Tuga sem fuga?
Há ou não há uma forma muito portuguesa de estar na vida? Há, com certeza. Decorre, em larga medida, da dependência social e da fascinação pelo poder, ambas características seculares. Nas últimas décadas, uma prolongada ditadura e uma democracia imberbe requintaram as particularidades do universo humano lusíada.
Pelo menos no contexto europeu, somos campeões na bajulice e na cortesia hipócrita. Elogios verbais ou escritos, múltiplas vezes, transportam o sinete do engano. Abraço ou beijo, múltiplas vezes, transportam o carimbo da falsidade. O típico português não costuma censurar pela vanguarda, mas costuma improbar pela retaguarda. E costuma gabar de forma previdente e não menos interesseira.
Na atividade política, salvo raras exceções, há uma tendência maioritária para depreciar os agentes. Acusa-se de terem apego à causa pessoal em detrimento da causa pública, imputa-se o defeito e generaliza-se a conveniência.
Na atividade financeira, talvez sem exceções, há uma vocação marcante para arguir os grandes gestores. Sustenta-se que ninguém faz ou promove fortunas sem práticas ilícitas e assaca-se a propensão para o individualismo desenfreado.
Na atividade desportiva, sem quaisquer exceções, há uma sentença enraizada para penalizar os dirigentes. Argumenta-se o alpinismo social, o tráfico da supremacia, o despotismo insolente.
Ainda que algumas vezes locatário da razão, ser português é ser censor, é ser negativo. Ser português, pior ainda em conjuntura depressiva, é ser maldizente, é ser intriguista. É ter pouco humor e ter muito rancor, é ter pouca torneja e ter muita inveja. O que faz um português, em regime minoritário, contra a cultura social tuga?
Não promove a fuga, mas exercita a ruga.