Destak

«O que aqui temos é um homem que pressente a morte. (...) Que vê ele no futuro? Não vê grande coisa»

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E para entrar na cabeça daquele resistente da América primordial e maravilhos­a? Como fez?

Acho que, também a nível da personagem, o papel que o Yellow Hawk assumiu era o motor que, na realidade, impelia o homem. O que aqui temos é um homem que pressente a morte. Sabe que a sua jornada em direção ao fim se aproxima, lentamente. Que vê ele no futuro? Não vê grande coisa. De certa maneira, não tem futuro. Quais são as coisas boas que a vida lhe pode oferecer naquele momento? Não, não há futuro. Mas há esperança. É isso que existe em todos os seres humanos, esperança. É-nos inerente. No caso daquele homem, que fazer com a esperança quando já não precisa dela para si? A sua grande esperança vai agora no sentido de dar esperança aos descendent­es. É isso que ele tem de fazer para deixar um legado a quem vem depois. Mesmo que por vezes não consiga deixar um rasgo de esperança nos descendent­es mais diretos, é intenção sua deixar alguma luz aos netos e às gerações que virão mais tarde. Foi com isto em mente que encarnei a personagem. Ele era alguém que se perguntou: que mais posso transmitir a quem vem depois de mim?

E como foi a sua vida entre a época em que só falava cherokee e esta coisa de ingressar na arte dramática e trabalhar em Hollywood?

Terminado o meu segundo ano no colégio, o meu pai voltou da Coreia. Foi então que saímos de casa e fomos viver para outra zona. O meu pai encontrou emprego a cuidar dos ranchos dos grandes fazendeiro­s.

Foi assim. De três em três anos, ou de quatro em quatro anos, mudávamos para outra propriedad­e. Foi assim que cresci. Fui retirado da minha cultura cherokee e cresci na América rural, rodeado de crianças americanas. Modo geral, eu era o único menino na sala de aula com a pele mais escura. Foi assim até poder ingressar no liceu. Quando esse dia veio, fui viver para um colégio interno onde o meu pai já tinha andado – ainda me lembro que as memórias dele, desses tempos de adolescent­e liceal naquela escola, eram bastante divertidas e incluíam mesmo a experiênci­a de fazer parte de uma banda de música. No meu caso, fui eu mesmo que meti os papéis para ir para aquela escola. Aceitaram-me! Estava ansioso por sair do ninho. Passei lá quatro anos. Depois alistei-me na Guarda Nacional.

Não me disse se os seus dias naquele liceu foram tão felizes como as memórias do seu pai? Ainda se lembra?

Foram experiênci­as diferentes. Passei bons tempos. Mas também passei alturas mais difíceis. Era como a vida normal, como em todo o lado. Nessa época as escolas já tinham começado a mudar. Já não eram tão brutais. Em parte porque havia uma nova geração de índios a trabalhar nessas escolas. Mais tarde, as tribos começaram a ter as suas próprias escolas. Havia no ar uma grande vaga de mudança. Foi na Guarda Nacional, nos meus meses de vida de quartel, que comecei a falar com colegas sobre o Vietnam. Acabei por me alistar. Estive no Vietname um ano. Deu para perceber que a guerra é a grande loucura da humanidade. É horrível, horrível, quando temos por aí gente a matar-se entre si.

«Estive no Vietname um ano. Deu para perceber que a guerra é a grande loucura da humanidade»

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