vender bolachas, uns chocolates, arenque em vinagre e mais uma dúzia de produtos básicos de higiene. Os poucos transeuntes circulavam de bicicleta pelas ruas cobertas de neve, gelo e lama aparentemente indiferentes à oferta numa cidade onde tudo falta. Lyman, localizada a norte de Kramatorsk, na estrada de ligação a Kharkiv, não impressiona apenas pelo grau de destruição, que é total, em resultado da tomada russa e, depois, da reconquista ucraniana. O que mais surpreende em Lyman é o medo das pessoas. Quase ninguém fala, praticamente todos evitam os jornalistas. A principal razão será a simpatia pelos russos dos que ainda resistem na cidade do `oblast' de Donetsk, onde muitos partiram e alguns morreram. A tomada de Lyman pelos ucranianos não foi simpática para todos. “Muita gente aqui é pró-russa e acreditam que eles ainda podem voltar a tomar a cidade. É por isso que não se querem comprometer”, disse ao CM um funcionário da vizinha estação ferroviária sob a condição de anonimato.
No emaranhado das ruas destruídas por sucessivos bombardeamentos circulam dezenas e dezenas de militares. A cidade é um importante ponto estratégico nas linhas de abastecimento a outras zonas onde as tropas ucranianas concentram artilharia pesada na expectativa do anunciado ataque russo na frente Leste, que poderia acontecer até ao dia 24 deste mês, data que assinala um ano de guerra.
Em Lyman há um anormal vaivém ininterrupto de gente que se percebe estar a chegar da primeira linha de combate. A frente russa fica ali a menos de uma dezena de quilómetros e a partir de Lyman também se alcança, num ápice, Izium ou Kupiansk, onde as forças beligerantes travam violentas batalhas que a visita-surpresa do Presidente dos
EUA, Joe Biden, a Kiev não travou. É aqui, na linha da guerra na região de Donetsk e Lugansk, que de ambos os lados se afinam as táticas para um confronto que parece ser inevitável para o evoluir a curto prazo desta interminável guerra.