Advogados não cumprem lei europeia que obriga a denunciar os clientes
Diretiva é de 2008, mas Procuradoria- Geral da República e Ordem nunca receberam queixas de transações suspeitas. UE reforça alerta
O Parlamento Europeu lançou agora novo alerta aos Estados membros para que a diretiva de 2008 seja cumprida. Advogados, auditores, contabilistas, agentes mobiliários, devem denunciar clientes que efetuem transações suspeitas de branqueamento de capitais. Em Portugal, a bastonária dos advogados, Elina Fraga, admite nunca ter havido denúncias em seis anos, já que, defende, tal colide com o sigilo profissional, fundamental para o exercício da profissão.
Em seis anos, os advogados não denunciaram nenhum cliente suspeito de lavagem de dinheiro, apesar de existir uma diretiva europeia que os obriga a isso. Em causa está um documento do Parlamento Europeu datado de 2008 que prevê o dever de vigilância e denúncia por parte de bancos, auditores, advogados, contabilistas, agentes imobiliários e casinos sobre as transações suspeitas de clientes. Mas até agora nenhuma denúncia foi feita, segundo confirmou ao DN a própria Ordem dos Advogados ( OA).
A lei diz que essas denúncias têm de ser feitas pelos advogados à OA, que, por sua vez, terá de apresentar uma queixa- crime à Procuradoria- Geral da República ( PGR). A situação já levou, inclusive, a Autoridade Tributária a questionar a Ordem dos Advogados sobre o porquê da ausência de denúncias. E o Parlamento Europeu veio agora reforçar e “relembrar” os Estados membros deste dever de vigilância. Mas a OA recusa- se a cumprir esta orientação. “O advogado não pode fazer recuar o segredo profissional”, explica ao DN a bastonária, Elina Fraga. “Por isso, recusamo- nos a denunciar factos em que o advogado tenha co- nhecimento no exercício da sua atividade, a não ser em casos de crimes contra a humanidade”, sublinha. E dá o exemplo: “Se for um ataque terrorista, já se justifica.” A bastonária sublinha ainda que o facto de não haver um advogado que tenha denunciado até agora clientes deve- se pura e “simplesmente por não quererem seguir essa orientação”.
Posição que é subscrita pelo líder do Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados: “Estando em causa operações como a compra e venda de imóveis ou a atividade de gestão de fundos, não estão abrangidas pelo dever de comunicação as informações obtidas no exercício da sua missão de representação do cliente em processo judicial”, explica António Jaime Martins. “Incluindo as informações que sejam obtidas antes, durante ou depois do processo”, afirma. Ou seja, defende o líder dos advogados, o sigilo profissional prevalece.
A bastonária refere também que “a investigação criminal cabe aos polícias e ao Ministério Público e não aos advogados”.
Para a advogada Filipa Marques Júnior, a questão está em encontrar uma medida de equilíbrio e de razoabilidade. Os advogados devem cumprir os deveres de identificação e vigilância a que se encontram obrigados”, defende. Mas “esta medida transforma, de alguma forma, os advogados em polícias, o que coloca em causa um dos pilares constituintes da profissão”.