“Li o texto e conheci imediatamente aquela narrativa. Fiquei com vontade de ir abrir caixas no sótão”
relação às personagens, a história decorre num momento em que eu passava pelos últimos anos da adolescência. Digamos que eu era mais da idade da personagem da Elle Fanning. Frequentava um curso. Não era necessariamente uma radical punk. Mas andava, lembro-me, a debruçar-me atentamente perante as minhas primeiras leituras feministas. Também nesse sentido o filme me levou a uma viagem no tempo. Li o texto e conheci imediatamente aquela narrativa. Fiquei com vontade de ir abrir caixas no sótão e, sei lá, redescobrir a bolsa de macramé oferecida pela irmã, interessantíssima e bissexual, de um namorado meu, quando éramos jovens.
Há, neste seu trabalho, uma forma muito discreta de participar. Como se não estivesse a representar mas, simplesmente, a participar nos acontecimentos. A compaixão desta mulher é absolutamente incrível. Acha mesmo que ela, a Dorothea da história, representa de certa maneira a mulher do século XX?
Reside aí um bocadinho do mistério desta profissão: quem está no filme raramente vê a história tal como ela é entendida pelo público ou pelos meus colegas de cena. Faz sentido. O que lhe posso dizer é que o guião, escrito pelo realizador, tem uma maneira muito peculiar de olhar para a mulher. É como se o realizador estivesse a falar finalmente da mulher em toda a sua complexidade. Nem sequer imagino como é que a história é vista através das personagens da Greta Gerwig ou da Elle Fanning. Mas adoro que a história inclua uma menina de 16 anos que não é um clichê. Aquela miúda não se preocupa apenas com modas e namorados, algo normal nos filmes que incluem adolescentes. No caso da minha Dorothea, foi fundamental que ela tivesse o peso de uma mulher verdadeira do seu tempo. Essa mulher é examinada, dissecada, e o resultado que temos no fim não tem nada a ver com heroísmos. Ela não está ali a fazer de super-humana. É imperfeita em situações que, acho, agrada às mulheres que querem ver bom cinema. Não é uma mulher idealizada. Não é uma mãe idealizada. Não é boa, nem é má. Ora bem, isto agrada tanto o público feminino como o público masculino. Irradia autenticidade.