Mal por mal Abril em Novembro
Aesgrima de dias 25, Abril e Novembro, parece esotérica a quem não se lembre, ou não saiba, o que se passou em 1974 e 1975. Mas a questão pode resumir-se assim: muitas das forças políticas surgidas depois do derrube do autoritarismo a 25 de Abril de 1974 não o queriam substituir pela democracia mas por um autoritarismo de outro tipo; só a 25 de Novembro de 1975 ficou claro que nenhum autoritarismo alternativo prevaleceria.
É verdade que logo a seguir ao 25 de Abril os principais partidos, do PCP (incluindo-o) para a direita, eram a favor de eleições. Não acreditavam nelas a extrema-esquerda (para quem eram uma `fraude burguesa') e a extrema-direita. Mas as primeiras eleições, para a Constituinte, só vieram um ano depois, e aquelas de que resultaram os primeiros parlamento e governo democráticos ainda demoraram outro ano. Por isso, durante dois anos houve muita manobra, luta e decisões fora da democracia. A principal linha de confronto foi, para simplificar, esta: às ambiguidades democráticas de António de Spínola, o PCP, a extrema-esquerda e uma parte do Movimento das Forças Armadas (MFA) contrapuseram a possibilidade de instaurar tipos de regime substituindo o autoritarismo salazarista por autoritarismos de esquerda. No fundo, foi isto o Processo Revolucionário em
Curso (PREC). Spínola foi corrido a dois tempos (a 28 de Setembro de 1974 e a 11 de Março de 1975) e as ambiguidades democráticas e os projectos anti-democráticos ficaram a ser sobretudo do PCP, da extrema-esquerda e do MFA, que passaram a desvalorizar as eleições e até a Constituição. O golpe falhado de esquerda de 25 de Novembro de 1975 terminou com estas pretensões e abriu enfim caminho à democracia liberal de hoje.
Há muito que esta narrativa deveria estar assente. Mas a esquerda saudosista do PREC não a aceita. E isto dá origem a ideias escusadas
Foi o 25 de Novembro que acabou por permitir fazer do 25 de Abril o tal `dia inicial, inteiro e limpo'
sobre comissões do 25 de Novembro vindas da direita. Note-se que a esquerda também deveria celebrar o 25 de Novembro, porque aí foram travados não só os revolucionarismos de esquerda como também os revanchismos de direita que imaginavam proibir o PCP e a extrema-esquerda. Na verdade, foi o 25 de Novembro que acabou por permitir fazer do 25 de Abril o tal `dia inicial, inteiro e limpo'. Sem ele, poderia ter sido só o dia inicial de outra `longa noite'.