«[A minha personagem é] uma tipa impossível que dá importância demais a si mesma»
Manhattan. Quando era miúda vivia perto de uma linha de comboio que seguia para Nova Iorque. Do cimo da plataforma podia ver as luzes da cidade, ao longe. Costumava dizer que era ali, naquelas luzes ao longe, onde todos os meus sonhos moravam. Ainda tenho momentos assim. Há alturas em que dou comigo a andar pela cidade fora e a ter a vida que tenho. Lembro-me tão bem da primeira vez que fiz uma peça no Public Theater, o primeiro ensaio. Senti que levava ali ao lado a minha versão mais nova, eu aos 16 anos. Tive de lhe dizer que tínhamos conseguido. Tínhamos chegado onde sonhámos ir.
Tal como a sua personagem mimada do filme, a Anne tem frequentemente a possibilidade de escolher que costureiro a vai vestir. Qual é, na moda, o seu criador de eleição? Quando sonha em ser cerimoniosamente adornada por alguém, que nome lhe aparece logo a flutuar na imaginação?
Bom, desde logo devo dizer que essa é uma escolha impossível. Basta olhar à volta para se perceber que há uma quantidade inacreditável de criadores absolutamente espantosos. A minha escolha, nesse tema, seria vista como demasiado política, divisiva, interesseira. Mas, se vamos a falar de sonhos e de criadores que me deixam as pernas a tremer, acho que não teria sido mau colaborar com o senhor Hubert de Givenchy, como sucedeu com a Audrey Hepburn durante os anos do My Fair Lady. Se vamos a falar de desenhadores de guarda-roupa para a arte do cinema em que trabalho agora, teria de incluir na minha lista ideal o nome da Edith Head.
Que criações lindíssimas! Fora esses, imagino que seria demasiado divertido poder acompanhar o Yves Saint Laurent durante as suas longas estadias em Marrocos, nos anos 70.
Mas haverá, certamente, um costureiro de sonho a quem recorre porque, sei lá, só ali se vestem mulheres com o seu corpo de sereia e estrela. Qual é o nome a que recorre numa emergência que exige apresentação em estilo choque e surpresa?
Nesse domínio benefício de enorme golpe de sorte porque mantenho uma relação muito especial com a casa do senhor Valentino. Tenho sentido o privilégio de vestir algumas das suas criações. Ou seja, para mim, Valentino é número 1. Portanto, já sabem. Se o senhor Valentino quiser emprestarme uma das peças da sua coleção e museu, estou aqui para o servir com toda, toda, toda a disponibilidade.
Como é que descreveria a sua criação neste filme? Como é que descreveria a sua personagem?
O nome dela é Daphne Kluger, ven- cedora de dois Óscares e sete globos de ouro, uma tipa impossível que dá demasiada importância a si mesma. Não quer saber o que os outros pensam dela porque, para ela, os outros não existem. Tem dois ex-maridos mas o acordo pré-conjugal só foi assinado com um deles, o marido errado. Quanto ao estilo de cabelo e quantidade de maquilhagem, não sei ou não me lembro.
«Tenho sentido o privilégio de vestir algumas das suas criações. Para mim, Valentino é nº1»
Voltando à sua personagem mimada: baseia-se nalguma atriz do cinema especificamente?
Não, não, de todo. Não é baseada em ninguém. Não acho nada que a Meryl [Streep] seja mesmo assim (risos).