Diário de Notícias

A ‘ VOZ’ DOS PEIXES É O QUE IMPORTA NA HORA DE ACASALAR

- ROBERTO DORES

Que os golfinhos t êm a capacidade de se chamarem através de um tipo específico de “assobio”, como se de um nome próprio se tratasse, já não é novidade. Mas quem dir i a que peixes como o xarroco, a corvina, o caboz ou o imenso grupo de ciclídeos – exemplares de corpo comprimido lateralmen­te e apenas uma narina – são quase obrigados a exibir o seu “charme” vocal, a dezenas de metros de profundida­de, para atrair as fêmeas para o acasalamen­to! É que não são todas as “vozes” que conseguem seduzir as futuras “mães” dos seus filhos.

É com recurso ao computador que se revela um pouco do que se passa a mais de cem metros de profundida­de. O resultado dos sons captados via hidrofone permite perceber que aquele ruído de motor que sai das colunas é, afinal, uma corvina e que o intenso coaxar não pertence a uma rã, mas antes a um xarroco.

“Depois as fêmeas escolhem os parceiros consoante os sons”, explica Maria Gouveia, aluna de mestrado na Faculdade de Ciências da Universida­de de Lisboa. Is t o no dia em que o MARE – Centro de Ciências do Mar e do Ambiente – chamou a atenção para a s pre s s ões humanas no oceano e para a necessidad­e da sua conservaçã­o, que promoveu várias atividades no Parque Ma- rinho da Arrábida, em Sesimbra. Entre as curiosidad­es sobre a vocalizaçã­o dos peixes, os investigad­ores recuaram aos tempos da Segunda Guerra Mundial, e m que os pescadores da Califórnia, que tinham as barracas nos próprios barcos onde dor miam, acordavam em pânico ao ouvir motores julgando que ir iam ser atacados por submarinos. Até ao dia que perceberam que era apenas o s om das c or v i nas que t i - nham o habitat debaixo das suas casas.

“Quiseram tirá- l as de l á porque não conseguiam dormir, mas não f oram autorizado­s porque isso seria condenar a espécie”, esclarece Maria Gouveia, enquanto o investigad­or Manuel Santos explica que a f alta de visão no f undo dos oceanos levou os pei - xes a desenvolve­r vários tipos de sons.

“Como não veem bem, os animais de - senvolvera­m me - lhores capacidade­s acústicas, como de orientação e informação durante anoite”, explicaen - quanto tenta mostrar como se chega a essa espécie de diálogos entre os peixes ao largo no Parque Natural Luiz Saldanha, os mesmos que já estavam gravados de outras missões.

É a investigad­ora Ana Rita Luís que lança o hidrofone de cerâmica à água. O GPS indica 116 met ros de profundida­de. “Mas se houver alguma coisa ele capta. Consegue captar sons de golfinhos a quatro quilómetro­s”, revela, aumentando o som das colunas, enquanto coloca os auscultado­res e espera por notícias do fundo do mar.

Investigad­ores avaliam os sons dos golfinhos quando acasalam

Mas o dia não está de feição e nem o habitual som de chuva provocado pela passagem de camarões se deixa ouvir. Na experiênci­a apenas o motor de um barco que passa a cerca de dois quilómetro­s interrompe o silêncio.

Fica a saber- se que há alguns sons identifica­dos entre as espécies, com especial foco nos golfinhos, mas que por muito que se oiçam os assobios “será impossível pensar em criar um dicionário de ‘ golfinês’”, ironiza Manuel Santos.

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FOTOS DE A. GOSTO/ GLOBAL IMAGENS Ana Rita Luís mergulhou o hidrofone no mar, que chegou aos seis metros de profundida­de. Em terra, o recurso a microscópi­os ajudava a perceber a genética das espécies, através da recolha de ADN
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